Renata Dib's Blog

July 4, 2020

Capítulo 6: Meu amor pelas linhas tortas

Essa é uma história sobre um cacto. Um pequeno e fofo cacto num vasinho cor-de-rosa. Ele fica bem à vista na entrada do meu apartamento, perto de outros dois cactinhos. Mas, diferente dos irmãos, esse cacto em especial tem uma peculiaridade: ele é bem torto.





A história do Cacto Torto é que, certa vez, enquanto fazia compras na Ikea, quis muito levar uma plantinha para casa. Por trabalhar em casa e passar muito tempo sozinha, a canceriana emotiva aqui eu estava sentindo falta de ter algo para transbordar meu carinho e cuidado.





Foi então que parei na seção das plantas e comecei a fazer a minuciosa inspeção e importante escolha do ser vivo que seria sufocado pelo meu amor receberia todo o meu amor. Apesar de o cacto ser o oposto da planta indicada para transbordar qualquer coisa, uns cactinhos pequenos me chamaram a atenção, por causa dos vasinhos cor-de-rosa. E foi nesse momento que o Cacto Torto fez sua apresentação silenciosa e roubou meu coração.





Decidida, resolvi dar ao Cacto Torto e seus dois irmãos (eles eram vendidos em conjuntos de 3) um novo lar e receptáculo de pouca fotossíntese. Enquanto ainda estávamos na loja, meu marido observou: “Amor, esse cacto está torto. Você não quer trocar?” Ao que eu respondi: “Mas eu quero o torto. Ninguém nunca pensaria em levar o torto.”





Não sei explicar muito bem essa angústia/esse amor que vive em mim com relação às coisas tortas. Acho que tentamos ser perfeitos e retos o tempo todo e queremos ter coisas perfeitas e retas, com todas as linhas e ângulos nos lugares que supostamente deveriam ocupar.





A verdade é que enxerguei no Cacto Torto um pedaço de mim. Por mais que do lado de fora minhas linhas “supostamente” estejam onde deveriam estar, do lado de dentro elas fazem curvas, se embolam, se ultrapassam e não têm nenhum respeito pela ordem e simetria mundana.





Por isso, o Cacto Torto me traz paz, conforto. Perto dos irmãos perfeitamente retos, ele é autêntico. Não se importa de ser oblíquo num mundo retilíneo. Sua determinação em continuar de pé, mesmo tendo um referencial um pouco diferente, me faz enxergar a beleza no emaranhado de linhas que habita dentro de mim.





Afinal, cada um tem uma linha torta e embolada em algum lugar, apesar de muitos tentarem escondê-la. Ei, você aí, seja gentil com as suas linhas tortas. Desembole-as só quando for estritamente necessário, mas regue-as e dê valor a elas sempre que possível. Saiba que o torto também pode ser sinônimo de beleza, se a gente permitir.





[image error]Cacto torto meramente ilustrativo.







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Published on July 04, 2020 09:20

October 15, 2018

Capítulo 5: Biblioteca Camilo Castelo Branco

Sempre imaginei o paraíso como uma espécie de biblioteca.


– Jorge Luis Borges, escritor argentino



Ultimamente ela tem sido minha segunda casa. O que não é muito difícil de imaginar, me conhecendo só um pouquinho. Um lugar com muitos livros sempre me pareceu extremamente aconchegante e acolhedor.


Além do mais, eu estava acostumada à ideia de bibliotecas relacionadas apenas a instituições de ensino, já que não tive muito acesso a bibliotecas fora da escola ou da faculdade. Na verdade, havia uma casa de cultura perto da minha casa, no Rio, que emprestava livros e que me introduziu ao universo macabro do Stephen King. Como eu amava aquele lugar! Hoje em dia o espaço virou estacionamento de um supermercado, o que reflete perfeitamente o pensamento de boa parte da população em relação à queima de um museu com peças que nunca mais serão recuperadas.


E aí, mudando de país, e depois de entrar em um grupo do Facebook de leitores fanáticos que leem muitos livros oriundos de bibliotecas, eu pensei: Será que aqui tem alguma biblioteca municipal que eu poderei frequentar e pegar livros emprestados? E foi assim que descobri a Camilo Castelo Branco.


Revisitando a emoção que senti naquele primeiro contato quando criança, cheguei à Av. Dr. Carlos Bacelar n° 154 sem conseguir me conter. Abri as portas com a plena certeza de que tinha entrado no paraíso e, no fundo, o paraíso deve mesmo parecer com todas aquelas estantes perfeitamente organizadas. Aliás, não duvido nada que as pessoas cheguem no céu com um diploma em biblioteconomia, para organizar as estantes divinas com todos aqueles símbolos de sobrenome de autor e letras e categorias e sabe-se lá o que mais.


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Acho que nesse ponto nem preciso dizer que cheguei logo pedindo um cartão de sócia. Vocês já devem ter imaginado, é claro. Também não preciso dizer que saí logo com 2 livros alugados (Memórias para confecção de um espanador de tristezas, do Ondjaki, e Os homens que odeiam as mulheres, do Stieg Larsson). Acho que é redundante, né?


Sei que tenho muitas outras bibliotecas para conhecer por aqui – e para fazer o cartão de sócia, óbvio – e talvez eu nem continue mais a frequentar a Camilo Castelo Branco, mas ela sempre terá um lugar especial no meu coração, será sempre um pedacinho de casa.


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Published on October 15, 2018 10:24

January 30, 2018

Capítulo 4: Recomeço em Nápoles

Re.co.me.çar


– começar de novo; retomar, após interrupção;


– começar a ser, a produzir-se novamente.


 


[insira aquele clichê de ano-novo aqui:


Ano-novo, vida nova.


365 páginas em branco


…]


Sei bem que estamos todos de saco cheio dos clichês e das promessas mirabolantes que acompanham o início de um novo ano. Eu ia até discursar sobre como este ano serei mais fitness e farei mais exercícios (haha, tá bom!), mas vou poupá-los porque esse não é o objetivo aqui. Quero falar de um recomeço específico que, na verdade, teve início em abril do ano passado.


Certo dia, enquanto lia mais um romance do meu autor favorito, meu marcador de páginas simplesmente se recusou a avançar. Um ponto, uma frase, uma linha, um parágrafo, uma página, um capítulo. Não dava mais. A mesma fórmula, que eu jurava de pé junto que parecia diferente a cada livro e que sempre me encantou e arrebatou, me deixou, pela primeira vez, irritada e com a horrível sensação de perda de tempo. Não dava mais para continuar. Senti que precisava começar a ler coisas diferentes, sair um pouco do lugar-comum dos romances comerciais e superficiais e dos infantojuvenis que sempre preencheram minhas horas vagas.


Essa interrupção foi fundamental para que eu englobasse os dois sentidos da palavra-tema deste texto. Sim, eu retomei a leitura, mas não, não foi de onde parei. Comecei a ler diferente. Esse caminho sem volta começou nada mais nada menos que em Nápoles, na Itália. Não, infelizmente eu (ainda) não fui a Nápoles. Mas acompanhei a infância, a juventude e a maioridade de duas melhores amigas na tetralogia napolitana, de Elena Ferrante. E posso afirmar que Lenu, Lila mudaram definitivamente o rumo das minhas leituras.


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A partir daí, Chimamanda Ngozi chegou em forma de presente para me ajudar a quebrar o “pré-conceito” com a África falando sobre a vida de uma família rica na Nigéria e mostrando alguns efeitos (bastante negativos) da colonização religiosa em Hibisco roxo; Clarice Lispector fez com que eu me identificasse bastante com a Joana em sua jornada introspectiva de autodescoberta em Perto do coração selvagem; Valter Hugo Mãe me mostrou que ainda existe muita pureza no mundo em O paraíso são os outros e que o amor acontece às vezes de formas que não esperamos em O filho de mil homens. [Aliás, já tendo lido três livros do Valter Hugo Mãe, preciso dizer que ele tem um dom com as palavras que não sei explicar muito bem. Na verdade, eu penso assim: se as palavras fossem pessoas e tivessem fases de vida, é como se ele as usasse ainda crianças, por conseguir tratar de assuntos tão complicados de uma forma tão suave.] Yeonmi Park me deu um golpe certeiro e me deixou chocada por algumas semanas com a realidade da Coreia da Norte e com tudo o que precisou fazer com o único objetivo de sobreviver em Para poder viver. Por fim, mas não menos assustador por ser uma distopia, Margaret Atwood me ensinou em O conto da aia que devemos, sim, em qualquer circunstância, seguir lutando pelos nossos direitos – principalmente quando se tem tão poucos (no caso do livro, quero dizer. ou não?).


Espero que em 2018 a leitura (ou o cinema, ou qualquer outro meio) seja algo transformador na vida de vocês. Desejo-lhes obras impactantes, maravilhosas, com ou sem finais felizes, mas, principalmente, com personagens humanos, que nos façam refletir, sonhar, que nos assombrem e nos arrebatem. Afinal, é isso que todos nós buscamos na leitura, não é mesmo? Um ano de múltiplos recomeços a todos

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Published on January 30, 2018 15:10

July 30, 2017

Capítulo 3: o monstro que habita a minha cabeça

In.fe.ri.o.ri.zar


Diminuir o valor, a importância de (algo, alguém ou si mesmo); apoucar(-se), rebaixar(-se).


Há um ser que habita a minha cabeça. Não sei bem como ele é nem que forma tem, só sei que ele é naturalmente pequeno. Digo “naturalmente” porque algumas horas eu o ajudo a crescer, e ele fica maior do que qualquer coisa, maior do que a minha consciência, do que a minha autoestima. Mas ele é naturalmente pequeno. Eu simplesmente sei.


Ele se fez presente em alguns momentos importantes, sempre pensando com a minha cabeça: “Você não vai conseguir”, “Você não é boa o suficiente”, “Você não serve para nada”. E eu acreditava em cada palavra, alimentava o monstrinho com as minhas lágrimas de desespero, o que o aumentava mais e mais.


Como foi difícil escolher uma faculdade, uma profissão, tão nova e com tantas dúvidas. Nessa época ele se alimentou bastante da minha desconfiança em mim mesma. Como foi difícil namorar sentindo tantas inseguranças – obviamente todas as outras garotas eram melhores que eu, então por que alguém em sã consciência iria querer ficar comigo? É claro que os namoros duraram tanto quanto a minha incrível autoestima na época – ou seja, bem pouco.


Mas não é que apareceu um doido insistindo que ele me queria, sim? Achei que assim que ele presenciasse a ação do monstro iria desistir, como todos os outros. Mas ele simplesmente pegou uma espada (hehe, brincadeirinha!) repeliu o monstro quando “deparou” com ele pela primeira vez. “Por que se sentir insegura se você é incrível?” “É claro que você tem capacidade de arranjar um estágio mesmo sem ter trabalhado antes.” Mais tarde ele disse uma que fez o monstro diminuir a um nível quase microscópico: “Eu acredito em você.”


Gostaria de dizer que depois disso o monstro sumiu e eu vivi feliz para sempre com a minha recém-adquirida autoestima, mas é claro que isso não aconteceu. Eu sei que ele ainda está aqui. E sei que continuo alimentando-o algumas vezes.


No ano passado viajei sozinha pela primeira vez para um país que não falava a minha língua. Assim que cheguei, me perdi um pouco para encontrar o hostel, e aí ele veio com tudo: “O que você estava pensando? Viajar sozinha? E você por acaso vai conseguir se virar sozinha aqui?”


Mas minha nova tática é derrotar o monstro por conta própria. Porque é isso que deveríamos fazer em primeiro lugar. É legal ter alguém ao seu lado disposto a combatê-lo, mas e se esse alguém não existisse? E se ele tivesse desistido, assim como os outros fizeram?


Então eu fui e dei um petelequinho mental no monstro.


E depois eu consegui achar o hostel, sim. Consegui me virar, sim. Fui compreendida e me fiz entender, sim. E foi a viagem mais incrível que já fiz na vida.


O monstro também adora opinar sobre meus textos. Nenhum dos assuntos que eu penso em escrever são bons o suficiente para realmente serem compartilhados. Então nada melhor do que escrever sobre o próprio. [Por essa você não esperava, né?]


No meu placar mental eu acabei de fazer mais um gol contra o monstro e tem várias Renatinhas defendendo o meu lado do campo. Ele até pode conseguir passar, mas, olha… não vai mais fazer gol aqui não. Tem muitas eus me defendendo agora.


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Published on July 30, 2017 18:59

June 19, 2017

Capítulo 2: ansiedade pré-aniversário

An.si.e.da.de


Desejo veemente e impaciente. | Falta de tranquilidade, receio.


Tá aí uma palavra que poderia facilmente ser meu nome e sobrenome. Ô substantivo que me define bem. Sou ansiosa até o último fio de cabelo (não posso falar até a pontinha das unhas porque elas estão todas roídas. Adivinhem o que causa isso?  … Exatamente!)


Meu aniversário se aproxima. Farei 26 anos na sexta agora, dia 23/6. E que motivo divino para deixar as unhas crescerem só para poder roer tudo de novo e de novo!


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A cada ano meu humor pré-aniversário está diferente. Tem ano que eu quero fazer uma baita festa e reunir todo mundo que eu gosto e tem ano que eu penso que só ir a um restaurante com os pais e o namorado está de bom tamanho. Esse ano resolvi levar pais, sogra e namorado para passar um dia em Penedo (o que acabou se revelando uma ótima oportunidade para arrastar meus pais para fora de casa um pouquinho. Uma grande vitória).


Mas, voltando ao humor (porque canceriano gosta é disso mesmo), esse ano senti uma coisa bem diferente dos aniversários anteriores: fiquei tensa. Muito tensa. Como já falei, vou fazer 26, e todas as pessoas mais velhas adoram opinar sobre como ainda sou nova e como ainda tenho tanta coisa pra viver. É claro que sim, não é que eu discorde. Muito pelo contrário.


É só que eu sinto como se meus pais tivessem assinado um termo de responsabilidade que só vai até os 25 anos e, com 26, eu estarei completamente sozinha com os meus próprios anseios, as minhas responsabilidades e muitas, mas muitas decisões difíceis para tomar em relação ao meu futuro e aos meus próximos passos.


Tem um jogo bem famoso que eu adorava jogar quando era mais nova chamado “The Sims”. Bom, vocês devem conhecer, mas, para quem não conhece, nesse jogo você basicamente brinca de controlar pessoas. Você escolhe as características físicas dessas pessoas, constrói a casa delas e controla suas ações. Há um espaço que mostra as necessidades de cada “Sim” (o nome dos bonecos): se eles precisam comer, ir ao banheiro, se precisam de lazer, se precisam interagir com outros “Sins”, etc.


Tá, mas por que eu estou falando sobre esse jogo?


É que, quando um “Sim” ia fazer aniversário, em vez de esperar ele ficar mais velho “naturalmente”, você poderia acelerar o processo apenas clicando no “Sim” e escolhendo a ação “Crescer”. Um. Simples. Clique. E, pá!, a criança virava adolescente, o jovem adulto virava adulto e por aí vai. À força. Às vezes sem nem uma festinha legal para comemorar a data nem nada.


Essa é a melhor analogia possível! Já na madrugada do dia 23, antes mesmo de eu acordar, a primeira coisa que vai acontecer é que alguém vai clicar em mim e escolher a ação “Crescer”. Sem nem esperar eu acordar. Sem eu nem entender o que está acontecendo (vida adulta é isso, né, gente?). E aí, pum!, eu vou virar adulta, o sonho de toda criança (só porque elas não sabem nada sobre trabalhar e pagar boletos. Mas se você tem o próprio dinheiro e pode beber quanto vinho quiser, então acho que acaba compensando um pouco).


Eu planejo algumas coisas e tenho sonhos que me assustam. Demais. Por serem completamente diferentes de tudo o que vivi até agora, por exigirem muita responsabilidade, risco e coragem. Mas olha, eu sei que um dia vou olhar para trás e pensar duas coisas. A primeira é: nossa, como eu era dramática. A segunda é: valeu a pena o esforço!


Haja unha para aguentar a ansiedade dos 26, viu? Que seja um ano bom e cheio de realizações. Quando as pancadas vierem, que eu consiga me reerguer. E, é claro, que eu sempre tenha as melhores pessoas por perto para me apoiar e zelar por mim. E que eu esteja enganada sobre o termo de responsabilidade dos pais e ele dure mais alguns anos só até eu entender melhor essa coisa de ser adulta. Um brinde ao novo ano (com um vinho do Porto bem docinho).


 

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Published on June 19, 2017 19:00

May 31, 2017

Capítulo 1: com emendas

E.men.dar


Eliminar erros ou defeitos; corrigir, reformar.


O início do blog foi um sucesso (na minha humilde opinião). Já no dia seguinte cheguei no trabalho ouvindo uma amiga dizer que adorou o post e, ao longo do dia ouvi outros elogios, comentários e até uma sugestão: “Por que não escrever um post explicando o título do blog?”.


Ora, é claro, meus queridos fãs, quem sou eu para decepcionar vocês?


Bom, para começar, na área editorial chamamos de emendas todas as correções que fazemos na hora de revisar um texto. Diferentes leituras geram diferentes emendas, o que faz todo sentido, porque cada um é de um jeito e tem os próprios gostos (mas muitas vezes um pega o erro que o outro não conseguiu ver, é normal). O melhor é quando a gente escreve um texto, imprime, cinco segundos depois lê no papel e já está emendando o próprio texto. Mas por que não, certo? Sempre dá pra melhorar (e somos mesmo bastante perfeccionistas).


“Com emendas” dá o sentido de algo inacabado, como um eterno esboço, algo a ser constantemente alterado, refeito, corrigido. Algo que, vamos combinar, é mais fácil apontar no texto de um livro: um erro é um erro, e a gente tem mais é que tirar os erros dali.


Mas a verdade é que, por mais que a gente leia o texto mil vezes (e outras pessoas leiam outras mil vezes durante o fluxo de produção do livro), na maioria dos casos o livro sai com um errinho. Talvez você nem perceba: pode ser a inofensiva ausência de um ponto final, uma letrinha trocada que no seu cérebro não aparece trocada coisa nenhuma… Me diz, não é injusto?


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Capelas Imperfeitas no Mosteiro da Batalha, em Portugal. (As imperfeições não podem ser lindas?)


Na nossa vida é igualzinho, mas o nível de dificuldade muda para o insano. O que a gente precisa emendar e o que já está perfeito do que jeito que está? São perguntas difíceis, sim. É difícil se aceitar, enxergar os próprios erros. Ou às vezes enxergar os erros pode ser bem fácil e o difícil mesmo é tentar consertá-los.


Confesso que percebi com o passar dos anos que alguns aspectos da minha personalidade eram como o trema: já tinham caído em desuso e eu continuava lá, insistindo naquilo. Opiniões machistas, ciúme e insegurança são alguns exemplos (quem achou que veria ingratidão aqui, tenho uma coisa a dizer: vocês erraram junto com o Latino). Outros aspectos são como aquela vírgula desnecessária mas que também não faz mal à ninguém: meu TOC com volumes múltiplos de 5 (não ofende ninguém, só é estranho mesmo) e comer Ruffles com Passatempo (idem). Mas alguns são como aquela crase bem colocada, coisa linda de se ver: como ser trabalhadora, carinhosa e financeiramente organizada (tenho dificuldade em listar minhas qualidades).


Mas, por favor, deixem em paz minha ansiedade, minha habilidade de dramatizar situações e minha incrível capacidade de chorar com filmes água com açúcar e com pessoas que falam comigo em um volume de decibéis acima do socialmente aceito (ou seja, gritam). Ah, e a minha bagunça (importante ressaltar também que gênios são bagunceiros. Roupas jogadas em toda parte é sim um aspecto da genialidade).


O que eu quero dizer é que a soma disso tudo, erros, acertos, esquisitices e drama, faz parte de mim. Eu sou uma Renata com emendas constantes. Um esboço sem fim. Inacabada dependendo do ponto de vista, do humor… tem dias que eu acho que estou acabada mesmo.


Mas não é libertador quando a gente se aceita? Quando a gente aceita que o livro vai sair com erros mesmo, mas olha, tá todo mundo lendo (ou pelo menos deveria estar). Eu também não saio por aí com as minhas qualidades, os errinhos aparentes e outros mais escondidos, mas continuo me aceitando e vivendo com as minhas emendas?


[Aqui eu também explico um pouquinho sobre a escolha desse título.]

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Published on May 31, 2017 03:30

May 24, 2017

Prólogo: tirando o pó da bicicleta

Lim.par


Remover todo o conteúdo de (recipiente, lugar), ou tudo que é demasiado e obstrui.


Quantos sonhos deixamos para trás pelo simples fato de sermos engolidos pelos nossos medos e pelas responsabilidades do dia a dia?


Vivia pensando em voltar a fazer um blog, a tornar a escrita uma atividade frequente e prazerosa. Então criei este espaço, tive a ideia de fazer os posts a partir de palavras e seus significados e pronto, empaquei nessa parte.


Escrever alguma coisa? Deus me livre!


Antes de escrever este post, eu já tinha pensado em 3 milhões de desculpas para fazer qualquer outra coisa que não fosse justamente, bem… escrever este post.


Na minha cabeça, eis os motivos para que eu não começasse a escrever aqui no blog:



Preciso terminar o frila X;
Preciso saber o final do livro Y (atualmente é a tetralogia Napolitana, da Elena Ferrante. Quem já leu entende essa necessidade de engolir o livro hehe);
Preciso terminar de ver a série Z;
Estou sem ideias;
Na faculdade eu tinha mais facilidade para escrever, mas agora fico olhando a página em branco do Word e entro em pânico;
Não tenho nada relevante para escrever;
Ninguém vai querer ler o que eu escrevo.

Mas, ao mesmo tempo, uma vozinha na minha cabeça dizia: “Vai, escreve. Tenta. Rabisca algumas palavras pra ver como você se sai. Não precisa ter medo.”


E a própria sensação de ter um blog, um espaço para escrever sobre absolutamente tudo o que eu quiser e sentir – lembrando: canceriana, gente. Sentir é importante – é boa demais.


Então, vai, tira o pó da bicicleta, enche o pneu e começa a dar umas voltas. Persista nessa jornada até relembrar aquela antiga sensação de autoconfiança, até poder andar com uma mão só ou com os olhos fechados (nem que seja por cinco segundos).


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Eu sentia que precisava desse exercício (preciso de exercício físico também, mas por ora esse post já é uma pequena compensação na Lista de pendências da vida da Renata), precisava começar sentindo a vontade de tirar o pó da bicicleta.


Por isso aqui estou eu, digitando estas palavras, tentando, me esforçando, querendo desesperadamente pegar minha bicicleta e sair pedalando como louca por aí. Meus amigos bem sabem que sempre fui uma pessoa bastante ansiosa.


Mas por hoje é só. Já limpei tudo o que precisava: a bicicleta e a alma.

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Published on May 24, 2017 20:41