Em novembro de 2009, a prestigiosa revista Novos Estudos, do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), publicou um artigo de André Singer que já se tornou um marco da ciência política brasileira. Escrito durante o auge da popularidade desfrutada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, “Raízes sociais e ideológicas do lulismo” analisava o grande realinhamento eleitoral ocorrido no país durante o pleito de 2006. O subproletariado - isto é, a massa de dezenas de milhões de pessoas excluídas das relações de consumo e trabalho, e que sempre havia se mantido distante da ameaça de “desordem” representada pela esquerda - aderiu em bloco à vitoriosa candidatura à reeleição. Ao mesmo tempo, a classe média tradicional se afastou de Lula e do PT após as denúncias de corrupção que originaram o caso do “mensalão”. Invertia-se, desse modo, a trajetória eleitoral do partido e de seu principal líder, até então apoiados majoritariamente pelos eleitores urbanos e pelos estratos sociais de maior renda e instrução. Neste ensaio inédito, muito aguardado pelos observadores e atores da política nacional e que cristaliza suas reflexões sobre o tema, o autor explica como a manutenção da estabilidade econômica e as ações distributivas patrocinadas pelo Estado estão na raiz do massivo apoio das classes populares a Lula - e, a partir de 2010, a sua pupila Dilma Rousseff. Grande conhecedor dos bastidores do PT e do primeiro governo Lula, Singer realiza uma aguda radiografia das relações de classe e poder no Brasil.
Considero o livro um relato interessante sobre as condições que fizeram com que o Lulismo emergisse, começando na eleição de 2003, e as políticas que o ajudaram a consolidar.
O prof Singer tem um estilo de escrita muito claro, mas sem deixar de perder a eloquencia com que expõe seus argumento. Apresenta uma visão autocrítica, principalmente quando se refere ao reformismo fraco do governo petista, deixando claro as teses do PT Sion e do PT Anhembi, a qual achei bastante clara e didática.
Uma análise importante dos primeiros oito anos de Lula na presidência (a partir de 2023 teremos mais quatro). Um recorte importante que coloca em jogo todas as forças sociais que transformaram aquele governo no que ele de fato foi (e por isso se justifica o subtítulo). De um viés marxista, Singer faz críticas e elogios contundentes a tudo que o período representou. De uma leitura clara e direta, o livro é profundamente interessante para quem deseja entender não só o Brasil da primeira década do século XXI, mas também o Brasil de agora e onde chegamos, ou onde não chegamos. (Nas páginas finais do último capítulo o autor delineia claramente as preocupações que possui com um eleitorado evangélico sectarista que poderia representar um breque futuro ao país que se pensava então - o que de fato veio a acontecer).
bacana acompanhar a linha de raciocínio de um cientista político que esteve dentro do primeiro mandato do lula e, posteriormente, se interessou em investigar os sentidos daquele governo com pouco distanciamento histórico.
o ecletismo teórico dos primeiros capítulos e a narrativa da ascensão do partido são pontos que rendem MUITA reflexão. sinto que esse livro rende um curso inteiro, sobretudo se tensionado com a obra 'reforma e crise política no Brasil', de armando boito jr.
nem tudo se sustenta. tenho um pouco de dificuldade em incorporar integralmente o conceito de 'lulismo' pela carga weffort/ianni que ele carrega (pode ser implicância minha).
contudo, trata-se de uma leitura fundamental pra quem busca refletir e debater sobre esse fenômeno fascinante que é o PT na história política brasileira.
A convivência das duas almas do PT leva a paradoxos. O partido defende, simultaneamente, reformas estruturais profundas e a estabilidade econômica; propriedade social dos meios de produção e respeito aos contratos que garantem os direitos do capital; um postulado genérico anticapitalista e o apoio às grandes empresas capitalistas; “a formação de uma cultura socialista de massas” e acordos com partidos de direita. As diferentes descrições da mudança do PT, que apontam ora no sentido da mudança maximizadora ora no da manutenção do modelo organizativo original, perdem de vista que o característico da fase que se abre em 2002 é a coexistência de dois vetores opostos num mesmo corpo partidário.
A vitória de Lula nas eleições presidenciais, após sucessivas tentativas frustradas, galvanizou expectativas, especialmente à esquerda do espectro político. André Singer, que participou do primeiro governo Lula como secretário de comunicação social, discute as principais decisões do governo (políticas públicas) e sua aproximação maior ou menor com o ideário "de esquerda" exposto programaticamente pelo Partido dos Trabalhadores. Sua análise se estende por ambos os governos Lula e pelo início do primeiro governo Dilma. A partir da crítica oriunda de setores do Partido dos Trabalhadores, segundo a qual o governo Lula abandonou as bandeiras históricas da esquerda, - ataque às desigualdades sociais com redistribuição das riquezas e redução da pobreza - procura demonstrar ter sido alcançado progresso em ambas as áreas. Refletindo a partir de indicadores de distribuição de renda entre os diversos estratos sociais e, especialmente, dos dados de repartição dos votos nas sucessivas campanhas eleitorais vencidas pelo Partido dos Trabalhadores (LULA I e II e DILMA I), conclui que as medidas adotadas, ainda que rotuladas como um "reformismo fraco", propiciaram alguma redistribuição de renda, beneficiando específico setor da população nacional (classes C e D). Programas como o Bolsa Família e Minha Casa Minha Vida são referidos como medidas concretas neste sentido. A política econômica adotada, reconhece o Autor, não confrontou o capital, entenda-se, o setor financeiro, seja por conta da taxa de juros praticada, seja pela ênfase na expansão do crédito destinado ao consumo de bens duráveis. Essa circunstância, tida pelos críticos como demonstração de fraqueza e incoerência, é apontada como condição para o implemento, ainda que gradual, das reformas estruturais ambicionadas. Se as reformas iniciadas pelo governo Lula serão ou não chanceladas pelo eleitorado e aprofundadas, é algo que o futuro dirá.
Os sentidos do lulismo é um livro, ao mesmo tempo, brilhante e equivocada. Singer realiza ótima análise das clivagens políticas que animaram as mudanças no lulismo e no comportamento do PT. As observações do autor sobre a mudança do eleitorado do Pt e sobre as políticas que resultaram nessa mudança são enriquecedoras intelectualmente. Por outro lado, o livro sofre de um grande déficit de ciência política e moderação ideológica. Filiado à esquerda e partidário do Pt, singer não poupa elogios ao governo, ainda que critique a incapacidade do partido de realizar o seu potencial. Sua opção pela análise da luta de classe é injustificada, uma vez que é completamente irrelevante para as conclusões do livro. Por fim, Singer faz análise francamente opinativas, sem qualquer base científica, como quando afirma que a classe média abandonou lula apenas por se ressentir da popularização dos espaços de consumo, quando a própria análise de Singer sugere que as políticas públicas do Pt são somente voltadas para o capital e para os mais pobres. Vale a leitura, desde que uma decantação da gordura ideológica seja realizada.
Um bom livro para entender alguns dos motivos de sucesso dos governos Lula e sua continuidade com Dilma. As mudanças alcançadas no período agradaram elite e o que o autor denomina de subproletariado, fortalecendo os laços com uma política que mantém estabilidade e ordem com uma mudança silenciosa para os mais pobres. Resta saber se essas mudanças irão continuar para alcançar não apenas a redução da pobreza, mas da desigualdade.