Capítulo 1: com emendas

E.men.dar


Eliminar erros ou defeitos; corrigir, reformar.


O início do blog foi um sucesso (na minha humilde opinião). Já no dia seguinte cheguei no trabalho ouvindo uma amiga dizer que adorou o post e, ao longo do dia ouvi outros elogios, comentários e até uma sugestão: “Por que não escrever um post explicando o título do blog?”.


Ora, é claro, meus queridos fãs, quem sou eu para decepcionar vocês?


Bom, para começar, na área editorial chamamos de emendas todas as correções que fazemos na hora de revisar um texto. Diferentes leituras geram diferentes emendas, o que faz todo sentido, porque cada um é de um jeito e tem os próprios gostos (mas muitas vezes um pega o erro que o outro não conseguiu ver, é normal). O melhor é quando a gente escreve um texto, imprime, cinco segundos depois lê no papel e já está emendando o próprio texto. Mas por que não, certo? Sempre dá pra melhorar (e somos mesmo bastante perfeccionistas).


“Com emendas” dá o sentido de algo inacabado, como um eterno esboço, algo a ser constantemente alterado, refeito, corrigido. Algo que, vamos combinar, é mais fácil apontar no texto de um livro: um erro é um erro, e a gente tem mais é que tirar os erros dali.


Mas a verdade é que, por mais que a gente leia o texto mil vezes (e outras pessoas leiam outras mil vezes durante o fluxo de produção do livro), na maioria dos casos o livro sai com um errinho. Talvez você nem perceba: pode ser a inofensiva ausência de um ponto final, uma letrinha trocada que no seu cérebro não aparece trocada coisa nenhuma… Me diz, não é injusto?


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Capelas Imperfeitas no Mosteiro da Batalha, em Portugal. (As imperfeições não podem ser lindas?)


Na nossa vida é igualzinho, mas o nível de dificuldade muda para o insano. O que a gente precisa emendar e o que já está perfeito do que jeito que está? São perguntas difíceis, sim. É difícil se aceitar, enxergar os próprios erros. Ou às vezes enxergar os erros pode ser bem fácil e o difícil mesmo é tentar consertá-los.


Confesso que percebi com o passar dos anos que alguns aspectos da minha personalidade eram como o trema: já tinham caído em desuso e eu continuava lá, insistindo naquilo. Opiniões machistas, ciúme e insegurança são alguns exemplos (quem achou que veria ingratidão aqui, tenho uma coisa a dizer: vocês erraram junto com o Latino). Outros aspectos são como aquela vírgula desnecessária mas que também não faz mal à ninguém: meu TOC com volumes múltiplos de 5 (não ofende ninguém, só é estranho mesmo) e comer Ruffles com Passatempo (idem). Mas alguns são como aquela crase bem colocada, coisa linda de se ver: como ser trabalhadora, carinhosa e financeiramente organizada (tenho dificuldade em listar minhas qualidades).


Mas, por favor, deixem em paz minha ansiedade, minha habilidade de dramatizar situações e minha incrível capacidade de chorar com filmes água com açúcar e com pessoas que falam comigo em um volume de decibéis acima do socialmente aceito (ou seja, gritam). Ah, e a minha bagunça (importante ressaltar também que gênios são bagunceiros. Roupas jogadas em toda parte é sim um aspecto da genialidade).


O que eu quero dizer é que a soma disso tudo, erros, acertos, esquisitices e drama, faz parte de mim. Eu sou uma Renata com emendas constantes. Um esboço sem fim. Inacabada dependendo do ponto de vista, do humor… tem dias que eu acho que estou acabada mesmo.


Mas não é libertador quando a gente se aceita? Quando a gente aceita que o livro vai sair com erros mesmo, mas olha, tá todo mundo lendo (ou pelo menos deveria estar). Eu também não saio por aí com as minhas qualidades, os errinhos aparentes e outros mais escondidos, mas continuo me aceitando e vivendo com as minhas emendas?


[Aqui eu também explico um pouquinho sobre a escolha desse título.]

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Published on May 31, 2017 03:30
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