Na Fortaleza dos anos 1930, durante a Era Vargas, Roberto tem a missão de recrutar operários para uma nova célula de esquerda. Uma das pessoas que se interessam é Noemi: mãe de Guri e casada com um homem que não ama mais, ela está em busca de algo que a faça se sentir viva. Nas reuniões do partido, Noemi e Roberto desenvolvem uma conexão intelectual intensa, que os leva a um caso amoroso. Ela se vê, então, testando novos limites morais e éticos, tanto no campo do amor quanto no da política.
Expressão de um socialismo libertário que poucas vezes voltaria a aparecer nos textos de Rachel de Queiroz, Caminho de pedras é considerado seu romance mais engajado. Neste livro, aparecem as primeiras demonstrações de um estilo mais introspectivo e de análises psicológicas que alicerçam cenas de forte intensidade emocional. Um arranjo arguto para contar a história de uma paixão proibida inflamada pela luta.
Em Caminho de pedras , Rachel de Queiroz nos revela a força de uma mulher que decide seguir seus desejos, mesmo que isso implicasse um divórcio. Numa sociedade em que a mulher deveria desempenhar exclusivamente os papéis de mãe, esposa e dona de casa, Noemi é tanto infratora quanto heroína da própria história, pois a punição que sabia que enfrentaria não foi o suficiente para convencê-la a continuar num casamento sem amor.
Quinta ocupante da Cadeira 5, eleita em 4 de agosto de 1977, na sucessão de Candido Motta Filho e recebida pelo Acadêmico Adonias Filho em 4 de novembro de 1977.
Raquel de Queirós nasceu em Fortaleza (CE), em 17 de novembro de 1910, e faleceu no Rio de Janeiro (RJ) em 4 de novembro de 2003. Filha de Daniel de Queirós e de Clotilde Franklin de Queirós, descende, pelo lado materno, da estirpe dos Alencar, parente portanto do autor ilustre de O Guarani, e, pelo lado paterno, dos Queirós, família de raízes profundamente lançadas no Quixadá e Beberibe.
Em 1917, veio para o Rio de Janeiro, em companhia dos pais que procuravam, nessa migração, fugir dos horrores da terrível seca de 1915, que mais tarde a romancista iria aproveitar como tema de O Quinze, seu livro de estréia. No Rio, a família Queirós pouco se demorou, viajando logo a seguir para Belém do Pará, onde residiu por dois anos.
Em 1919, regressou a Fortaleza e, em 1921, matriculou-se no Colégio da Imaculada Conceição, onde fez o curso normal, diplomando-se em 1925, aos 15 anos de idade.
Estreou em 1927, com o pseudônimo de Rita de Queirós, publicando trabalho no jornal O Ceará, de que se tornou afinal redatora efetiva. Em fins de 1930, publicou o romance O Quinze, que teve inesperada e funda repercussão no Rio de em São Paulo. Com vinte anos apenas, projetava-se na vida literária do país, agitando a bandeira do romance de fundo social, profundamente realista na sua dramática exposição da luta secular de um povo contra a miséria e a seca.
O livro, editado às expensas da autora, apareceu em modesta edição de mil exemplares, impresso no Estabelecimento Gráfico Urânia, de Fortaleza. Recebeu crítica de Augusto Frederico Schmidt, Graça Aranha, Agripino Grieco e Gastão Gruls. A consagração veio com o Prêmio da Fundação Graça Aranha.
Em 1932, publicou um novo romance, intitulado João Miguel, e em 1937, retornou com Caminho de pedras. Dois anos depois, conquistou o prêmio da Sociedade Felipe de Oliveira, com o romance As três Marias. Em 1950, publicou em folhetins, na revista O Cruzeiro, o romance O galo de ouro.
Cronista emérita, publicou mais de duas mil crônicas, cuja seleta propiciou a edição dos seguintes livros: A donzela e a Moura Torta, 100 crônicas escolhidas, O brasileiro perplexo e O caçador de tatu. No Rio, onde passou a residir em 1939, colaborou no Diário de Notícias, em O Cruzeiro e em O Jornal. Escreveu duas peças de teatro, Lampião, em 1953, e A Beata Maria do Egito, de 1958, laureada com o prêmio de teatro do Instituto Nacional do Livro, além de O padrezinho santo, peça que escreveu para a televisão, ainda inédita em livro. No campo da literatura infantil, escreveu o livro O menino mágico, a pedido de Lúcia Benedetti. O livro surgiu, entretanto, das histórias que inventava para os netos. Dentre as suas atividades, destacavam-se também a de tradutora, com cerca de quarenta volumes vertidos para o português.
Foi membro do Conselho Federal de Cultura, desde a sua fundação, em 1967, até sua extinção, em 1989. Participou da 21ª Sessão da Assembleia Geral da ONU, em 1966, onde serviu como delegada do Brasil, trabalhando especialmente na Comissão dos Direitos do Homem. Em 1988, iniciou sua colaboração semanal no jornal O Estado de São Paulo e no Diário de Pernambuco.
Recebeu o Prêmio Nacional de Literatura de Brasília para conjunto de obra em 1980; o título de Doutor Honoris Causa pela Universidade Federal do Ceará, em 1981; a Medalha Mascarenhas de Morais, em solenidade realizada no Clube Militar (1983); a Medalha Rio Branco, do Itamarati (1985); a Medalha do Mérito Militar no grau de Grande Comendador (1986); a Medalha da Inconfidência do Governo de Minas Gerais (1989); O Prêmio Luís de Camões (1993); o Prêmio Moinho Santista, na categoria de romance (1996); o título de Doutor Honoris Causa, pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (2000). Em 2000, foi eleita para o elenco dos “20 Brasileiros empreendedores do Século XX”, em pesquisa r
No dia do fim do mundo ninguém gritará. Quem grita pede socorro. E o que fazer quem não espera mais socorro? O afogado não grita porque as águas grandes lhe enchem a boca. E Noemi se sentia mergulhar em águas profundas, sufocada e estrangulada pela voragem.
É, de facto, um “Caminho de Pedras” para os protagonistas deste livro, tanto a nível sociopolítico como pessoal, mas para mim foi um percurso aprazível, porque Rachel de Queiroz é uma autora muito completa: fornece um conteúdo rico num embrulho lustroso.
Noemi rodeava os joelhos com os braços e escutava, de cabeça inclinada, as coisas secretas que lhe vinham nas batidas do coração.
De início, o livro trata sobretudo da criação de uma célula comunista na Fortaleza dos anos 30, com um grupo heterogéneo de brancos e negros, homens e mulheres, “tamancos” e “gravatas”, em que o enviado do Rio de Janeiro, Roberto, tenta doutrinar e organizar, apesar dos conflitos e dos preconceitos sociais.
- É um dos privilégios do burguês, as mulheres; tomam todas, as melhores, bem tratadas, bem cheirosas. Para nós é o rebotalho... E o Paulino tem razão: queremos ter e ainda havemos de ter boas mulheres! - Mas você fala de mulher como de uma presa de guerra – atalhou Filipe. – As mulheres, e as melhores delas, virão para nós, naturalmente. Mas, não assim como você quer, como uma posta de carne arrancada da goela do burguês.
“O Caminho de Pedras” não é, no entanto, apenas um livro sobre a consciencialização política do proletariado, já que Roberto acaba por se envolver com Noemi, uma camarada casada.
Se prendendo naquelas conversas amolecedoras com mulher, em que a camaradagem se perfuma com uma aragem de sexo.
Já tinha percebido em “O Quinze” que Rachel de Queiroz não é muito expansiva e arrebatada nas relações amorosas das suas personagens, mas reparo uma vez mais que as protagonistas são muito decididas e senhoras do seu nariz, contrariando as convenções e a maledicência da época. Aqui, as mulheres são tão ou mais militantes que os homens, trabalham, cuidam dos filhos e decidem com quem ficam.
Dona Noemi devia deixar essas idéias perigosas. Uma mãe de família tem que cuidar do lar. Idéias são para os políticos. Ele, seu Benevides, não tinha idéias e passava muito bem. Pensava só em gozar a vida, em ver lindas mocinhas.
a traição é muito mais amarga quando nunca houve inocência. não a da protagonista Noemi, mas a da própria Rachel de Queiroz. realmente impressiona a capacidade de síntese da autora, que costura elementos contextuais no texto de modo tão discreto que a gente até se pergunta se foi proposital. mas foi, é claro.
primeiro, tem o aspecto político. os debates correntes no movimento comunista, os entraves históricos que impediam seus avanços, as tentativas e vacilações são capturadas de maneira tão confiante que é até educativa. a rixa entre quadros proletários e pequeno-burgueses não era superada e era até reproduzida na divisão de tarefas e nos círculos sociais, não sem autocrítica. havia preocupação com a questão de gênero, mas nada parecia forçar mais o avanço do que as contradições surgidas no adultério da Noemi. hipocrisias como as do corno marido dela são identificadas e criticadas posteriormente, as de seu amante sequer conseguem ser identificadas a tempo. a perseguição política do Getúlio não é alardeada pela narrativa, é apenas uma parte dela. os aspectos de raça da Noemi não são alardeados, tampouco sua coragem em trabalhar com eles. enfim, se tem uma coisa que fica claro é que a Rachel foi uma ótima observadora de seu tempo e conseguiu bem torná-lo parte da história.
também é bonito como a Noemi é a narradora, mesmo não sendo. são os seus problemas e questionamentos que pautam o progresso da narrativa. é ela que identifica as contradições da conjuntura e da teoria e é ela que decide não tornar o adultério uma traição (e não por querer ser revolucionária, apenas por ser lógica). é ela que nós lembra que deveria chorar a morte do filho, não nós a ela. é uma boa execução do "ponto de vista feminino" . é por isso que, para mim, o livro é muito mais sobre o caminho de pedras que ela faz para entender como viver no mundo do que sobre o romance em si (que, diga-se de passagem, é bem broxa).
acho que o livro só perde pelo aspecto estético mesmo, que é insuficiente para cativar o leitor. é mais o contexto que arrasta o interesse do que a beleza em si.
e essa riqueza contextual toda é o que mais dói: essa mulher sabia o que é quem estava jogando no fogo ao virar a casaca e apoiar a ditadura empresarial-militar. ela conhecia por dentro os dilemas, sacrifícios e objetivos não só dos comunistas como do próprio povo brasileiro. não é ignorância, é alguma razão egoísta e perversa. a Noemi não é uma traidora, mas a Rachel é
chega a ser angustiante ler uma rachel de queiroz ainda socialista, revolucionária e tão consciente dos males de uma ditadura. o livro é bom, tem um enredo cativante, ainda que um tanto corrido. mas a cada vez que eu lembrava que ela conspirou a favor da ditadura militar (sério), me dava uma vontade de chorar. o que aconteceu com essa mulher?
de início eu não tava dando muita fé pra esse livro não, achei que ia ser mais um clássico que eu ia terminar me arrastando, mas logo nas primeiras páginas eu comecei a ficar muito engajado na leitura e entretido, esse livro eh tudo de bom
acho que pra mim o grande plotwist foi a morte do Guri, um monte de desgraça tava acontecendo na vida da Noemi por conta das escolhas dela, e do nada o próprio filho dela falece sem assistência prévia de ninguém, ele só morre, deixando todo mundo, inclusive EU, em choque .
"A morte é silenciosa e modesta. Os vivos é que a cobrem de gritos, de aglomeração, de ritos. O Guri morreu suavemente, sem falar, sem saber, decerto sem saudade de nada. Apenas abriu a boca, aspirou o ar numa angústia mais forte do que tudo e uma onda amarelada lhe foi subindo gradualmente pelo corpo, debaixo da pele, tomou-lhe as faces coradas pela febre, ganhou-lhe a boca, a testa, os dedos da mão. Mais nada."
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o livro eh cheio de críticas em volta da desigualdade de gênero (noemi perdendo tudo depois de abandonar o marido) e da política (o partido comunista dividido devido ao individualismo), mesmo sendo do século passado eh bem atual...
Memorial de Maria Moura é considerada a obra prima da autora mas considero esse livro um pouco melhor. Talvez por ser bem menos extenso houve maior objetividade ao narrar a vida pedregosa de Noemi e de um grupo de trabalhadores em busca de uma realidade mais amena, de uma sociedade mais justa.
Escrita clara e bela. Foi possível mergulhar no livro de cabeça e visualizar perfeitamente os cenários, situações, reações, personagens e a triste realidade de constante opressão. Desistências e afastamentos marcados por desesperança e cautela me levam à reflexão: vale a pena lutar por algo que ganha cada vez menos força? Durante a história inúmeros personagens perderam muito do pouco que tinham. Prisões, agressões, fome... Tudo isso por uma esperança ilusória por algo que nunca chega. A ignorância certamente justificada, porém extremamente irritante, dos tamancos os afastavam das poucas oportunidades de ascensão intelectual dos mesmos. Que por muitas vezes eram colocadas como um traço burguês, que os distanciavam das raízes de consciência operária e os aproximavam da classe alta. Classe essa que nunca chegaram a pertencer. Essa desconfiança cega afastava caráteres positivistas que considero muito importantes. A ordem e o progresso seriam essenciais para a movimentação clara e direta da organização. João Jaques prezava por sua individualidade, e o considero razoável. A parcela intelectual estava constantemente cega por situações ideais esperançosas, e colocavam em risco as próprias realidades, estabilidades e os operários, sem qualquer tipo de organização e fundos concretos. O mundo e o sistema são injustos, mas desgraças poderiam ter sido evitadas se as movimentações de esquerda, que infelizmente sempre oprimidas, fossem executadas com assertividade. Não só isso, como os camaradas são por essência completamente egoístas. Fala-se muito sobre o próximo, porém se vê um egoísmo cru e constante ao decorrer da história. Noemi perde o guri, o marido, o trabalho, as amizades, a honra; por puro tédio e egoísmo. Porém não posso ignorar o fato de que parte dessas perdas foram alavancadas em escalas muito maiores devido ao fato da personagem ser mulher. Roberto despreza as complicações de toda a situação pelo puro prazer de ter suas vontades realizadas. Em geral, esse fervor separatista presente nas organizações da esquerda, até mesmo hodiernamente, faz com que as ações voltadas para o que realmente importa sejam postergadas.
Um livro que concede um passo a passo sobre o que não fazer ao lutar por um ideal importante. A esquerda precisa se mover, espero que do jeito certo (hah! olha só eu falando sobre esperanças)
Publicado em 1937, é uma obra marcante da literatura brasileira que entrelaça experiências pessoais e contextos sociais em sua narrativa. Ambientada em Fortaleza, a história acompanha Roberto, um jornalista que retorna à cidade após uma década, inserindo-se em um ambiente de efervescência política e social, caracterizado pela luta por direitos trabalhistas e pela repressão do governo de Getúlio Vargas. O enredo se desenvolve em meio a encontros e tensões entre diferentes classes sociais, especialmente entre intelectuais e operários. Roberto observa e interage com personagens como Noemi, uma jovem casada que busca se libertar das amarras sociais e que acaba se apaixonando por ele. A relação entre Noemi e seu marido, João Jaques, é marcada por conflitos, especialmente à medida que ela se envolve em atividades políticas. A narrativa não apenas explora os dilemas amorosos, mas também a luta pela autonomia em um contexto de opressão. Noemi, em sua busca por liberdade, confronta as expectativas sociais e as limitações impostas pelo seu papel como mulher. O romance se torna um campo de batalha entre os desejos pessoais de Noemi e suas responsabilidades familiares. À medida que a história avança, diversos eventos trágicos ocorrem, incluindo a prisão de Roberto e a morte do filho de Noemi, que a deixam devastada e profundam seu luto. A narrativa ilustra a dureza da vida e a resistência das classes trabalhadoras, além de evidenciar a indiferença social frente às dificuldades que os personagens enfrentam. A obra apresenta uma cr��tica ao trabalho desumanizado e à condição do trabalhador, utilizando uma prosa acessível, clara e direta, que remete ao modernismo da década de 30. Raquel de Queiroz se destaca ao documentar as lutas sociais e suas intersecções com as experiências individuais, propondo reflexões sobre masculinidade, feminismo e as tensões de classe. No fim, a trajetória de Noemi torna-se um símbolo de resistência e esperança, refletindo a necessidade de um futuro melhor e a busca pela dignidade mesmo diante de adversidades. "Caminho de Pedras" é, portanto, uma obra que ressoa não apenas como uma narrativa de amor, mas também como um importante testemunho das lutas sociais e das aspirações humanas por justiça e igualdade.
Caminho de Pedras, escrito por Rachel de Queiroz, é ambientado em Fortaleza durante a década de 1930, em que Getúlio Vargas estava no poder e a esquerda brasileira passava por uma intensa crise. A narrativa é construída em meio a reuniões secretas de um grupo de esquerdistas, conversas entre amigos e o íntimo da rotina de Noemi. Apesar de tratar-se de um romance, a história não possui tom romântico, muito pelo contrário, é marcada por dor, miséria, incertezas e luto. A autora conseguiu expor como as mulheres estão fadadas ao sofrimento, como se tivessem que pagar uma penitência somente por aprenderem a viver. O livro expõe duramente como o julgamento sobre as ações de uma mulher é infinitamente maior do que o julgamento sofrido pelos homens. Noemi, que no início da trama era esperançosa e empolgada, termina o livro com a solidão como sua melhor amiga. Assim, o livro é uma denúncia à sociedade brasileira, mesmo sendo escrito no contexto do Brasil getulista, é uma narrativa extremamente atual. Rachel de Queiroz expõe, inclusive, como as mulheres são vistas como um objeto até para a esquerda, que diz ser progressista, mas não consegue nem respeitar uma mulher. Além disso, um ponto fortíssimo na história é a discussão entre proletariado x burguês, podem-se os burgueses ocuparem posições de destaque na luta dos operários? A autora traz uma reflexão muito bem trabalhada ao redor desse questionamento. No entanto, sinto que o final foi um pouco corrido, acho que mais algumas páginas ajudariam a dar mais emoção ao final da Noemi. Vale muuuuuuito a pena a leitura.
Escrito na década de 30, durante as turbulências do governo Vargas, Rachel de Queiroz situa a narrativa entre o fervor da política e do amor.
Aos poucos, um grupo de trabalhadores vai se (re)organizando para protestar por direitos e melhores condições de vida e trabalho; a repressão vivida na época se faz presente na história quando diversos personagens são perseguidos, marcados e presos. Paralelamente aos riscos políticos, os personagens centrais do romance, Roberto e Noemi, trazem a tona outros desafios.
Roberto, o proletário visto como intelectual pelos operários e que, embora não tenha as mesmas dificuldades materiais que eles, luta por ideais próximos dos deles. Da mesma forma, Noemi se aproxima da causa mas agrega à trama uma particularidade inegável: o papel da mulher naquele período - tanto em termos de engajamento, de voz e de participação social quanto em termos de limitações e sanções impostas à elas por uma sociedade feita por e para homens.
Escrito num momento em que Rachel de Queiroz ainda se identificava com pautas de esquerda, este livro questiona as motivações e as condições materiais das lutas de classes passando também por discussões de gênero.
Noemi, a heroína, é uma especie de Anna Karenina, só que em um ambiente muito mais inóspito, a Fortaleza dos anos 1930, em meio à luta operária.
Como a russa, há na trama uma pressão crescente vinda do desencanto com o casamento, do julgamento social, e da dificuldade de ser mãe, esposa - e querer expressar suas opiniões e liberdade. A pobreza e a aridez predominam, entretanto. Não há nobres ou burgueses aqui.
O final trágico também une os dois enredos, só que aqui há a solidão, como uma espécie de “morte em vida”. Mas com uma esperança de dias melhores, a partir de uma gravidez que encerra o livro:
Um livro para que possamos lembrar como valia pouco a vida feminina, mesmo que elas fossem o sustentáculo das relações em muitos ambientes.
Uma frase emblemática:
“Como é então que a gente vai reconhecer uma mulher honesta?” (De Guiomar sobre Noemi. Uma mulher, solteira e invejosa da atenção despertada pela outra sobre os homens. Ao observá-la e não perceber nenhum sinal visível em sua atitude, após ser conhecida sua traição ao marido.)
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A minha perspectiva sobre esse livro mudou bastante conforme eu fui lendo ele. A história que se conta no começo é de um tom extremamente politizado, uma organização secreta tentando formar uma célula de esquerda em Fortaleza, o conflito inicial é entre os operários e intelectuais, mas toda essa narrativa é deixada em segundo plano pra dar destaque ao romance de Noemi e Roberto, que é, pra mim, quando o livro fica bem mais interessante.
A primeira parte introduz um monte de personagens, não desenvolve nenhum deles, e acaba sendo meio confusa pra ler, na minha experiência. A segunda é mais tradicional, um triângulo amoroso e suas consequências para Noemi. O final é bem intrigante.
Ler esse livro foi uma experiência de alívio em meio à pressão do vestibular porque ele foi muito tranquilo de ler, mas também bem objetivo no sentido de se tratar tanto de um dilema pessoal quanto um dilema social na vida dessa mulher. Eu gostei do jeito que o comunismo foi trazido à tona não como um movimento social ideológico perfeito mas sim como falha, assim como todos não é o ideal não é perfeito e não é as 1000 maravilhas. E no final o caminho da mulher continua sendo o maior e mais tortuoso possível cheio de obstáculos e mesmo assim a diva consegue (eu quero acreditar que consegue pelo menos)
"Na obrigação a gente anda devagar, a fim de provar que é livre. Pressa é cativeiro, é medo."
No mínimo estranho experimentar uma personagem como Noemi escrita pela Rachel de Queiroz sabendo quem ela se tornou décadas depois... Ainda assim, quando escreveu, era alguém que entendia e vivia aquele mundo, por isso não deve perder o mérito por essa história comovente e realista, principalmente pra época.
"Naquele momento, nada era moral nem imoral, nada proibido nem permitido; não havia hora, não havia espaço: só a embriaguez do momento de revelação, das possibilidades de libertação."
Um livro, como todo bom romance modernista, dotado de bela prosa e fluxo de consciência. Mostra-se o desenvolvimento e a revolta de Noemi, militante comunista, perante as expectativas sociais do que viria a ser o Estado Novo (passando-se na década de 30, em Fortaleza). Diante disso, o nome do livro é justificado, dado o percurso pedregoso por que hão de caminhar os protagonistas — Noemi e seu amante, Roberto.
Caminho de Pedras é uma análise sobre como é a vida de uma mulher que compartilha ideias socialistas na década de 1930 no Brasil. O livro se relaciona com a história de vida da autora, Rachel de Queiroz, que foi uma "camarada" e mostra as lutas pelas quais defendia e os sacríficos que eram necessários para sustentar essa luta e fazer com que o ideal se propagasse cada vez mais. É um bom livro, embora esteja distante de ser um dos melhores que já li.
nao tinha dado nada pro livro e nao consegui parar de chorar nas ultimas 10 páginas
atenção especial pro trecho
“Ninguém a compreende, ninguém a acolhe. Durante um momento só, é natural, comove, consola-se. Depois, curto tempo depois, é incômoda, escandaliza, envergonha. Noemi sentia isso. E sentia ao mesmo tempo vontade de gritar, de rolar no chão, de se destruir a si e às coisas.”
gostei muito do jeito que ela mostrou o adultério feminino e as consequências, contrastando MUITO com o jeito que escritores homens retratam a mesma situação e da participação politica da Noemi na militância
a história também é super interessante, o finalzinho me deixou tristonho
É impressionante que a história é construída de uma maneira na qual no início você pensa que é sobre Roberto, sobre a organização anticapitalista em uma Fortaleza do Estado Novo, mas é pego desprevenido por uma história inerentemente sobre a experiência feminina no século XX: de trabalhadora, mãe e esposa, Noemi é reduzida à adúltera, desempregada, e uma mãe sem filhos.
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Nesse romance a Rachel expõe todas as faces dos indivíduos, mostrando que ninguém é perfeito, são personagens profundos. Além disso, também retrata a situação degradante da classe trabalhadora e como a luta sindical era reprimida
Achei bem interessante o final, a ideia de que no meio do caos da vida há um sentimento de paz em fazer suas próprias escolhas e em se manter fiel aos seus próprios sentimentos. Fora isso, achei um livro beeem normalzinho sem nada de mais, mas muito bem escrito.
Não tenho muito o que falar da obra, achei-a simples porém cativante, mostra a realidade da época com simplicidade e realismo, sem necessidade da comum utilização do pessimismo e das tragédias para tal.
Espero do fundo da minha alma que pelo menos a Noemi tenha vivido feliz com o seu filho depois que ele nasceu no final pq essa mulher só se fodeu o livro todo
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