Uma história de ciúmes e loucura, Angústia é o relato de um homem inconformado por não ter consigo a mulher de seus sonhos.
Luís da Silva é um funcionário público de trinta e cinco anos, herdeiro de uma aristocracia rural arruinada. Apaixonado por sua vizinha, Marina Ramalho, ele se empenha para conquistá-la, até fazer da jovem sua noiva. Mas seus ciúmes, grosseria e brutalidade a afastam, levando-a diretamente aos braços de Julião Tavares -- seu pior inimigo. Obcecado pela ideia de recuperar a amada e decidido a matar o rival, Luís narra, na primeira pessoa, seus pensamentos mais sórdidos a respeito da própria realidade e das relações de poder na Maceió desigual dos anos 1930. Publicado em 1936, enquanto Graciliano Ramos ainda estava na prisão, este livro foi considerado, em inquérito da Revista Acadêmica, o segundo maior romance brasileiro, perdendo apenas para Dom Casmurro, de Machado de Assis -- obra com a qual Angústia dialoga imensamente.
Esta edição conta com estabelecimento de texto de Ieda Lebensztayn, crítica literária e doutora em literatura brasileira pela Universidade de São Paulo (USP), e posfácio de Luciana Araujo Marques, jornalista e doutoranda do Departamento de Teoria e História Literária da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Graciliano Ramos was widely considered one of the most important Brazilian authors of the 20th century. He was a seminal voice in the literary "regionalism" movement. As a child Ramos lived in many cities of Northeastern Brazil, stricken by poverty and severe weather conditions (droughts). After high-school, Graciliano went to Rio de Janeiro where he worked as a journalist. In 1915 he traveled to Palmeira dos Indios, state of Alagoas, to live with his father and in 1927 he was elected mayor. In 1933 he published his first book, Caetés. A few years later he was jailed by the Getúlio Vargas government, on a charge that was never made clear. His experiences in jail would become a unique personal deposition, Memórias do Cárcere. Graciliano died in 1953, at the age of 60. His "dry" style of writing and the conflict between the id and the world are the significant marks of his works.
“O caminho para ler Graciliano Ramos é você estar aberto a ver a humanidade sem anestesia.” Elizabeth Ramos (neta do autor)
Angústia foi publicado em 1936 e Graciliano Ramos foi preso pela ditadura Vargas ainda antes de terminar a revisão do texto.
Luís da Silva é o narrador/protagonista da história. Contada em dois tempos vai misturando o presente e o passado, a infância no Sertão e o mundo adulto e urbano atuais. Da criança que foi ao homem que é, percebe-se a inadaptação permanente, a exclusão e ressentimento constantes.
Luis é funcionário público, trabalha como jornalista para um jornal sujeito à censura do Governo. Vive modestamente e não desenvolve muitas relações sociais. Circunstâncias inesperadas vão despoletar o carácter obsessivo de Luís da Silva e dar azo a um delírio que vai aumentando num crescente de loucura e tortura pessoais. Enquanto vamos assistindo ao declínio da personagem, enquanto o vemos afundar num discurso repetitivo e fragmentado, vamos percebendo que aquela angústia já tomou conta de nós na mesma medida. Mas não ficamos por aí; vamos compreendê-lo e ficar do seu lado. Vamos sentir compaixão e empatia por alguém que cometeu um ato condenável, e desejar que não seja apanhado.
Tem tanto de frenético e incómodo, como de incrível.
Para a teologia mística tradicional, existem três tipos de intervenção demoníaca, ou preternatural, na alma do homem: a tentação, a obsessão e a posessão. Muito embora a terceira fase, mais espetaculosa, possa ocorrer em pessoas moralmente corretas, de certa forma "ex nihil", entre a tentação e a obsessão há uma clara hierarquia demoníaca, sem solução de continuidade.
Angústia, o romance mais ambicioso de Graciliano Ramos, é uma fenomenologia de como a tentação, quando não se procura vencer, quando o sujeito se fechou para a transcendência, passa à obsessão. É, na minha particularíssima opinião, um dos poucos romances brasileiros que contribui de modo universal para a compreensão da alma humana e de seus mecanismos.
Narrado em primeira pessoa, aparentemente nos conta eventos do passado, mas logo esse esboço de memorial é abandonado, e as amarras estilísticas de uma narrativa de lembrança são afrouxadas em favor duma concentração no fluxo de pensamentos do personagem principal e narrador, Luís da Silva.
Ficamos sabendo que Luís da Silva é da terceira geração de uma família de senhores de terra em decadência após a abolição da escravatura. Foi uma criança estranha, que brincava sozinha, funcionalmente aleijada por uma queda de cavalo, e que ouvia vozes vindas das paredes nos momentos de silêncio. Sinal duma perturbação inicial é a forma como trata seu avô e seu pai: o avô, que ainda guardava veleidades de importância em sua decrepitude, é tratado pelo nome completo: Trajano Pereira Aquino Cavalcante e Silva. O pai, um folgazão metido em leituras quixotescas, já é menos importante: Camilo da Silva. O narrador se lembra a si mesmo como o Seu Luisinho saído da boca do Seu Ivo, um mendigo que lhe vem importunar por vezes. Enfim, sente-se como o fim duma linhagem, a concentração de uma queda vertiginosa de poder.
Após passar fome e vagar pelo mundo, usou de suas letras e de uma boa dose de servilismo para ganhar seu pão, no que marcou de vez sua oposição ao mundo da infância, o mundo que vemos em outro romance de Graciliano, São Bernardo. Luís é Paulo Honório e Madalena e Padilha juntos, e ainda todos os personagens trágicos do movimento nordestino. Fruto de uma mixórdia de raças e culturas, influências desencontradas, de músculos flácidos, contrários aos duros tóraxes de seus antepassados, está metafisicamente perdido no mundo.
Luís embate-se com um problema mudo, ou não expresso no livro: ele é o último de sua linhagem, decaiu mais do que seus antepassados, e agora, com 35 anos, arrisca-se a morrer solteiro, sem filhos, encerrando aquele tronco que com seu avô Trajano era vigoroso. Sem jeito que é para com mulheres, falta-lhe a leve arrogância necessária para conquistá-las. Afora Marina, de que já tratarei, ele apenas contou com o serviço de prostitutas caridosas e maternais, nunca conquistou nenhuma mulher, vencendo-lhe as naturais barreiras da pudidícia. No entanto, em episódios claramente szondianos, os personagens de seu passado vão-lhe enchendo a cabeça, num cortejo por vezes medonho, embaralhando-lhe a percepção da realidade, impelindo-o não só a procriar com Marina, como a repetir seus feitos, seus erros e acertos. Mas seus braços são fracos, seus dedos escuros, seu fôlego falta, e se instala uma crise de auto-imagem pavorosa.
Uma breve busca em compêndios de crítica literária mostra que sobre o advento de Marina, seu enrabichamento por Julião Tavares e o assassinato cometido no fim muitas linhas foram escritas, competentes e às vezes magistrais linhas, as quais não repetirei. Mais importante que os acontecimentos externos, para mim, tanto na primeira leitura, feita em 2011, quanto nesta releitura, são aqueles de ordem psicológica, e a linguagem empregada para descrevê-los.
A epítome didática dessa linguagem está nas últimas páginas do romance, um longo, imenso parágrafo, onde fantasmas, alucinações e realidade se entremesclam no melhor estilo “Jacob’s Ladder”, atingindo até mesmo o gênero de horror psicológico que falta aos outros romances de Graciliano (mas que curiosamente encontra paralelo numa passagem de terrores noturnos do pequeno Graciliano no autobiográfico "Infância"). Mas essa confusão também se vê em estágios anteriores da narrativa, quando o personagem, tentando calar sua brutalidade, acaba cedendo às tentações e abrindo a porta para a obsessão.
Vêm bem a calhar a estas linhas, e não acredito de forma alguma que esse “calhamento” seja obra do acaso, que o professor Olavo de Carvalho tenha dado recentemente a aula sobre estase imaginativa. Pois é disso que, no campo intelectual, trata o livro. Luís da Silva admite mesmo que só lia porcaria, romances inúteis, não tinha acesso à grande literatura, que no fundo o intimidava. Entre isto e a frivolidade de Marina, bem como o balão de gás de Julião Tavares, há em verdade pouca distância.
A falta de imaginação de Luís gera, nesse plano intelectual, um campo fértil para suas obsessões. O retorno sempre e sempre das mesmas figuras, o apego inarredável a histórias e passagens de sua vida, mostra a que estágio um homem privado de alimentação, descanso e condições mínimas de dignidade física e mental, em grande parte por sua própria culpa, pode chegar.
O processo de civilizamento da alma de Luís é incompleto e imperfeito. O ambiente depressivo em que se meteu o domina e simboliza todo o horizonte de consciência atingido pela vida citadina. Desespero e angústia o espreitam a cada novo acontecimento. Mesmo seus bons momentos com Marina são objeto de crítica e acidez, o personagem não se pode permitir a felicidade.
Apesar disso, ainda é capaz de sentir culpa, de se inquietar eloquentemente, ao contrário de outro personagem de Graciliano, Paulo Honório. Como não se lembrar das famosas linhas:
“nunca soube quais foram os meus atos bons e quais foram os maus. Fiz coisas boas que me trouxeram prejuízo; fiz coisas ruins que deram lucro. E como sempre tive a intenção de possuir as terras de S. Bernardo, considerei legítimas as ações que me levaram a obtê-las”.
Talvez faltasse a Luís essa visão clara do que faz e de seus objetivos. Ao contrário, ele devaneia, e chega a crer em absurdos, como, por exemplo, que aparecer no teatro, supreendendo Marina e Julião Tavares, ia trazer a pequena para seus braços. E depois que os dois se separam, ele só sabe a chamar de puta, não a acolhe nem considera a possibilidade de perdoá-la, perdendo a oportunidade de se reconciliar com a garota.
Para mim, Angústia lembra por demais o grande romance “Crime e Castigo”. Todavia, o romance russo começa com o personagem já obcecado pela idéia do crime, e se ocupa dum processo análogo ao que, em Angústia, vamos ver apenas no final. Mas a analogia entre um e outro não se finda na semelhança do tema e da abordagem, e na diferença do momento encompassado pela narrativa.
Se todas as críticas e livros inteiros sobre o grande livro de Dostoievsky fossem perdidos, ficaria uma impressão unânime: a profunda perturbação, arrependimento e promessa de redenção de Raskolnikoff. A este luxo de complexidade, não entrega Graciliano o seu Luís da Silva.
E o livro começa onde termina, como um círculo, um eterno retorno nietzscheano: ao personagem não é dado recuperar-se, fica preso para sempre em suas misérias. Carpeaux comentou que Graciliano tem grande compaixão pelos seus personagens. Talvez a grande compaixão de um gênio ateu se limite mesmo a livrar o criminoso do doloroso processo de expiação, para o qual não vê qualquer transcendência, ou reconhece alguma salvação.
Luiz da Silva até que estava indo bem na capital onde trabalhava como funcionário público .Contudo certo dia aparece Marina ,moça linda , sapeca , e vem morar do lado de sua casa...A partir daí acabou lhe o sossego. Luiz logo se apaixona por Marina , os dois namoram , mas aparece Julião Tavares e lhe rouba Mariana usando sua posição e riqueza. Luiz da silva começa a enlouquecer , se torna obcecado por Mariana e no final do livro sua loucura atinge o ápice irreversível. Um livro pesado , sufocante , deprimente mas que você não consegue parar de ler.!
Graciliano tem uma habilidade admirável de criar personagens com densidade psicológica, quase como se pudessem sair andando pelas páginas. Em “Angústia”, talvez o autor tenha conseguido criar o mais real deles, Luís Pereira da Silva, e isso justifica o título da obra, já que o leitor realmente compartilha esse sentimento atormentador com o protagonista.
Luís é um homem desiludido e que sofre não apenas pela sua vida solitária e frustrada de funcionário público, mas também por conta de uma paixão não correspondida. Ao intercalar presente e passado, esse personagem - que pode facilmente ser definido como detestável - nos conta desde o primeiro momento quando conheceu a sua vizinha, Marina, por quem passou a desenvolver uma verdadeira obsessão. E a forma como Graciliano narra toda essa ansia do personagem é impressionante, porque carrega o leitor fundo nos pensamentos de Luís.
É possível sentir toda essa ansiedade, angústia e desespero vivenciado nas páginas do livro, que acabam levando Luíz para um declínio. E se o leitor consegue sentir isso é porque Graciliano se valeu de uma escrita bem mais densa e lenta. Há uma dedicação no desenvolvimento psicológico do Luís, o que para alguns leitores pode ser desafiador. Mas, repito, é um processo necessário - ainda que talvez em excesso, no caso - para a criação de um personagem tão real e capaz de transmitir suas emoções. Graciliano também utiliza bastante da técnica do fluxo de consciência para expor o que se passa - de forma desordenada e ansiosa - na cabeça de Luís.
Além disso, como a obra se passa em uma época de repressão do governo de Getúlio Vargas, é muito interessante como o autor também insere críticas sociais a partir da visão do protagonista. Inclusive, a questão social e política extravasa as páginas de “Angústia”, já que Graciliano foi preso pouco tempo depois de finalizar a obra.
Gostei bastante, mas é um caminho lento e desafiador. Exige atenção e paciência do leitor, mas nas últimas páginas o ritmo aumenta e a experiência acaba valendo o esforço!
"Vamos andando sem nada ver. O mundo é empastado e nevoento. Súbito uma coisa entre mil nos desperta a atenção e nos acompanha. Não sei se com os outros se dá o mesmo. Comigo é assim. Caminho como um cego, não poderia dizer que me desvio para aqui e para ali."
Angústia de Graciliano Ramos Com algum humor mas também denso e amargo, este livro escrito em 1936, conta a história de Luís da Silva, um atormentado funcionário público, que chega ao limite psicológico com as várias circunstâncias que a vida lhe dá . Escritor fracassado , sem sorte no amor tudo acontece a Luís.
Podia ser mais um romance sobre as misérias do Nordeste, das relações entre classes sociais, problemas de uma sociedade rural e todos esses temas que são muitas vezes abordados na Literatura brasileira . Mas o que mais atrai a atenção, o que é realmente diferenciador nesta obra, é a forma como é contada. A narrativa é toda contada na primeira pessoa. É uma espécie de diário, confissão que Luís faz ao longo de todo o livro . A visão dos acontecimentos e o julgamento dos mesmos, tudo pela voz de Luís da Silva. A última frase do livro como que completa a primeira , e leva-nos a pensar que por mais que fizesse, Luís nunca conseguiria mudar sua vida, nunca escaparia de sua própria prisão, dos seus dilemas, o mundo seria o mesmo sempre, mesquinho, e angustiante , triste e deprimente. Um grande clássico da literatura Brasileira, ao qual por mais que se escreva jamais faremos justiça tal a qualidade desta obra ...
"Levantei-me há cerca de trinta dias, mas julgo que não me restabeleci completamente." 4.5 estrelas
Até pra avaliar e registrar as impressões sobre este livro, me sinto apreensivo, pois não sei bem como por no papel as sensações que esta leitura provoca (e ao mesmo tempo acho que é um livro que naturalmente te deixa assim, só olhar o nome do livro).
Vamos ter contato com um fluxo de consciência intenso, com quebras de narrativas frequentes com as rememorações do passado de Luis da Silva. Mesmo não sendo lá um personagem cativante, é um personagem marcante dentro de nossa literatura. Angústia, é daquelas obras que não se encerram com o fim da narrativa e que certamente irei aproveitar mais numa releitura, que com certeza farei. Não é um livro fácil de ser lido, apesar de não ser longo. Muitas vezes tive que reler trechos, mas a partir do momento que você entende que maior parte da narrativa se encontra na cabeça do narrador, tudo faz mais sentido (as lives de discussão da LC do Vá ler um livro, foram essenciais também).
PS: Pra quem leu Crime e Castigo, talvez encontre uma leve semelhança entre os personagens principais (Graciliano sentiria ódio em ver tanta gente falar isso hahahah).
Angústia é como se fosse um Dom Casmurro mais regionalista e sombrio.
Definitivamente também não é o que se espera do autor de Vidas Secas já que Angústia é bem mais denso, extenso e repetitivo. Porém, a técnica do Graciliano permanece: nada do que ele escreve em seus livros é desnecessário, cada frase tem seu significado. As repetições neste livro, portanto, aumentaram ainda mais a angústia que a personagem principal transmite, além de contribuírem para caracterizar a sanidade mental da mesma. Considerando, ainda, que este livro terminou de ser escrito no mesmo dia em que Graciliano foi preso e que publicaram-no sem as revisões extensas que o autor costumava fazer em seus livros, são compreensíveis essas diferenças para as outras obras dele, além de tais características funcionarem bem no livro.
Não dá para ler esse livro em qualquer época da vida mas, assim como outras obras do autor, a leitura desse livro vale a pena pela genialidade da escrita de Graciliano.
Livro maravilhoso. Pode parecer um pouco confuso no começo, pois há uma mistura entrepassado e presente, lembranças, mas nada que demore para o leitor se acostumar se prestar atenção. O final pode parecer em aberto, mas a "finalização" da história é justamente o primeiro "capítulo" do livro. Não é uma história agradável, muito pelo contrário. É narrada em primeira pessoa, um personagem extremamente intragável. Acompanhamos seus pensamentos nada elogiosos aos outros personagens, sempre acompanhados por julgamentos. Difícil simpatizar com qualquer personagem do livro (grande parte devido a ser um livro narrado em primeira pessoa), porém tem algo na história que faz com que você queira continuar a leitura. A escrita não é difícil, o livro não é tão longo assim, porém a aspereza da história e dos personagens pode fazer com que a leitura seja um pouco mais demorada.
Comparado a Vidas Secas, Angústia é um livro bem mais denso. Enquanto Vidas Secas é escrito de forma seca (como o próprio nome já dá a entender), não dá margem para um aprofundamento maior no psicológico dos personagens e foca mais na denúncia social, Angústia faz com que o leitor mergulhe nos pensamentos de Luís da Silva, sua história, seus sentimentos e, principalmente, pensamentos. Obviamente, sendo um livro de Graciliano Ramos, há críticas ao Governo vigente (apesar de não ambientar em uma data específica, dá para saber que é durante o Governo Vargas), aos políticos e aos 'grandes' que dançam conforme os seus interesses. É um livro excelente, que vale muito a pena ser lido por mais pessoas ;)
Ps: Vidas Secas também é um livro maravilhoso que continua, aliás, sendo o meu preferido do Graciliano. Se não leram nenhum dos dois, recomendo ambos. ;)
Não consegui pegar tanto ritmo nesse aqui, inclusive o enredo por si não é nada de outro mundo. Mas o que me fez ficar, e pensar várias vezes “nossa queria estar lendo com mais fôlego pra aproveitar isso aqui” foi experienciar os procedimentos de escrita de Graciliano — que acho que se consagrou de vez como gênio para mim. Em muito me admira a abstração e exatidão de suas descrições; a sensorialidade e metalinguagem de suas analogias; ou ainda a fluidez do tempo não cronológico. Era admirável enquanto leitora perceber o quanto cada uma dessas escolhas se misturavam com o desenrolar do conteúdo, com as tensões psicológicas do protagonista.
Outro ponto positivo de afetação pra mim — na verdade não outro, foi desdobrado desses elementos que citei — foi que achei na leitura um ótimo retrato da mente acelerada e frustrada. Mirabolantes, cansativos, obcecados, duros, furtivos, velozes… Acompanhamos de forma muito real e identificável o como os pensamentos de uma mente insatisfeita pode ser.
Não parece ser a vida pequena, medíocre, do protagonista que gerou uma frustração objetiva ou inevitável. Há um processo complexo, que parece encharcar quando um fato simples desagua em uma frustração última. A partir daí nasce uma insatisfação com poder corrosivo, a angústia generalizada não permite sair da cabeça e sobra um carrasco de vida, um “carrasco do eu”. O carrasco de Luís Inácio faz pensar que chegar nesse estado não é bem sobre como se vive, mas como se sente sobre como se vive.
Em resumo, não foi das leituras que mais me prendeu ou se tornou favorita, mas certamente foi das que grifei coisas que me admiraram pela exatidão das palavras, palavras enquanto literatura e palavras enquanto escancaradoras da realidade humana.
Quando terminei de ler me veio uma frase de um poema de João Cabral de Melo Neto: “uma faca só lâmina”. E foi essa a sensação do livro. Não há palavra certa no lugar certo, a narrativa é uma sobreposição de memórias, umas antigas e outras mais recentes. A solidão é o estado natural do narrador, as aproximações o corrompem. É um livro duro, apertado, sombrio, muito bem trabalhado e tramado. Li uma comparação muito boa: “ao contrário dos filmes de Almodovar, é um romance onde laços de intimidade familiar e amorosa, ou de amizade profunda não são atados. Laço é morte.”
“A água lava tudo, as feridas mais graves cicatrizam”
Meu deus que livro! Virou o meu clássico nacional favorito até agora! É uma loucura como Graciliano Ramos tem uma escrita tão fluída e que te prende tanto! A forma como eu sentia TODOS os sentimentos de Luís da Silva é absurdo! Você sente a angústia, o ciúmes e a raiva que o protagonista sofria durante o livro todo. O romance se passa em Maceió e faz muito sentido o contexto histórico de coronelismo na obra. Esse livro é muito bom! Vale a pena!
A sort of Clarice Lispector's "A Hora da Estrela" meets "Crime and Punishment" by Dostoevsky. "Vida Secas" by Graciliano Ramos was one of the first books I read in Portuguese, and now to read "Angustia", it's, well, anguished. Maravilhosa - can't wait to read the rest of his work.
Tal como as drogas ou o álcool também o amor e a paixão nos deixa fora de nós. Quando essa paixão não é correspondida e a dose é forte demais adoecemos. O que era belo e desejável se torna a nossa ruína, a nossa obsessão, a nossa angústia. Achei este livro bastante parecido com São Bernardo, outra obra do autor. O mesmo tom, o mesmo tipo de protagonista; rude, seco, com a alma cheia de calos e a mente muito, muito perturbada.
o jeito que o graciliano ramos me deixa doida é diferente livro bom, mas tem que ter atenção na leitura pq tem muito flashback. e é bem angustiante mesmo estar na cabeça do Luis, tem hora que a gente fica????? oxe
"Há como que um hiato semântico entre elas, a ser preenchido pelo leitor." Diz o posfácio. Se soubesse que teria que pensar....nem teria começado. Livro ou trabalho?????
luís da silva trabalha na repartição, conta os centavos, é consumido por cigarros e aguardente. apaixonado por marina, se vê num triângulo amoroso com ela e julião tavares, ao ponto de no início do livro parecer uma espécie de bentinho-capitu-escobar. isso porque entramos na cabeça do personagem de forma que até os atos se concretizarem, é difícil separar o que é real do que é puro delírio e vertigem. e aí que na minha opinião mora o encanto da obra, esse tom observador entre mundo interno x externo.
um livro denso, pesado, violento. o que costuma serem elementos que me prendem :) porém, apesar da escrita de graciliano ser inegavelmente talentosa (foi interessante conhecer também um trabalho seu além de “vidas secas”), não achei que o livro tem aquela fluidez. é bem aquele clássico de funcionário público afundado em sua própria solidão, ódio social e niilismo. não fiquei necessariamente angustiada, mas tem um tom bem negativo, me lembrou bastante dostoiévski.
Ô livro chato! Não acontece nada de empolgante ou de significativo pelas primeiras 200 ou 250 páginas, só um narrador descrevendo durante o livro inteiro com detalhismo obcecado o dia-a-dia monótono de personagens desimportantes (o que a empregada, os vizinhos, os associados do trabalho e da rua, o papagaio, o gato e o velho recluso da vila estão fazendo a cada segundo do livro) e um protagonista misantropo revoltado com o mundo reclamando de tudo que tem pra reclamar na vida (sério, o protagonista não tem nenhuma felicidade na vida, dá uma raiva dele). Um casório repentino envolvendo o protagonista e uma garota da vizinhança aparece no meio da história mas desaparece rapidamente, o que dá a impressão que o protagonista inventou o casório menos por amor a noiva e mais para passar o tédio da vida. Num certo momento o protagonista decide cometer um homicídio mas passa tanto tempo só planejando e reclamando do quanto ele odeia o seu desafeto que quando o homicídio finalmente acontece não traz surpresa ou sentimento nenhum e o livro acaba sem uma conclusão ou consequências do assassinato.
No final das contas eu não vi motivo que alguém teria para ler Angústia quando se tem livros muito mais interessantes sobre misantropos revoltados que decidem cometer homicídio como Crime e Castigo de Fyodor Dostoyevsky ou O Estrangeiro de Albert Camus.
Os únicos elogios que eu tenho pra fazer é que eu tenho que aplaudir o autor pelo esforço e pela coragem de terminar esse livro na prisão, e lembrando um detalhe menor, por escrever um personagem judeu (Moisés, um dos únicos amigos do Luis) de forma positiva/neutra do que de forma estereotipada negativa. Entre os Fagins e os Shylocks é raro ver no canône ocidental um autor não-judeu escrevendo um personagem judeu por um ponto de vista positivo, ainda mais para um livro escrito no começo do século XX.
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A forma da narrativa como fluxo de consciência lembra Grande Sertão: Veredas e os livros da Clarice Lispector. Assim, embora genial, um livro difícil de ler. “Angústia” é um monólogo do narrador-personagem, relatando seu momento atual e indo e vindo ao passado remoto e ao passado próximo, em um fluxo narrativo de repetições, lembranças, simbolismos, quase uma narrativa obsessiva-compulsiva mesmo. Nesta cadência, a história do personagem se mistura a elementos de crítica social, expondo as dificuldades do Brasil nas diversas épocas vividas pelo narrador. O título do livro não podia ser melhor. Ler este livro significa entrar nas aflições, nas humilhações, nos sentimentos de inferioridade, inadequação e solidão do personagem. É um livro incrível, trabalho genial. Um clássico que vale a pena.
Em Angústia, acompanhamos o fluxo de pensamento do personagem Luis da Silva, um funcionário público de Maceió, atormentado por seu pessimismo e pela miséria que o rodeia. Tem ódio mortal de Julião Tavares, um herdeiro bufão que se engraça com as mulheres e depois as deixa sem qualquer pudor. Este sentimento toma conta de Luis transformando seus dias em puro desgraçamento mental quando Julião se envolve com Marina, a noiva do servidor.
Não bastasse a desilusão amorosa de Luis, os mundos a sua volta, seus cheiros e barulhos, ratos, piolhos e moscas tornam a narrativa mais violenta e angustiante. Que pauleira é este livro. Recomendo, mas somente em dias de sol.
A escrita de Graciliano Ramos me agrada muito: simples, direta e sem desnecessários rebuscamentos. O fluxo de consciência é muito bem feito em Angústia e é, de fato, angustiante.
O conteúdo é bastante interessante. Impossível não se lembrar de Crime e Castigo com essa temática e com a forma com que é trabalhada.
Um mergulho introspectivo angustiante na vida de Luís da Silva, funcionário público banal acometido de ciúmes excessivo por sua vizinha Marina. Obra magistral de Graciliano. Ainda melhor que Vidas Secas e São Bernardo.