O que os cientistas sabem — e o que ainda ignoram — sobre a ocupação humana nas Américas. Bernardo Esteves busca os primeiros povos do continente enquanto evoca uma nova forma de fazer ciência.
De onde viemos? Admirável novo mundo recorre aos saberes indígenas e às mais variadas disciplinas — arqueologia, física, genética, linguística — para narrar a história dos primeiros povos americanos. Não fosse uma questão suficientemente fascinante, Bernardo Esteves, jornalista e doutor em história das ciências, nos o que os cientistas ignoram ao construírem suas verdades? Fruto de extensa pesquisa, com ênfase nas investigações em sítios arqueológicos brasileiros, Admirável novo mundo assume a difícil tarefa de descolonizar a história humana no continente. Somos apresentados a outras narrativas possíveis que — seja pelo imperialismo científico, seja pelo desinvestimento na produção acadêmica brasileira, seja pelo silenciamento da perspectiva dos povos indígenas americanos sobre a sua própria ancestralidade — são menosprezadas mundo afora. Uma joia rara da divulgação científica no Brasil.
"Ao partir de uma perspectiva sul-americana, sobretudo brasileira, Admirável novo mundo faz jus à nossa produção científica. Denso e acessível, um livro da mais alta qualidade." — Eduardo Góes Neves
"Uma perspectiva atualizada, rigorosa e minuciosa da história de nossa espécie nas Américas. Bernardo Esteves alinhava com maestria o debate científico, suas contradições imperialistas, e a necessidade de descolonizar a pesquisa em prol de relações respeitosas e paritárias com os povos indígenas. Um livro fascinante, de valor inestimável para a consciência de nossa ancestralidade." — Sidarta Ribeiro
"Admirável novo mundo mostra que, tal qual nas tramas de detetive, a ciência avança não só à base de evidências, mas também de intuições, enganos, vaidades, intriga e sorte. Um livro exemplar sobre a dimensão humana e política da investigação científica." — João Moreira Salles
Admirável novo mundo é um excelente trabalho de revisão bibliográfica e divulgação científica.
Esteves, que é jornalista, doutor em Ciências e professor de comunicação científica, dedicou dez anos a fazer uma atualização sobre o estado do conhecimento relativo a uma questão polêmica no campo da arqueologia: a cronologia, vias de entrada e modos de ocupação humana do continente americano. Para tanto, o autor, além de mergulhar na bibliografia científica de referência, realiza entrevistas individuais com as vozes mais relevantes do campo.
Desde a introdução, Esteves adverte que a perspectiva do livro é sul-americana, e esta afirmação vai ganhando sentido à medida que avança a leitura. Basicamente, e desde o século XIX, a hipótese de povoamento das Américas foi-se perfilando como uma entrada pelo estreito de Bering nalgum momento após o final da Era do Gelo. A partir daí, na América do Norte constituiria-se a cultura de Clóvis, 13 mil anos atrás e, só depois, essa população se espalharia em direção ao Sul, dando origem a todos os povos indígenas das Américas.
Esta teoria foi amplamente defendida pela arqueologia norte-americana, e com tanto afinco que um século de acumulação de evidências contrárias pareciam não abalar nem um pouco a construção cultural e científica de chamada "primacia de Clovis”. Esteves acompanha no livro os principais argumentos dos debates que são gerados apartir da descoberta de cada nova evidência que aponta para povoamentos mais antigos e que sugerem origens não vinculadas a Clóvis. Essas discussões vão perfilando uma série de hierarquias no campo científico à hora de a comunidade validar a autenticidade de cada descoberta. A primeira é que qualquer descoberta feita na América do Norte é mais importante e, inversamente, qualquer achado na América do Sul é suspeito de falta de rigor, erro metodológico ou irrelevância. Subsidiariamente, a pesquisa tende a ser melhor considerada se o pesquisador dirigindo a escavação é homem e/ou norte-americano.
A queda definitiva da supremacia de Clóvis produziu-se no final do século XX, mas só depois de evidências encontradas nos EUA serem validadas, o que abriu o caminho de validação de resultados já anteriormente identificados no Chile e no Brasil. Hoje parece claro que o povoamento das Américas antecede em vários milênios aquela data de 13 mil anos que durante décadas pareceu inscrita na pedra. Novas formas de datação, incorporação de técnicas diversificadas mas também novos paradigmas epistemológicos abrem espaço para avanços futuros nesta área.
O livro consegue problematizar os enviesamentos e hierarquias que são construídas como objetivas no campo académico, mas que se interligam, consciente ou inconscientemente, com dinâmicas geo culturais de poder. Esteves traz para a discussão a ética da coleta de DNA em populações indígenas contemporâneas, o envio de amostras para laboratórios do hemisfério Norte como uma espécie de exportação de commodities, a necessidade de a pesquisa dar retorno dos seus resultados às comunidades, entre muitos outros elementos de discussão. De forma semelhante ao que propuseram David Graeber e David Wengrow em O despertar de tudo, acho que Feliz novo mundo é uma defesa da incorporação da imaginação e da criatividade na ciência, da superação de paradigmas rígidos e sufocantes que não deixam espaço para pensar mundos possíveis.
O mais surpreendente é que Esteves faz tudo isso de forma leve, compreensível para quem não é da área, e de forma não dogmática.
O livro explora a ocupação da América pelo "homo sapiens". O autor faz um esforço brutal para resumir o estado da arte da literatura do assunto e constroi um vilão claro: a polícia de Clóvis, o grupo de arqueólogos que insiste no pioneirismo do povo de Clóvis, primeiros a chegar no continente há cerca de 13 mil anos - e fustigam qualquer achado anterior a essa data.
A obra tem vários trechos muito interessantes, como o que fala das amostras de sangue indígena imortalizadas negligentemente por cientistas dos EUA, e muito bonitos, como o que imagina as cenas que originaram as pegadas humanas fossilizadas de White Sands.
Mas é necessário fôlego e paciência para enfrentar as 400 páginas da obra. As datas, os nomes dos períodos e dos sítios arqueológicos não à toa constam de tabelas e mapas no início do livro, que consultei invariavelmente para acompanhar o texto. Mantive também meu celular ao lado para ver ilustrações dos artefatos e da megafauna mencionados no texto. Seria interessante ver imagens e informações importantes melhor integradas ao texto principal numa futura edição.
Gostei bastante da leitura, que me incutiu uma curiosidade pela pré-história inexistente até aqui. O cuidado do autor com nossos antepassados me fez pensar também nas milhares de gerações que nos legaram um mundo habitável, e que agora ameaçamos arrogantemente com certos padrões de consumo.
Uma ampla descrição acerca dos paradigmas arqueológicos que fazem parte da história da ciência e as implicações do imperialismo científico dos pesquisadores estadunidenses que culminaram no apagamento e na invisibilidade de muitas culturas que viveram neste continente. Bernardo captura a essência da discussão e a importância do debate, através do método científico, sobre quem valida as descobertas e quais discursos estas validam, colocando em xeque muitas indagações científicas que deixam claro que as histórias dos povos podem servir a propósitos muito além deles mesmos.
Incrível trabalho de pesquisa feito ao longo de 10 anos que gerou um livro fascinante e intrigante sobre a história da ocupação da América. E evidencia todos os vícios e colonialismo existentes na academia sobre a primazia e veracidade dos achados arqueológicos ao longo do tempo.
Um relato jornalístico, mostra as controvérsias sobre a origem da ocupação na América e como os cientistas e pesquisadores debatem e determinam o que vira "real". Uma leitura bem boa, mas acho que é um livro que não vai engajar qualquer leitor.
Quem era os primeiros americanos? De onde vieram? Quando chegaram? Onde viviam? Esse livro busca elucidar os caminhos e descobertas de diversos pesquisadores ao longo das últimos décadas, com um grande enfoque em sítios do Brasil.
Uma incrível jornada cheia de reviravoltas e detalhes sobre a arqueologia nas américas. Um prato cheio pra quem gosta de saber sobre o passado e sobre a produção científica.
Divulgação científica da melhor qualidade. Impressionante trabalho de Bernardo Esteves. Vale a pena ler pra se atualizar nas tretas da arqueologia. Extremamente indicado
Essa leitura traz aquela sensação boa de ter aprendido algo. Nesse caso, dois grandes pilares de informação: por um lado, detalhes sobre as certezas (poucas) e duvidas (muitas) da ocupação humana das Americas; e, por outro, conhecimento sobre como atuam e pesquisam aqueles que estudam essas ocupações. É um trabalho de revisão de literatura muito competente, deixando claras as divergências, vertentes e posturas das centenas de pesquisadores que se debruçam sobre os primeiros americanos. Concomitantemente, é um ótimo exemplo de divulgação científica, traduzindo tudo ao público leigo. O fato de se basear em uma visão decolonial da arqueologia só o aprimora. Quatro estrelas, pois a miríade de pesquisas e dados pode ficar um pouco confusa às vezes: são muitos sítios, datas, histórias etc.