"Procura-se professor de língua javanesa!" Uma chamada que muitos deixariam passar, Castelo enxergou uma oportunidade única. "Ora, disse cá comigo, está ali uma colocação que não terá muitos concorrentes". No conto "O homem que sabia javanês", do grande autor Lima Barreto, Castelo conta ao seu amigo Castro quando a falta de dinheiro e o desemprego o fizeram fingir ser um professor de uma língua que nunca tinha ouvido falar. Será que deu certo? "Não imaginas as grandes dificuldades com que lutei, para arranjar os quatrocentos réis da viagem! É mais fácil – podes ficar certo – aprender o javanês..."
Afonso Henriques de Lima Barreto nasceu em 1881 na cidade do Rio de Janeiro. Enfrentou o preconceito por ser mestiço durante a vida. Ficou órfão aos sete anos de idade de mãe e, algum tempo depois, seu pai foi trabalhar como almoxarife em um asilo de loucos chamado Colônia de Alienados da Ilha do Governador.
Concluiu o curso secundário na Escola Politécnica, contudo, teve que abandonar a faculdade de Engenharia, pois seu pai havia sido internado, vítima de loucura, e o autor foi obrigado a arcar com as despesas de casa.
Como leu bastante após a conclusão do segundo grau, sua produção textual era de excelente qualidade, foi então que iniciou sua atividade como jornalista, sendo colaborador da imprensa. Contribuiu para as principais revistas de sua época: Brás Cubas, Fon-Fon, Careta, etc. No entanto, o que o sustentava era o emprego como escrevente na Secretaria de Guerra, onde aposentaria em 1918.
Não foi reconhecido na literatura de sua época, apenas após sua morte. Viveu uma vida boêmia, solitária e entregue à bebida. Quando tornou-se alcoólatra, foi internado duas vezes na Colônia de Alienados na Praia Vermelha, em razão das alucinações que sofria durante seus estados de embriaguez.
Lima Barreto fez de suas experiências pessoais canais de temáticas para seus livros. Em seus livros denunciou a desigualdade social, como em Clara dos Anjos; o racismo sofrido pelos negros e mestiços e também as decisões políticas quanto à Primeira República. Além disso, revelou seus sentimentos quanto ao que sofreu durante suas internações no Hospício Nacional em seu livro O cemitério dos vivos.
Sua principal obra foi Triste fim de Policarpo Quaresma, no qual relata a vida de um funcionário público, nacionalista fanático, representado pela figura de Policarpo Quaresma. Dentre os desejos absurdos desta personagem está o de resolver os problemas do país e o de oficializar o tupi como língua brasileira.
Um conto bem divertido onde o autor satiriza a falsa sabedoria, a artificialidade de alguns intelectuais, o poder dos títulos e dos cargos, a necessidade de fingir conhecimentos, a troca de favores, as aparências e tantas outras atitudes hipócritas da sociedade da época.
O protagonista é um malandro, oportunista, esperto, mentiroso, mas como se costuma dizer "para haver malandro é preciso haver otário".
Sempre tive curiosidade para ler este livro, e depois que eu soube da história de Lima Barreto (negro, passou boa parte da vida internado em manicômios, alcoólatra, etc.) mais ainda. O texto é uma crítica mordaz a aspectos da sociedade, como cultuar a sapiência, às vezes suposta. É curto, mas muito profundo. Aparentemente, Lima Barreto não era louco. Talvez incompreendido!
2025: os alunos do terceiro ano não deitaram pra esse aqui também quando eu era criança, esse era um dos meus contos favoritos - consequência direta de ter muitos livros didáticos de português em casa. devo ter lido de novo quando fiquei adolescente, não sei. lendo hoje, é fácil pensar que o lima barreto previu com poderes sobrenaturais a era dos coachs quânticos. a verdade é que tudo nessa história - o tom que é literalmente o de uma conversa de bar, a classe dominante ignorante e deslumbrada, o cara que vê uma janela de oportunidade e vai mesmo sem saber nada - é mais velho que andar pra frente e estupidamente brasileiro.
Acho que os clássicos não são pra mim, a sensação que tive com esse livro foi de que vi coisas que não era pra ver e não vi o que era pra ver. Lendo o livro eu só pensava no privilégio que um homem tem quando fala algo e ninguém dúvida porque é assim que sempre foi, por conta disso não achei nada engraçado.
Um conto atemporal. Diz muito sobre a cultura brasileira, de julgar os especialistas como os melhores indivíduos da sociedade, e sobre como é fácil se passar por um. Curto e brilhante.
Li com minha filha como tarefa escolar. O conto é curto e de fácil leitura. Apesar de antigo e com muitas palavras indecifráveis, a leitura flui bem.
É a história de um picareta que, ä procura de ganhar dinheiro, descola um emprego como professor de javanês....sem saber uma palavra de javanês. Eu me diverti e a minha filha de onze anos também, o que já mostra que é um ótimo texto.
É o primeiro contato que tenho com a obra de Lima Barreto! Como estou impressionado! Suas crônicas tem uma ironia à frente de seu tempo, suas observações detalhadas nos leva ao inicio do século XX.
Segundo o Google Translate, 'gato' em javanês é 'kucing'. Em 1911, ano em que o conto foi publicado, deveria ser um trabalho considerável encontrar um dicionário ou especialista em javanês no Brasil, e é a partir desta premissa que o autor constrói a história de um homem que ascende socialmente sabendo muito pouco daquilo que afirma ser especialista. É o famoso "em terra de cego, quem tem um olho é rei".
Considero a situação atual ainda pior do que a do conto. Se alguém aparecesse em rede nacional afirmando que gato em javanês é 'tarume', seria muito fácil desmascará-lo, bastando uma pesquisa rápida: "Olha aqui, 'gato' não é 'tarume', é 'kucing', só checar nestes dicionários, coisa rápida". E ainda assim, não duvido que haveria pessoas que diriam "Eu acho que 'gato' em javanês é 'tarume', é minha opinião, fulano que disse, não é só porque você pensa diferente que você está certo". Só olhar para a quantidade de pessoas que confundem, propositadamente ou não, ciência com achismo, fato com opinião.
No conto, um homem ascende socialmente fingindo saber o que não sabe. Hoje, há pessoas que não só ascenderam socialmente da mesma forma, mas que encontram, em seus apoiadores, ecos para as suas opiniões não embasadas: "'Gato' em javanês é 'tarume'! 'Gato' em javanês é 'tarume'!"
Uma obra que parece uma doce ironia servida em uma xícara de chá literário, onde Lima Barreto, esse mestre das entrelinhas, nos presenteia com uma narrativa tão vívida que nos faz questionar se estamos realmente diante de uma história ou de um espelho distorcido da sociedade.
Castelo é o anti-herói que encarna a essência da malandragem brasileira, navegando pelas águas turvas da burocracia e do oportunismo, ludibria os incautos e ascende na vida com base em uma mentira bem contada. É como se Barreto nos dissesse: "Veja só, meus caros, como a sociedade valoriza mais a fachada do que a substância, o verniz do que a verdade".
Mas não, não nos deixemos enganar como os ingênuos admiradores de Castelo. Por trás da fachada de prestígio e competência, está o vazio, o vazio de um conhecimento superficial e a falta de ética que permeiam as estruturas de poder. E é assim que Lima Barreto nos presenteia com um conto que é mais do que uma simples história; é um espelho caleidoscópico que reflete as distorções e contradições de uma sociedade obcecada pela imagem e pelo status.
Manifeste, finja e minta até que se torne verdade.
A crítica aos falsos sábios não deveria ser direcionada apenas ao Brasil ou aos seus supostos profissionais. Existe uma visão excessivamente otimista de que o Brasil é o epicentro de mentirosos, ladrões e corruptos. Caros, há mentirosos em todo lugar, em todas as línguas e em todas as áreas. O homem que supostamente dominava o javanês mora ao seu lado, mora na internet, nos livros, nas revistas, na TV, tanto em ditaduras quanto em democracias.
É claro que há um recorte óbvio traçado por Lima Barreto, mas acredito que isso se deve simplesmente ao autor ser brasileiro e poder falar de sua própria realidade. No entanto, confesso que me aborreço ao ler que "a justiça BRASILEIRA é falha", "os políticos BRASILEIROS são mentirosos" ou "os profissionais BRASILEIROS são incompetentes". O retrato pintado pelo autor é uma paisagem mundial. Estou aliviada com isso? De forma alguma. De qualquer modo, a obra é divertida, rápida e clara. Vale a leitura.
Quanto me deparo com contos como O homem que sabia javanês, sinto uma alegria tão grande de poder, depois de adulto, ter contato com nosso grandes autores nacionais e, que infelizmente, não são tão cultuado como deveria. Lima Barreto é um deles.
O conto em si, além de muito bem escrito, carrega as marcar do nosso povo, acostumado a se virar como pode para poder sobreviver. Infelizmente, não são todos que tem a sorte do senhor Castelo. Lima, além de tirar sarro da nossa pseudo-elite, também debocha da forma que as pessoas valorizam mais outras culturas que a sua própria, pelo simples fato de ser estrangeiro.
Recomento muito a leitura para aqueles que querem conhecer Lima Barreto.
Castelo, a personagem-narrador do conto, apresenta-se um barão de Jacuecanga como professor de javanês - idioma que nem sequer conhecia.
Da ingenuidade de todos - que nada sabiam dessa língua, Castelo construiu sua fama a partir da ignorância. Tornou-se autoridade no javanês sem nunca saber o idioma. Nomeado cônsul e representou o Brasil na Europa.
Uma parte da obra que me chamou atenção foi quando o presidente colocou-o na seção de tupi-guarani (língua indígena) por ser a personagem brasileira (“julgara que, por ser eu americano brasileiro, me estava naturalmente indicada a seção do tupi-guarani”). Um sintoma da visão europeia sobre o brasileiro.
Ademais, a história remonta o prestígio pelo título, típico da república dos bacharéis.
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Publicado em 28 de abril de 1911 na Gazeta da Tarde no Rio de Janeiro O homem que sabia javanês é do gênero narrativo, um conto satírico, uma critica nada sutil aos intelectuais brasileiros fajutos, que viviam da bajulação e da imensa ignorância nacional, montados em bases instáveis, ocupando grandes espaços na elite da intelectualidade brasileira. Denunciando o homem que saia javanês, Lima Barreto deixava claro sua revolta pessoal a república da época. Intelectual, porém com possibilidades limitadas de ascensão social, por conta das origens e da ascendência escrava, foi menosprezado pela Academia Brasileira de Letras, e viveu o resto de sua vida assistindo muitos professores de javanês serem recebidos com admiração, até que o alcoolismo o levasse.
O homem que sabia javanês é um livro muito curtinho que retrata a vida de um homem que dizia saber javanês, mas que de fato não o sabia. Tudo começa quando ele estava precisando de dinheiro, e vê uma vaga para tradutor de javanês no jornal, ao se dirigir a biblioteca ele aprende um pouco sobre a Ilha de Java e seu alfabeto, e acaba conseguindo o emprego e depois vai parar do ministério do exterior. O livro satiriza como algumas pessoas acabam conseguindo cargos sem saber nada do que estão falando, e como muitas vezes as pessoas em volta são ainda mais superficiais em não saber avaliar o conhecimento alheio.
Uma sátira inteligente de como, às vezes, pessoas (homens, na verdade) podem assumir cargos de poder sem terem o conhecimento necessário para tal e a que ponto a lábia de alguém é o suficiente para enganar a todos e mantê-lo no pedestal de sua ardilosa mentira.
Assim como na maioria das leituras da faculdade, apesar de visivelmente bem pensando, não é um texto que eu leria por vontade própria, até porque esse formato parecido com uma entrevista (isto é, sermos introduzidos ao enredo do livro através das respostas do protagonista a um personagem secundário sem qualquer outra relevância além de fazer as perguntas mais convenientes para a narrativa) não me é muito apelativo.
Lima Barreto, eu te amo tanto!!!!! Em 1911 esse cara tava escrevendo coisas que muita gente só sonhava, queria e nunca fez. O que a gente escreve hoje, o que a gente acha que tá abalando em fazer hoje, ele já fazia em 1911. Muitas reflexões sobre essa história curta. Escrita de um jeito muito fácil de entender, acompanhar, refletir para além e rir também. E, óbvio, aquela vontade de gritar: LIMA BARRETOOOOOOOO VOCE ME PAGA S2.
Conto interessante, mas eu esperava uma história mais extensa, pois o assunto poderia ser mais trabalhado. Quando acabou fiquei com um sentimento de conteúdo interrompido, o final é um tanto quanto ríspido, de uma hora para outra o conto se encerra. Fora isso a história é bem construída e inteligente. S[o não dou 5 estrelas pelo motivo mencionado.
Como ninguém nunca pensou em adaptar esse conto clássico pra uma série de comédia??? Apesar de muito curto, foi capaz de me fazer visualizar o talvez mais CARA DE PAU de todos os personagens literários rs e é a personificação do "jeitinho brasileiro" elevado a um patamar nunca antes visto (com uma pitada de crítica social nas entrelinhas). Gostei.
– Tens levado uma vida bem engraçada, Castelo! – Só assim se pode viver... Isto de uma ocupação única: sair de casa a certas horas, voltar a outras, aborrece, não achas? Não sei como me tenho aguentado lá, no consulado! – Cansa-se; mas, não é disso que me admiro. O que me admira, é que tenhas corrido tantas aventuras aqui, neste Brasil imbecil e burocrático.
Esse é meu primeiro contato com Lima Barreto, um clássico, e fiquei chocada em como o autor escreveu de forma fluída, engraçada e ao mesmo tempo tao instigante, tendo em vista que é um conto super pequeno. Estou bastante empolgada com esse primeira contato, e ja quero ter mais experiencias como essas.
Conto leve e divertido do Lima Barreto (que eu nunca tinha lido antes!!), durante um voo pra SP. Curtinho e provavelmente retrata o brasileiro no seu AUGE. Não tem nada mais jeitinho brasileiro do que Castelo, o protagonista, fingindo saber falar uma língua de uma ilha que fica pros lados do Timor Leste e virando um rico e influente diplomata em cima de sua mentira. Caneta afiadíssima!
A crítica colocada em "O homem que sabia Javanês" tem relação direta com a própria vida e descendência de Lima, além do Status quo ao qual a sociedade(não que hoje seja diferente) e ele se encontrava.
Se ler procure saber sobre Lima e sobre a época em questão!
Muito bom!
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achei bem meh na real. faz acho q 4 anos desde q eu li esse conto pela primeira vez e resolvi pegar ele de novo pq eh curtinho MAS não gostei muito não. não é ruim mas também não é bom, bem esquecível sendo bem sincera
Lima Barreto era mesmo um escritor bastante inventivo, capaz de criar histórias com uma excelente nota crítica, ao mesmo tempo que podem ser singelos ou divertidos.
Lima Barreto e sua genialidade em tratar sobre ética e moral e do quão frágil é a linha que determina o certo e errado dependendo a conveniência da situação. Simples, ácido, preciso e fascinante esse é um autor que merecia muito mais reconhecimento, tanto em sua época como hoje.
Uma sátira social tão bem colocada que se passa despercebida aos leitores mais desatentemos, uma critica sobre o parecer conta mais do que o saber, prática que se permeia até os dias atuais... retrato da malandragem brasileira, uma mentira bem contada se torna então uma verdade