Adaptação, crise e reestruturação imperial são os temas centrais deste livro, o primeiro do historiador e brasilianista Kenneth Maxwell. Nesta obra, o autor analisa o episódio da Inconfidência Mineira a partir do ponto de vista dos movimentos sociais e econômicos de seu tempo, e mostra de que forma esse episódio de cisão com o império foi ditado por forças estruturais, e não apenas pela atuação de personagens históricos. O texto revê, com base em extensa pesquisa fundamentada e em ampla documentação, a cronologia da Inconfidência. Ao examinar a situação econômica e política da coroa portuguesa e as consequências desses fatores e de sua dependência em relação à Inglaterra sobre a elite colonial, redimensiona o papel dessa elite na conjuração. A obra de Maxwell revisa a versão oficial, tradicionalmente estudada nas escolas, oferecendo outra interpretação, tornando possível a abordagem dos fatos históricos em torno da Inconfidência de forma crítica. Esta reedição ampliada e ilustrada apresenta um novo caderno de fotos, que funciona como um roteiro imagético da história. Os mapas e os documentos aqui reproduzidos enriquecem de forma contundente a compreensão do período.
Kenneth Maxwell was the founding Director of the Brazil Studies Program at Harvard University's David Rockefeller Center for Latin American Studies (DRCLAS) (2006-2008) and a Professor in Harvard's Department of History (2004-2008).
From 1989 to 2004 he was Director of the Latin America Program at the Council on Foreign Relations, and in 1995 became the first holder of the Nelson and David Rockefeller Chair in Inter-American Studies. He served as Vice President and Director of Studies of the Council in 1996. Maxwell previously taught at Yale, Princeton, Columbia, and the University of Kansas.
Kenneth Maxwell founded and was Director of the Camões Center for the Portuguese-speaking World at Columbia and was the Program Director of the Tinker Foundation, Inc. From 1993 to 2004, he was the Western Hemisphere book reviewer for Foreign Affairs. He is a regular contributor to the New York Review of Books and was a weekly columnist between 2007 and 2015 for Folha de São Paulo and monthly columnist for O Globo from 2015.
Maxwell was the Herodotus Fellow at the Institute for Advanced Study, Princeton, and a Guggenheim Fellow. He served on the Board of Directors of The Tinker Foundation, Inc., and the Consultative Council of the Luso-American Foundation. He is also a member of the Advisory Boards of the Brazil Foundation and Human Rights Watch/Americas. Maxwell received his B.A. and M.A. from St. John's College, Cambridge University, and his M.A. and Ph.D. from Princeton University.
Interessante que a melhor obra a respeito do tema tenha sido escrita por um historiador estrangeiro. Na verdade, tal feito não deveria causar espanto, visto que a Inglaterra tem um papel indelével na história luso-brasileira. O cidadão inglês é quase um irmão do brasileiro.
Apesar do objetivo anunciado no título da obra ser analisar a "inconfidência mineira", Maxwell precisa, antes disto, recontar todo o percurso de eventos que causariam as desordens políticas, econômicas e sociais, dando vazão e ensejo aos movimentos conspiracionistas contra a coroa.
Em sua ótica tal gama de eventos surge a partir da nomeação de Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal. Os três primeiros capítulos vão tratar dos contextos envolvendo o ministro, sua nomeação, a situação em Portugal e na América portuguesa; há uma ênfase sobre os pontos econômicos e seus desdobramentos, na escrita do autor.
Vemos em detalhes as descrições das medidas pombalinas, suas políticas econômicas e fiscais; as reformas das companhias de comércio, o recebimento das novas diretrizes e o arranjo burocrático que se formou no outro lado do Atlântico; além de todos os conflitos entre as autoridades portuguesas, as oligarquias locais e os jesuítas.
Este livro é, também, uma excelente fonte para quem deseja estudar o fenômeno da corrupção política e a tradição de favorecimentos buscados pelas elites, pois, dentro do contexto pombalino, Maxwell demonstra um complexo sistema de contrabando, troca de favores e de situações delicadas às quais a coroa portuguesa tinha de se submeter: da mesma forma que a falta de empresários nativos tinha constituído um sério obstáculo ao desenvolvimento econômico nacional na metrópole, a burocracia luso-brasileira estava ainda menos preparada para enfrentar toda a gama de reformas complicas e frequentemente de longo prazo.
Cito a Maxwell: "O Estado pombalino, em suas criações administrativas, em ambos os lados do oceano, envolvia magnatas locais e negociantes em órgãos do governo, com uma deliberação que raiava o desvario. Comerciantes e homens de negócios tinham sido atraídos para as seções administrativas da Fazenda Real, feitos delegados da Junta do Comércio de Lisboa, nomeados para as intendências coloniais do ouro, transformados em funcionários fiscalizadores da administração dos diamantes. Até na magistratura eles figuravam! A exemplo de Alvarenga Peixoto, que tornou-se magistrado superior da coroa, com funções judiciais e administrativas em uma zona de que ele procedia e onde era proprietário de muitas terras e minas, além de ter interesses comerciais. Na verdade, foi devido a tais interesses que ele quis o cargo".
o Estado colonial não funcionava em favor do bem comum, mas em função de quem ocupava os cargos. A autoridade governamental, a nível local, sempre se apoiara em um acordo de tolerância mútua entre os poderosos da zona e a administração real. Um Estado do século XVIII, entretanto, embora formalmente autocrático, contava, em última instância, com limitados poderes de coerção. O sistema pombalino, reconhecendo e oficializando este status quo, e carente de burocratas honestos e eficientes, assumia riscos consideráveis ao trazer as oligarquias locais tão para perto da estrutura governamental. Na imensidão brasileira o poder e a riqueza não eram contidos pelas restrições mais sutis de uma sociedade tradicional. Medidas que pareceriam lógicas em um pais pequeno como Portugal, onde a autoridade do monarca sempre estava próxima, e as benesses ou o descontentamento do governo central podiam se fazer sentir mais rápida e efetivamente, produziam na colônia efeitos completamente opostos aos pretendidos.
Supervisar e conter as atividades dos interesses privilegiados estabelecidos de Lisboa era bem diferente do que controlar os dos colaboradores coloniais admitidos no esquema administrativo-militar do Brasil. Na América portuguesa os postulantes à posição de agentes da autoridade real não eram, comumente, distinguíveis da plutocracia brasileira, e o Estado em vez de moldar os colaboradores escolhidos ao seu interesse era, ao contrário, submetido às ambições pessoais e aos interesses dos homens que participavam dos órgãos do governo.
Nos capítulos destinados à conspiração de Vila Rica veremos detalhes pormenorizados das reuniões dos inconfidentes, seus planos e estratégias. Kenneth Maxwell não perde de vista as ações dos conspiradores conforme as diretrizes das autoridades da capitania tomavam esta ou aquela decisão; nem deixa de descrever o cenário internacional e quais eram as influências externas que inspiravam os membros. Numa perspectiva individual, sabemos das motivações dos envolvidos mais famosos, perfil psicológico, histórico social, posicionamento público e rede de relacionamentos.
Após narrar os eventos da Inconfidência, Maxwell segue descrevendo o novo cenário econômico e os efeitos direitos e indiretos causados pela conspiração. O revigorado ambiente favorável ao açúcar deu frescor ao ânimo de certos grupos, entretanto, foi o responsável por alguns problemas de ordem social, que ocorreram na mesma ocasião das revoltas dos escravos negros das Antilhas, colônia francesa. Temos em vista, então, a conjuração dos alfaiates, ocorrida na Bahia, em 1798, dez anos depois dos primeiros encontros dos inconfidentes em Vila Rica.
O último capítulo trará, além destes pontos relacionados ao levante ocorrido na Bahia, as medidas de D. Rodrigo de Sousa Coutinho, na tentativa de reformar o Estado colonial. No seu plano para o império era clara a sua preocupação com Minas Gerais; suas proposições específicas e seus projetos de reformas eram concebidos em termos que revelavam uma profunda análise dos problemas que tinham estado na raiz dos que conduziram ao confronto da década de 1780:
"1- A divisão de responsabilidade entre a Fazenda e o ministro dos Domínios Ultramarinos tinha sido responsável pela falha da eficiente supervisão das atividades da Junta da Fazenda de Minas; 2- O envolvimento dos governadores locais em empreendimentos de duvidosa propriedade provara o facciosismo. 3- A responsabilidade dos magistrados na contratação das receitas tributárias gerara o conflito entre Cunha Meneses (governador anterior a Barbacena) e Gonzaga (um magistrado importante). 4- A dificuldade de transferir as tropas tornara os Dragões de Minas sensíveis às pressões locais. 5- As imensas dívidas dos contratantes e sua falha no pagamento dos atrasados tinham sido o fator crítico de seu envolvimento na conspiração. E, além do plano de fundar casas de cunhagem de moedas em Minas, a sugestão de liberalizar a regulamentação do Distrito Diamantino e a de avaliar o ouro em 1$500 réis por oitava, a disposição de criar escolas de mineração e a determinação de fundar fábrica de pólvora e de explorar minério de ferro, eram, todas elas, chocantes lembranças das proposições apresentadas 10 anos antes, em conciliábulos secretos em Vila Rica."
Vemos que, desde o mais alto grau do governo, muitas reivindicações dos inconfidentes mineiros tinham sido aceitas e, em 1798, estavam sendo trabalhadas com seriedade com vistas a transformá-las em leis. Tal feito demonstra que em nossa história temos diversos nomes de estadistas sóbrios, verdadeiramente a par dos problemas a serem resolvidos, e que sabiam retirar importantes lições dos eventos da ordem do dia.
É papel do bom historiador demonstrar as fontes que nos estão disponíveis e, além disto, demonstrar os terrenos alagadiços e de difícil acesso. Nosso autor não peca em seu ofício: fala a respeito dos problemas encontrados nas fontes primárias e nas controvérsias que giram ao redor dos relatórios oficiais, dos depoimentos dos inconfidentes realizados nos momentos de inquérito, nas medidas suspeitas dos governadores, magistrados e comandantes militares. Diversas questões, que poderiam vir a modificar completamente a visão que hoje nós temos a respeito dos eventos ocorridos em Minas, infelizmente, não têm, nem terão, uma resposta totalmente segura, nem definitiva: no fim das contas, é uma história repleta de encontros secretos, traições, assassinatos, mentiras, trapaças, delações, trocas de correspondência sigilosas e queima de arquivo. Muito do que sabemos continuará sendo apenas ilações e suspeitas.
The preface was fabulous...and then the book started. Economic history makes me want to gouge out my eyeballs. It got better starting around chapter 5. Hopefully useful! :-p