Nas crônicas de Luís Henrique Pellanda, o centro de Curitiba é o cenário de histórias quase invisíveis, flagrantes do cotidiano que revelam o que há de perverso – e também de encantador – nas ruas anônimas de uma metrópole. O que pode escapar à percepção da maioria de nós é retido na memória do cronista. Assim nasce uma galeria de situações e personagens bastante particular: a prostituta que joga pétalas de rosas sobre a menina que dorme na praça; a alucinada estreia do filme The Doors no antigo Cine Plaza; um assassinato – cinco tiros na cara – bem debaixo da janela do autor; a macaca dançarina que hipnotiza o músico; a mocinha com o canivete, lembrança de um verão distante.
Luís Henrique Pellanda tem nossa idade, 39; compartilha nosso perímetro urbano, 434.967 km2; e usa nosso CEP, um número entre 80.000-000 e 82.999-999. Sorte nossa! Por conta dessas semelhanças, ele assiste ao espetáculo humano que passa todos os dias em Curitiba e, se perdemos algo, ele não; Luís Henrique não perde nada.
Nós Passaremos em Branco (2011) é o título do livro que reúne crônicas que ele publicou entre 2010 e 2011 no site de que é coeditor, o Vida Breve. Curitibano de nascença e criação, jornalista, escritor e músico, o autor tem alguns temas constantes em seus textos: Curitiba e seus personagens anônimos, que via de regra são mendigos, crianças de rua, prostitutas, bêbados de todas as estirpes, velhos e velhas que brigam no meio da rua e mulheres gostosas que se exibem sem pudores pelo Centro de nossa cidade. Também tem um jeito de contar ao que assiste de um modo todo seu: o observador que não se choca com o que parece inverossímil, mas que tenta extrair da realidade algum lirismo, ainda que trágico ou, como acontece frequentemente, tragicômico.
Para quem adotou Curitiba como eu, as crônicas que falam diretamente dela têm mais sabor; são como aquelas histórias que queremos contar aos parentes que ficaram junto com a cidade que deixamos para trás e, quando nos veem, perguntam "então é verdade que Curitiba é boa mesmo?" Não sei, realmente não sei mais responder. A gente se acostuma com o que há de ruim e de bom numa cidade, mas entre tantos que a não suportam, conto-me entre os que lhe têm carinho – possivelmente mais uma semelhança com Pellanda.