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Dispersão

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18 pages, Kindle Edition

First published January 1, 1914

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About the author

Mário de Sá-Carneiro

92 books176 followers
Mário de Sá-Carneiro (Lisboa, 19 de Maio de 1890 — Paris, 26 de Abril de 1916) foi um poeta, contista e ficcionista português, um dos grandes expoentes do modernismo em Portugal e um dos mais reputados membros da Geração d’Orpheu.

Na fase inicial da sua obra, Mário de Sá-Carneiro revela influências de várias correntes literárias, como o decadentismo, o simbolismo, ou o saudosismo, então em franco declínio; posteriormente, por influência de Pessoa, viria a aderir a correntes de vanguarda, como o interseccionismo, o paulismo ou o futurismo.

Nessas pôde exprimir com vontade a sua personalidade, sendo notórios a confusão dos sentidos, o delírio, quase a raiar a alucinação; ao mesmo tempo, revela um certo narcisismo e egolatria, ao procurar exprimir o seu inconsciente e a dispersão que sentia do seu «eu» no mundo – revelando a mais profunda incapacidade de se assumir como adulto consistente.

O narcisismo, motivado certamente pelas carências emocionais (era órfão de mãe desde a mais terna puerícia), levou-o ao sentimento da solidão, do abandono e da frustração, traduzível numa poesia onde surge o retrato de um inútil e inapto. A crise de personalidade levá-lo-ia, mais tarde, a abraçar uma poesia onde se nota o frenesi de experiências sensórias, pervertendo e subvertendo a ordem lógica das coisas, demonstrando a sua incapacidade de viver aquilo que sonhava – sonhando por isso cada vez mais com a aniquilação do eu, o que acabaria por o conduzir, em última análise, ao seu suicídio.

Embora não se afaste da metrificação tradicional (redondilhas, decassílabos, alexandrinos), torna-se singular a sua escrita pelos seus ataques à gramática, e pelos jogos de palavras. Se numa primeira fase se nota ainda esse estilo clássico, numa segunda, claramente niilista, a sua poesia fica impregnada de uma humanidade autêntica, triste e trágica.

Por fim, as cartas que trocou com Pessoa, entre 1912 e o seu suicídio, são como que um autêntico diário onde se nota paralelamente o crescimento das suas frustrações interiores.

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Displaying 1 - 20 of 20 reviews
Profile Image for Alma.
751 reviews
July 9, 2020
"Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto,
E hoje, quando me sinto,
É com saudades de mim."
Profile Image for João Barradas.
275 reviews31 followers
December 31, 2017
Sem se sentir completo neste mundo,
Pelo parco amor próprio ou expresso por outro,
Mário Sá-Carneiro não se revê no seu eu profundo
E mendiga qualquer esmola a um Deus neutro.

Roga pela sua desintegração total,
Numa explosão de moléculas alienadas
Que, sem o cimento, se resumem a nadas
Afundadas num vazio abissal.

Dos olhos, as lágrimas secas já não caíam,
Da boca, as palavras pensadas já não saíam,
Restava um papel como testamento:

Anotando as vontades não realizadas,
Todos as memórias não vivenciadas,
Até a um final que pedia diferimento.
Profile Image for Rosa Ramôa.
1,570 reviews85 followers
October 7, 2014
(em Paris,1913)
Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto
E hoje, quando me sinto.
É com saudades de mim.

Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar.
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida...

Para mim é sempre ontem,
Não tenho amanhã nem hoje:
O tempo que aos outros foge
Cai sobre mim feito ontem.

(O Domingo de Paris
Lembra-me o desaparecido
Que sentia comovido
Os Domingos de Paris:

Porque um domingo é família,
É bem-estar, é singeleza,
E os que olham a beleza
Não têm bem-estar nem família).

O pobre moço das ânsias...
Tu, sim, tu eras alguém!
E foi por isso também
Que me abismaste nas ânsias.

A grande ave doirada
Bateu asas para os céus,
Mas fechou-as saciada
Ao ver que ganhava os céus.

Como se chora um amante,
Assim me choro a mim mesmo:
Eu fui amante inconstante
Que se traiu a si mesmo.

Não sinto o espaço que encerro
Nem as linhas que protejo:
Se me olho a um espelho, erro -
Não me acho no que projeto.

Regresso dentro de mim
Mas nada me fala, nada!
Tenho a alma amortalhada,
Sequinha, dentro de mim.

Não perdi a minha alma,
Fiquei com ela, perdida.
Assim eu choro, da vida,
A morte da minha alma.

Saudosamente recordo
Uma gentil companheira
Que na minha vida inteira
Eu nunca vi... Mas recordo

A sua boca doirada
E o seu corpo esmaecido,
Em um hálito perdido
Que vem na tarde doirada.

(As minhas grandes saudades
São do que nunca enlacei.
Ai, como eu tenho saudades
Dos sonhos que sonhei!... )

E sinto que a minha morte -
Minha dispersão total -
Existe lá longe, ao norte,
Numa grande capital.

Vejo o meu último dia
Pintado em rolos de fumo,
E todo azul-de-agonia
Em sombra e além me sumo.

Ternura feita saudade,
Eu beijo as minhas mãos brancas...
Sou amor e piedade
Em face dessas mãos brancas...

Tristes mãos longas e lindas
Que eram feitas pra se dar...
Ninguém mas quis apertar...
Tristes mãos longas e lindas...

Eu tenho pena de mim,
Pobre menino ideal...
Que me faltou afinal?
Um elo? Um rastro?... Ai de mim!...

Desceu-me n'alma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.

Álcool dum sono outonal
Me penetrou vagamente
A difundir-me dormente
Em uma bruma outonal.

Perdi a morte e a vida,
E, louco, não enlouqueço...
A hora foge vivida
Eu sigo-a, mas permaneço...

Castelos desmantelados,
Leões alados sem juba...
Profile Image for Walter .
465 reviews6 followers
June 25, 2020
Meu primeiro contato com Mário de Sá-Carneiro foi nos primeiros semestres da graduação em Letras, momento em que tive que fazer um trabalho sobre sua novela: "A confissão de Lúcio". Apaixonei-me loucamente pelos gritos da sua narrativa, como se convocasse o leitor a que o entendesse em morte, já que em vida poucos o fizeram. Alguns semestres depois tive de fazer outro trabalho sobre ele, desta vez a partir da sua poesia. Na lírica foi onde vi mais nitidamente o pedido de socorro do autor, tanto que os ecos cortantes de cada verso ressoam no mais íntimo de mim desde então.

Em Dispersão se encontram todos os anelos, desejos, lamentos, saudades de uma alma coberta de névoa que não suportava estar enquadrado num tempo e lugar em que não se encaixava. Hoje recolho sua dispersão, junto-as pedaço por pedaço para fazê-lo viver de novo, aqui, em mim, onde há espaço para que ele habite enquanto viva eternamente.

"Afronta-me um desejo de fugir
Ao mistério que é meu e me seduz.
Mas logo me triunfo. A sua luz
Não há muitos que a saibam refletir."
(Partida)
Profile Image for Cleber.
11 reviews9 followers
April 10, 2020
RODOPIO

Volteiam dentro de mim,
Em rodopio, em novelos,
Milagres, uivos, castelos,
Forcas de luz, pesadelos,
Altas torres de marfim.

Ascendem helices, rastros…
Mais longe coam-me soís;
Ha promontorios, farois,
Upam-se estatuas d'herois,
Ondeiam lanças e mastros.

Zebram-se armadas de côr,
Singram cortejos de luz,
Ruem-se braços de cruz,
E um espelho reproduz,
Em treva, todo o esplendor…

Cristais retinem de medo,
Precipitam-se estilhaços,
Chovem garras, manchas, laços…
Planos, quebras e espaços
Vertiginam em segredo.

Luas d'oiro se embebedam,
Rainhas desfolham lirios;
Contorcionam-se cirios,
Enclavinham-se delirios.
Listas de som enveredam…

Virgulam-se aspas em vozes,
Letras de fogo e punhais;
Ha missas e bacanais,
Execuções capitais,
Regressos, apoteoses.

Silvam madeixas ondeantes,
Pungem labios esmagados,
Ha corpos emmaranhados,
Seios mordidos, golfados,
Sexos mortos d'anseantes…

(Ha incenso de esponsais,
Ha mãos brancas e sagradas,
Ha velhas cartas rasgadas,
Ha pobres coisas guardadas—
Um lenço, fitas, dedais…)

Ha elmos, troféus, mortalhas,
Emanações fugidias,
Referencias, nostalgias,
Ruinas de melodias,
Vertigens, erros e falhas.

Ha vislumbres de não-ser,
Rangem, de vago, neblinas;
Fulcram-se poços e minas,
Meandros, pauis, ravinas
Que não ouso percorrer…

Ha vácuos, ha bolhas d'ar,
Perfumes de longes ilhas,
Amarras, lemes e quilhas—
Tantas, tantas maravilhas
Que se não podem sonhar!…
Profile Image for Pedro.
Author 51 books61 followers
October 14, 2016
Ao longo das curtas páginas deste livro, que foi, na maioria, escrito no espaço de uma semana, fica-nos o desespero do poeta. Procura-se e não se encontra e volta-se a perder em si mesmo. Mário de Sá-Carneiro escreveu-o com 22 anos, uns meros 3 anos antes de suicidar. Estes versos já mostravam os dilemas e o estado de profunda depressão do poeta. Por isso, não é uma leitura leve. A poesia não se mostra com grandes artifícios, no entanto a cadência transmite parte do desespero ao leitor.
Recomendo a quem quiser conhecer um dos autores mais influentes do início do século XX, da geração d'Orpheu, assim como como Almada Negreiros e Fernando Pessoa.
Profile Image for Ana.
148 reviews
September 1, 2018
COMO EU NÃO POSSUO

Olho em volta de mim. Todos possuem —
Um afecto, um sorriso ou um abraço.
Só para mim as ânsias se diluem
E não possuo mesmo quando enlaço.

(...)
Quero sentir. Não sei... perco-me todo...
Não posso afeiçoar-me nem ser eu:
Falta-me egoísmo pra ascender ao céu,
Falta-me unção pra me afundar no lodo.

Não sou amigo de ninguém. Pra o ser
Forçoso me era antes possuir
Quem eu estimasse — ou homem ou mulher,
E eu não logro nunca possuir!

Castrado d’alma e sem saber fixar-me,
Tarde a tarde na minha dor me afundo
— Serei um emigrado doutro mundo
Que nem na minha dor posso encontrar-me?
Profile Image for Lúcia.
7 reviews7 followers
January 8, 2016
"perdi-me dentro de mim
porque eu era labirinto
e hoje quando me sinto
é com saudade de mim"

lindas poesias, belíssimas imagens.
Profile Image for Willian.
8 reviews4 followers
June 14, 2018
Nem ópio nem morfina. O que me ardeu,
Foi álcool mais raro e penetrante:
É só de mim que eu ando delirante — Manhã tão forte que me anoiteceu.
Profile Image for Emerson Vieira.
41 reviews5 followers
June 8, 2017
Angústia e depressão. Os versos são esparsos e refletem a ideia de um gênio abstrato que não se concretizou. Há dificuldade em escrevê-los. Percebe-se. Mesmo assim, não tem pena de si mesmo, pois uma lucidez toma conta do poeta em todos os momentos. Reação perante tudo: sono e indiferença; o poeta só pode ser um no turbilhão a sua volta.
Profile Image for Sílvia .
39 reviews
March 11, 2017
Grande livro. Tem uma estrutura simples, mas uma complexidade de conteúdo enorme. Se procuram um livro em verso que fale da procura do nosso "eu" e dos problemas em nos integrarmos no mundo, este é o ideal!
Profile Image for David.
1,684 reviews
June 4, 2025
After reading Loucura by Mário de Sá-Carneiro, my GR friend Paula suggested I read his poetry. Fortunately for me, Project Adamastor had his 1914 book of poems called Dispersão (Dispersion). They were all written in Paris in early May 1913. During this time, he went to study at the Sorbonne. According to Wikipedia, almost as soon as he arrived, he quit his studies to live life as a bohemian poet.

These twelve poems sum up his life in Paris:
I - Partida (Departure)
II - Escavação (Excavation)
III - Inter-sonho (Between Dreams)
IV - Álcool (Alcohol)
V - Vontade de dormir (Desire to sleep)
VI - Dispersão (Dispersion)
VII - Estátua falsa (False Statue)
VIII - Quasi (Almost)
IX - Como eu não possuo (How I don’t have)
X - Além-tédio (Beyond Tedium)
XI - Rodopio. (Whirl)
XII - A queda (The Weakness)

A young man in the City of Lights just before the First World War. Alcohol soaked dreams, the tedium of poverty and the desire to sleep, perchance to dream of a better life, before father cuts off the funds, experiencing love and sex and loss. Almost a life, but probably not enjoying it.

To write and write and write, the words flow on the page:

Quasi o amor, quasi o triunfo e a chama,
Quasi o princípio e o fim — quasi a expansão...
Mas na minh’alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
(Quasi, 13 May 1913)

Almost love, almost triumph and flame,
Almost the beginning and the end - almost the expansion...
But in my soul everything spills out...
However, nothing was just an illusion!

Sadly a life cut short at age 25.
Profile Image for Ligia Leite.
85 reviews4 followers
Read
October 19, 2021
Poemas do quase. Sobre ser em potência mas não em realidade, sobre uma vida de passado ou de potência, nunca de presente. Leitura dura para quem não é acostumado com poesia, mas que ganha corpo quando relacionada à biografia do autor. Bonito e incômodo.
Profile Image for Klissia.
854 reviews12 followers
August 17, 2020
O homem labirinto,o homem mistério, o homem fragmentado ,o homem " sentidos" em busca de alma,de existir. Mario de Sá de Carneiro é genial.
Profile Image for Byyya.
23 reviews
February 10, 2022
Quero sentir. Não sei... perco-me todo...
Não posso afeiçoar-me nem ser eu:
Falta-me egoísmo pra ascender ao céu,
Falta-me unção pra me afundar no lodo.

I love my depressed dad <33
Profile Image for Aster.
9 reviews1 follower
March 1, 2024
"Numa ânsia de ter alguma cousa,
Divago por mim mesmo a procurar,
Desço-me todo, em vão, sem nada achar,
E a minh'alma perdida não repousa."
Displaying 1 - 20 of 20 reviews

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