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O Meu Irmão

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A relação entre dois irmãos, um deles com necessidades especiais, que têm de aprender a viver juntos.

Com a morte dos pais, é preciso decidir com quem fica Miguel, o filho de 40 anos que nasceu com síndrome de Down. É então que o irmão – um professor universitário divorciado e misantropo – surpreende (e até certo ponto alivia) a família, chamando a si a grande responsabilidade. Tem apenas mais um ano do que Miguel, e a recordação do afecto e da cumplicidade que ambos partilharam na infância leva-o a acreditar que a nova situação acabará por resgatá-lo da aridez em que se transformou a sua vida e redimi-lo da culpa por tantos anos de afastamento. Porém, a chegada de Miguel traz problemas inesperados – e o maior de todos chama-se Luciana.
Numa casa de família, situada numa aldeia isolada do interior de Portugal, o leitor assistirá à rememoração da vida em comum destes dois irmãos, incluindo o estranho episódio que ameaçou de forma dramática o seu relacionamento.

O Meu Irmão, vencedor do Prémio LeYa 2014 por unanimidade, é um romance notável e de grande maturidade literária que, tratando o tema sensível da deficiência, nunca cede ao sentimentalismo, oferecendo-nos um retrato social objectivo e muitas vezes até impiedoso.

279 pages, Kindle Edition

First published November 1, 2014

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About the author

Afonso Reis Cabral

13 books428 followers
Afonso Reis Cabral nasceu em 1990. Aos 15 anos, publicou o livro de poesia Condensação. É licenciado em Estudos Portugueses e Lusófonos pela NOVA FCSH, fez mestrado na mesma área e tem uma pós-graduação em Escrita de Ficção. Foi duas vezes à Alemanha de camião TIR em busca de uma história, a primeira das quais aos 13 anos. Trabalhou numa vacaria, num escritório de turismo e num alfarrabista. Em 2014, ganhou o Prémio LeYa com o romance O Meu Irmão. Em 2017, foi-lhe atribuído o Prémio Europa David Mourão-Ferreira na categoria de Promessa, em 2018 o Prémio Novos na categoria de Literatura e em 2019 o Prémio GQ MOTY na categoria de Literatura. No final de 2018, publicou o seu segundo romance, Pão de Açúcar, com forte acolhimento por parte da crítica e vencedor, em 2019, do Prémio Literário José Saramago. Entre Abril e Maio de 2019, percorreu Portugal a pé ao longo dos 738,5 quilómetros da Estrada Nacional 2, de que resultou o livro Leva-me Contigo – Portugal a pé pela Estrada Nacional 2 e o documentário com o mesmo nome exibido pela RTP2. As suas obras encontram-se traduzidas em várias línguas. Tem contribuído com dezenas de textos para as mais variadas publicações. Foi colunista da Mensagem de Lisboa com «O Rossio na Betesga». Participou, com Dulce Maria Cardoso e Richard Zimler, no programa semanal «Biblioteca Pública», da Antena 1. É colunista do Jornal de Notícias, semanalmente com a rubrica «Ansiedade Crónica» e é um dos anfitriões do programa «Cinco à Quinta», da Antena 1. É presidente da Fundação Eça de Queiroz desde 2022. Em 2024, recebeu o Prémio Alumni NOVA FSCH. Em Setembro de 2025, chegou às livrarias O Último Avô, o seu romance mais recente.

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Displaying 1 - 30 of 177 reviews
Profile Image for Carolina.
166 reviews40 followers
November 16, 2015
Sim! Eu confesso! Li este livro num acesso súbito de dor de cotovelo. E é tão humano procurarmos defeitos naqueles que invejamos. Quando o resultado do Prémio Leya foi anunciado, os jornais anunciavam: Descendente de Eça ganha Prémio Leya. Que estupidez. A relevância desse facto é nula, a menos que o Afonso Reis Cabral tenha técnicas de necromancia. Porém, foi o que bastou para que a internet se enchesse de comentários maldosos. Eu própria ergui uma sobrancelha, visto que não havia dúvidas de que a Leya iria facturar com esta atribuição de prémio tão invulgar. Até anteciparam o lançamento, já com a retina transfigurada em forma de cifrão. Mas isso não muda a realidade: o livro ainda não saíra. Ninguém o lera. Excepto o júri. E então quis ler com os meus próprios olhos, queria saber de que era capaz este moço pouco mais velho que eu que já trabalhava em edição (para quem não sabe, eu própria estou presentemente num mestrado em Estudos Editoriais) e que conseguira escrever um livro merecedor de prémio.

No momento em que escrevo esta review, este livro tem apenas mais três. Duas delas estão escritas de uma forma que não compreendo. Uma insulta o livro sem explicar porquê. A outra desvaloriza-o pela idade do autor, também não oferece mais explicações. Francamente, eu fiquei estupidamente impressionada com este livro. É das melhores coisas que li este ano. Se não soubesse nada acerca do autor ou do prémio Leya, teria talvez assumido que o autor fosse mais velho e certamente um tipo muito, muito inteligente.

O livro funciona mais ou menos em duas narrativas, uma no tempo presente que se passa no Tojal, uma aldeia perto de Arouca, e outra que vai da infância do narrador e do seu irmão com síndrome de Down até ao momento presente. O autor recorre a uma estratégia engraçada em que às vezes os pensamentos do narrador aparecem em letra miudinha destacada, geralmente acrescentando uma camada negra à história. Sinto-me também obrigada a fazer referência à primeira frase, brilhante na sua subtileza pós-moderna a dar-lhe com jeitos de autor assentando a tinta na página: “Isto vai passar-se no Tojal. Ora o Tojal é perto de Arouca e longe de tudo o resto.” Por fim, o estilo de escrita é extremamente fluido, e as imagens oferecidas são precisamente aquelas que fazem um leitor parar e pensar que “nunca tinha pensado naquilo", mas que "sim", que era "mesmo assim”.

Mas agora vamos ao que mais interessa, que são os aspectos culturais da obra. Claro que, como o júri do Prémio Leya anunciou, é um livro que foge ao sentimentalismo que o tratamento da deficiência ou a doença no geral podem suscitar. Mas não é isso que para mim faz de O Meu Irmão um livro tão bom – no fim de contas, qualquer livro que trate estas temáticas com sentimentalismo é, a meu ver, um mau livro, porque falha naquele que devia ser o seu objectivo fundamental: a humanização do deficiente. Sentimentalismos toldam a realidade com um véu quase sacrossanto, convertem o sujeito com direito a complexidade humana e agência num objecto de culto. E este livro recusa esse sentimentalismo, mas é a clareza com que o faz que o distingue de outros livros com potencial.

O Miguel, o irmão, não é de todo perfeito, não precisa de ser, mas é agente do desejo e é agente de si mesmo, apesar de estar permanentemente à guarda de outros. O narrador tem dificuldades com a doença do irmão porque não compreende esta agência e sente que é uma ofensa à sua pessoa. No fim de contas, pretende ficar com o irmão como espécie de sacrifício pessoal (o que implica a instrumentalização do irmão como o tal objecto de culto que referia acima). Afastou-se dele em primeiro lugar por ressentir o seu “lugar garantido no céu”, também um lugar-comum relacionado com os doentes crónicos e que apesar de aparentemente inofensivo, é na verdade prejudicial, pois legitima a desumanização destas, mais que tudo, pessoas. Deste modo, O Meu Irmão fala-nos sobretudo sobre a comunicação entre dois irmãos. Miguel e o irmão estão impossibilitados de dialogar (tal como o narrador tanto desejava quando eram pequenos) porque ele assume que Miguel não tem direito a voz. No fim do livro, porém,

Haveria muitas outras coisas a discutir nesta review, mas espero que tudo isto baste para provar que Afonso Reis Cabral me parece valer bem mais do que a sua árvore genealógica ou a sua idade.
Profile Image for Martina .
202 reviews
September 16, 2018
QUE. LIVRO.

» Opinião no blog aqui.

Quando gosto muito de um livro, apetece-me dizer muita coisa. Quando gosto muito de um livro, é raro conseguir explicar ou exprimir o porquê de ter gostado assim tanto das palavras que li naquelas páginas. Ora, cria-se aqui um problema: tenho muito para dizer, mas não sei como. Porquê? Tenho medo de não ter a capacidade para exprimir de modo claro e evidente a qualidade do determinado livro.
Mas vamos tentar tornar as coisas um pouco mais fáceis. Afonso Reis Cabral foi premiado, em 2014, com o Prémio Leya, prémio esse que, além de possibilitar a publicação da obra posta a concurso, oferece ao autor uma quantia de 100.000€ (cem mil euros). De relembrar que todos os anos são submetidas centenas de obras a este prémio que tanto valoriza a literatura lusófona.
Quando O Meu Irmão, em 2014, foi então declarado vencedor, por unanimidade, do Prémio Leya, as notícias depressa fizeram circular a informação que o trineto de Eça de Queiroz tinha vencido um dos mais importantes prémios literários do nosso país. Ou seja, acabaram por reduzir a vitória de Afonso e a qualidade da obra à sua árvore genealógica.
Talvez nessa altura não se soubesse bem o escondia Afonso Reis Cabral nas páginas do seu segundo livro (isto porque, aos 15 anos, o autor tinha já publicado um livro de poesia), mas, agora, é impensável reduzir uma das maiores obras primas que tive o prazer de ler aos laços familiares que acompanham o seu autor.
Esta história segue o percurso de dois irmãos, a nossa personagem principal, cujo nome nunca será revelado, e o Miguel, que tem síndrome de Down. Começamos a leitura quando, após a morte dos pais, os dois irmãos se dirigem para o Tojal, uma pequena aldeia, situada na "viúva que é o interior de Portugal" (pág. 265) e habitada apenas por um casal de idosos e o seu filho, que, ao contrário de todos os irmãos, não havia partido para outros países ou cidades para trabalhar.
O livro alterna entre o momento presente, no Tojal, e recordações do passado, tanto da personagem principal como do irmão Miguel. Incluindo relatos do amor que surgiu entre Miguel e Luciana, uma rapariga também deficiente e com uma história, no mínimo, arrepiante. E a vida do nosso protagonista, enquanto homem divorciado, professor universitário e adepto do verbete.
Quanto ao enredo, isto é o que se pode contar. O tema é delicado, sim. Mas é tratado de uma maneira crua e realista. Não existem floreados.

"Quando um adulto passava por nós, colocava a mão no ombro dele, como a incentivá-lo. Eu aconselhava-o a continuar a terapia porque talvez conseguisse por fim desatar a língua ou ordenar os grunhidos e, assim, conversar comigo. Percebê-lo não era o mesmo que conversarmos" (pág. 23)

Talvez porque o próprio autor tenha passado por isto mesmo. Como o próprio já referiu em entrevistas, o livro aborda uma realidade que conhece de perto, já que também um dos seus irmãos é deficiente. Mas é importante notar que O Meu Irmão é, na sua totalidade, um romance ficcionado e nunca um relato autobiográfico.
Mas, apesar de ser um tema delicado, somos rapidamente engolidos pelas páginas do livro. A maneira como as duas narrativas (a do presente e a do passado) se acabarão por cruzar deixará o leitor espantado. Ninguém, repito, ninguém!, espera o final que este livro tem.
O ambiente, apesar de muitas vezes parecer pesado, abre espaço a alguns momentos cómicos. Um deles em particular que irá contrastar com o restante livro. Passa-se algures pelas páginas 102 e 104 e, admito, fez-me rir à gargalhada. E é relativamente complicado um livro fazer-me rir dessa maneira.
Se, por lado, tive vontade de rir nesse momento, logo no começo do livro, tive um aperto no coração tão grande que, caso não estivesse em público, tinha deixado cair uma lágrima.

"Quem fica de fora está dividido entre o medo e o desejo de ser apanhado. Todos querem ir ao meio e ninguém quer dar parte de fraco. O meu irmão não prestava porque não tinha capacidade para apanhar ninguém. Fartos, lembraram-se de outro jogo. Rodear o do meio e chamar-lhe coisas." (pág. 26)

Quando termino um livro, depois de o classificar, gosto sempre de ler algumas das opiniões deixadas no Goodreads. Quando termino um livro de que gostei muito, vou imediatamente ler as críticas negativas do livro. Uma das maiores críticas apontadas à obra de Afonso Reis Cabral é a presença de alguns momentos parados. De facto, não podemos dizer que O Meu Irmão é um livro recheado de ação, mas, vamos pensar: estamos a falar do interior de Portugal. É um autêntico deserto, onde tudo o que se vê são casas abandonadas ou de pessoas que apenas ali regressam no verão. O Tojal é precisamente a simetria desta realidade. As casas desabitadas de quem trabalha fora e a calma típica do lugar onde "o homem ainda não existia". Ora, a falta de ação criticada por muitos só me fez sentir ainda mais abraçada ao livro, fez-me sentir ainda mais dentro da história.
E, para isso, também a escrita de Afonso Reis Cabral contribuiu. É tão simples, mas, ao mesmo tempo, tão complexa. Tão realista, tão crua, tão visual. Conquistou-me, definitivamente. Parei 3 vezes para ler este livro e nessas três vezes vi as 368 páginas que o compõem voarem. E só queria mais. Ler mais desta escrita excelente que o autor tem.

"Quando não há solução, enfrentamos a realidade, fazemo-nos homens. Adapamo-nos. Sobrevivemos. Vencemos, lutamos, ou pelo menos somos derrotados em grande no combate que é a vida. Com o Miguel não se passa isso, ele mantém-se no mesmo estado de espírito, à semelhança de um pássaro de asa partida que ainda salta para voar. Salta e magoa a asa." (pág. 80)

Este autor tinha 24 anos quando venceu o prémio. 24 anos. É inacreditável como é que uma pessoa tão jovem consegue alcançar tanto. Já li tudo o que está disponível do autor, ou seja, este romance e o conto Uma História de Pássaros, publicado pelo Expresso, nesta mesmo ano (2018). Mas quero mais. Mal saia um novo livro de Afonso Reis Cabral, eu compro-o.
Bem, esta opinião estendeu-se bastante. Está longa, o que é raro. Mas o livro marcou-me muito. Além disso, o facto de alguns momentos do livro remeterem para a cidade do Porto (a minha cidade!), como referências à Estação de S. Bento e à Avenida dos Aliados, só o tornou ainda mais próximo de mim.
Como disse no Goodreads, não tenho uma única crítica a apontar. Desde o enredo, às personagens, à escrita... Tudo me encheu as medidas.
Sabem aquele sentimento maravilhoso de começar um livro, sentir-se entre as personagens, ver as ações a decorrer perante os nossos olhos, devorar todas as páginas que a obra oferece e, quando terminamos, sentirmos um enorme vazio dentro de nós? Foi assim que este O Meu Irmão me fez sentir. Entrou diretamente para o leque de livros favoritos. Do ano e da vida.
É um livro fenomenal. E, apesar do António Lobo Antunes ter dito que "um jovem de 24 anos não é capaz de escrever uma obra-prima" ou "Ninguém faz um livro aos 24 anos. Nem o Tolstoi", pois a minha modesta pessoa, enquanto leitora, diz o contrário. Para mim, este O Meu Irmão é uma verdadeira obra-prima da literatura nacional.
Profile Image for Rita.
905 reviews185 followers
February 26, 2022
Caramba! Se este é o romance de estreia, e ainda para mais aos 24 anos, só posso aplaudir 👏🏻👏🏻👏🏻 e esperar que ARC vá longe e que nos presenteie com obras como esta.

Uma história emocionante, cruel, cheia de paixões, frustrações e tragédias.
Um livro cheio de sentimentalismo, uma leitura que não é fácil e que por vezes se torna desesperante.

Uma escrita simples, sem grandes exageros, cuidadosa e fluída.
Profile Image for Nelson Zagalo.
Author 15 books466 followers
January 16, 2016
Portentoso debute. “O Meu Irmão” é dono de uma escrita sublime e dotado de um enredo matematicamente alinhavado, em nome do contar de uma história capaz de nos arrancar um grito de alma. Peguei nas primeiras páginas na noite, já tarde e sem grande ideia de o começar a ler para já, contudo a beleza do que comecei a ler num fio encadeado de palavras fluídas logo me manteve ali preso.

Afonso Reis Cabral é jovem e por isso com muito ainda para dar às letras nacionais, apesar de primeira novela a maturidade apresentada dá conta de tanto e tanto trabalho realizado para chegar aqui, temos por detrás destas páginas alguém que leu centenas se não milhares de obras, temos alguém que escreveu centenas se não milhares de páginas, no que podemos ler ao longo destas 360 páginas fica demonstrado um domínio exímio da nossa língua, assim como uma noção muito concreta do que comporta uma novela.

Não foram poucos os que criticaram o escritor, não a obra porque nem sequer a tinham lido, só foi publicada depois de escolhida pelo júri do Prémio Leya 2014. Ganhar um prémio literário num valor de 100 mil euros é algo que levanta o sobrolho a qualquer um, ganhar com apenas 24 anos faz disparar o espanto, mas dizer que é trineto de Eça de Queirós faz surgir a desconfiança.

Contudo a capacidade de criar um texto destes não se define pela idade e menos ainda pela herança genética. Como nos dizem os vários estudos sobre o talento humano (Colvin, 2008; Coyle, 2009) esta capacidade só surge com muito, imenso, trabalho. Afonso Reis Cabral pode ter apenas 24 anos, mas se começou a escrever, como diz, aos 9 anos, tem 15 anos de labor em cima da arte. Do que nos é dado a ler é fácil ver as influências dos grandes clássicos da literatura, mas também se sente muito do seu mundo vivido, o que nos diz que o autor não só foi buscar muito aos outros que o precederam, como devia, mas também que é extremamente atento à realidade que o circunda.

Para Alain de Botton "a literatura é o maior simulador de realidade", capaz de nos fazer passar por experiências para as quais precisaríamos de várias vidas. O escritor Afonso Reis Cabral, e a sua idade, são a prova viva desse capacidade da literatura. Claro que não basta ler muito para se tornar num grande escritor, é preciso agir e trabalhar sobre aquilo que se lê e se consome, correndo o risco de nos deixarmos consumir. Ou seja, escrever, escrever todos os dias e sempre. Mas para poder evoluir falta ainda a motivação e a orientação, porque por muito solitária que seja a vida de quem escreve, o crescimento só é possível com o feedback de quem nos lê. Nesse sentido, ter tido bons professores no secundário e seguir uma licenciatura e mestrado na área das letras ajudou bastante.

Para quem entretanto o leu, dizer, ou criticar sob o preconceito dos 24 anos, que não se pode ainda escrever com profundidade (não vou nomear), é infantil porque se busca a infantilização do ser humano. Podemos sem dúvida questionar se esta será a sua maior obra, pois espero que não, é apenas o início de um caminho, que deve ser valorizado enquanto tal, não se analisa uma primeira obra como se analisa a obra de uma vida.

Falei acima do sentimento matemático que percorre o texto, que é no fundo um sentir profundamente académico que vibra ao longo de todo o livro e que de forma inteligente é atribuído pelo autor ao personagem principal, na sua profissão de investigador e professor universitário. O enredo entre cada uma das pequenas histórias cozidas num todo, segue um processo de harmonização em busca de uma perfeição, com cada lugar, personagem e evento a trabalharem para um sentido muito concreto e altamente coerente. Por outro lado, existe uma fuga, que me parece consciente, a essa racionalização ou perfeccionismo que acaba por emergir numa espécie de mancha naturalista. Ou seja, existem diálogos com expressões duras, a roçar o mau gosto, incomodativas, chegando a tornar-se perturbadoras se pensarmos que este autor pode sequer ter pensado o que está ali escrito, mas que não estão ali por acaso, antes objectivam o tal naturalismo, um dar a sentir o que se diz e pensa em determinados momentos das nossas vidas, mesmo que isso não represente a forma polida de o escrever. Aliás este naturalismo é também em certa medida fruto do traço estilístico escolhido para a narração que se faz a duas vozes, ainda que da mesma pessoa, como se o narrador fosse dotado de um homúnculo que vai corrigindo e aprofundando a ‘verdade’ do que se vai narrando. Ou seja, nota-se aqui uma certa vontade de imprimir honestidade ao que é dito, e para que essa funcione, limpar e polir os diálogos poderia facilmente desacreditar essa frontalidade.

Ao longo do livro fui sentindo uma certa influência de cinema francês (ex. Eric Rohmer ou Alain Resnais), na forma como as relações humanas são descritas e moldadas, a suavidade e delicadeza da sua exposição. Parece nunca haver pressa para dar conta de um personagem, das suas relações ou daquilo que o afecta, como se a vida corresse a seu tempo ignorando as nossas angústias e a velocidade a que nos fomos acostumando que tudo gire. Para isto contribui imenso o lugar no interior do país, o constante apego ao passado, e claro o ritmo alternativo da vida de alguém que sofre de síndrome de Down. Ao longo de todo o livro o síndrome é tratado como algo perfeitamente normal, encaixável nos ritmos dos dias de hoje, muito pelo suporte das associações que tomam conta da maior parte destes indivíduos durante o dia, aliviando imenso o peso sobre as famílias. Não que se mascare o problema, ele é bem evidenciado, por vezes de forma diria mesmo perfurante, assim como nunca se usa o ‘problema’ para desenhar o sentimentalismo ou a melancolia fácil.

Mais para o final o modo calmo e suave, ainda que sempre fluidamente ritmado, sofre uma ligeira alteração assumindo um tom mais policial que inicialmente me afastou, pois soou-me a necessidade de cumprir as regras do storytelling, mas pouco depois altera-se de novo quando tudo se resume e encaixa no fechamento do todo, fazendo antes com que este episódio assuma o brilho da genialidade do autor, comportando em si mesmo tudo aquilo que na verdade este pretendia expressar, tudo aquilo que provavelmente o terá levado a escrever este livro.

Deixo apenas três frases que dão conta da escrita de Afonso Reis Cabral, do modo como este consegue simplificar o discurso, metaforizando sentires com imagens do quotidiano, tornando o mundo descrito extremamente acessível, mas demonstrando toda a sua capacidade para elaborar textualmente universos. Mais transcreveria se tivesse o livro em digital:

“Torna-se complicado quando ao cuspir também se quer projectar o ódio acumulado nas paredes do estômago.”

“...o tempo deixa-se escorregar como uma faca bem afiada: quando damos por isso, o corte está feito”

“Estalou os dedos e gaguejou, tropeçou nos gestos e nas palavras enquanto tentava ordenar o relato”

...
Para ler com os links no texto, ler no blog: Virtual Illusion
Profile Image for Cristina | Books, less beer & a baby Gaspar.
452 reviews119 followers
November 10, 2018
Nem sei bem o que dizer, excepto que me arrebatou a alma. Li O meu irmão depois de ter conhecido o autor com o seu livro mais recente, Pão de Açúcar. Se não o soubesse diria que este O meu irmão era o segundo livro dele, pela evolução e maturidade na escrita e história. Se não o soubesse (porque o vi em pessoa na FLP quando comprei o Pão de Açúcar, diria que quem escreveu este livro era uma pessoa mais velha). Preconceitos, más interpretações?! Sim prova que idade ou nr livros publicados não conta para nada! A história é de uma maturidade enorme. O tema é forte e facilmente "lamechas", o que não foi o caso. Aborda de uma forma directa e crua o tema da trissomia 21, com todos os seus problemas e dificuldades para todos os envolvidos. Ao longo da história fui sentindo todas as emoções descritas pelo nosso narrador de uma forma tão real que me vai acompanhar por muito tempo, sinto comichão debaixo da pele! O tema é retratado de forma tão humana que assusta! Não consigo sequer colocar em primeiro palavras, de forma justa ou coerente, aquilo que sinto depois de acabar o livro. Desconheço o prémio Leya, mas este mereceu!!
Profile Image for Anabela Mestre.
94 reviews43 followers
April 18, 2019
Um bom livro, sobre a relação de dois irmãos, em que um deles é mongoloide. O que os une e o que os separa. A Luciana é a paixão do mais novo (o mongoloide ), adquirindo um carácter obsessivo. O narrador tenta recuperar o irmão da infância, após a morte dos pais, mas há sempre a Luciana a interferir, pelo que a luta é difícil.
O autor do livro apesar de muito novo, apresenta uma escrita madura e agradável, pelo que é um autor a ter em conta no panorama das letras português.
Profile Image for Márcia Balsas.
Author 5 books107 followers
December 27, 2014
Não havia nada que me preparasse para o choque e a raiva que senti no fim da leitura de “O Meu Irmão”. Cheguei ao fim sem ter lido nenhuma opinião publicada, nenhum comentário a este livro, apenas assisti a alguns encolher de ombros e expressões de estranheza e mistério de quem o tinha lido.
Não estava na completa ignorância, sabia que o livro escondia algo. E assim o li, sempre à espera de descobrir não sabia eu o quê, como seria, nem quando aconteceria. Uma coisa é certa, o encanto (bom ou mau) deste livro está em não se saber ao que se vai. Quando o chão nos sai dos pés esquecemos até o nosso nome. Por isso aconselho a quem ainda não leu e tenha intenção de o fazer que fique por aqui. Guarde a leitura desta opinião para mais tarde vir cá trocar umas bolas comigo. Assunto não nos vai faltar.
Excepcionalmente, acho que é a segunda vez que faço isto, vou transcrever a sinopse primeiro.
“Com a morte dos pais, é preciso decidir com quem fica Miguel, o filho de 40 anos que nasceu com síndrome de Down. É então que o irmão – um professor universitário divorciado e misantropo – surpreende (e até certo ponto alivia) a família, chamando a si a grande responsabilidade. Tem apenas mais um ano do que Miguel, e a recordação do afecto e da cumplicidade que ambos partilharam na infância leva-o a acreditar que a nova situação acabará por resgatá-lo da aridez em que se transformou a sua vida e redimi-lo da culpa por tantos anos de afastamento. Porém, a chegada de Miguel traz problemas inesperados – e o maior de todos chama-se Luciana.
Numa casa de família, situada numa aldeia isolada do interior de Portugal, o leitor assistirá à rememoração da vida em comum destes dois irmãos, incluindo o estranho episódio que ameaçou de forma dramática o seu relacionamento.
O Meu Irmão, vencedor do Prémio LeYa 2014 por unanimidade, é um romance notável e de grande maturidade literária que, tratando o tema sensível da deficiência, nunca cede ao sentimentalismo, oferecendo-nos um retrato social objectivo e muitas vezes até impiedoso.”
Perante esta descrição eu esperava um livro sobre o Síndrome de Down. Sobre as limitações e dificuldades do irmão com esta condição, assim como a vida familiar, as adaptações forçadas, o sofrimento, etc, etc.
A verdade é que fui enganada. E fui enganada praticamente o livro todo, que quando a nossa cabeça quer ver as coisas de determinada forma, é mesmo dessa forma que as vê. Então eu estive quase trezentas páginas do livro, que tem 365, convencida que “O Meu Irmão” é o Miguel, o deficiente, o mongolóide, como tantas vezes é tratado pelo narrador. Cruel. Senti sempre, mesmo desde início, uma crueldade nas palavras, uma frieza no tratamento, nas descrições dos momentos em família, como se tivesse a ver as cenas através de um vidro gelado e as personagens fossem vazias de sentimentos.
“O Meu irmão”, para mim, é o narrador, o outro irmão “professor universitário divorciado e misantropo”. Este vai na verdade demonstrando a sua natureza ao longo de todo o livro, e que será apanhado por aqueles leitores atentos e inteligentes que não se deixam levar por sinopses politicamente corretas, e que conservam o espírito crítico. Não foi o meu caso. Fui completamente enrolada, no fim do livro consegui ver mesmo a cara do Afonso Reis Cabral a rir-se de mim. Resta-me a consolação, vá, a felicidade, de ter sido enganada em grande nível, pois que a escrita é irrepreensível. Fiquei pasma com algumas passagens perfeitas, questionei-me constantemente onde terá ido o autor desenvolver a capacidade de articular tanta beleza, por vezes, com tão poucas palavras.
“Por causa das nuvens, não existe lua para meter luz por entre as folhas e fazer desta árvore uma pequena ave-maria iluminada pela fé.” (Pág. 113)
É um Dom.
Então este irmão malvado, que me convenceu sempre de estar a ajudar o Miguel, por cuidar dele depois da morte dos pais, por mudar de casa e de cidade para manter o Miguel no seu ambiente, a frequentar o centro que sempre frequentou, é um tipo que toda a vida se deixou levar e diminuir pela inveja e pelo ciúme, que foi cultivando sentimentos de ódio e raiva em relação ao irmão, pela atenção constante que tinha dos pais e das irmãs. E lá vem ele da sua vidinha vazia, misantropo que soa melhor, para se enfiar com o Miguel numa terriola no meio de nada, depois de se deixar levar pelo descontrolo, pelos instintos mais baixos, por um certo complexo de Deus, e numa espiral de loucura, cometer um acto atroz que defende, como todos os loucos, ser o certo.
O acto em questão não revelo, não vão alguns de vocês que ainda não leram o livro estarem por aí à espreita.
Zangada, talvez mesmo furiosa, tenho a dizer coloco este livro num patamar muito elevado por me fazer sentir tantas coisas, mexer com tantos sentimentos, horrorizar-me e não me deixar indiferente. Nunca reli um livro. Mas este deixa-me uma certa vontade de, daqui a uns tempos, lhe voltar, lhe pegar de outra perspectiva. A certa. Ou a que eu agora acho que é a certa.
Brilhante!
Leya, 2014
This entire review has been hidden because of spoilers.
Profile Image for Célia | Estante de Livros.
1,188 reviews275 followers
February 19, 2016
Leio pouca literatura escrita por portugueses. Olhando para 2014, até agora, os livros de autores portugueses foram apenas 8 em mais de 100, sendo que dois deles nem eram ficção. Não é uma decisão consciente, mas a verdade é que os livros de autores portugueses que vão sendo lançados não me despertam muito o interesse. Este O Meu Irmão foi uma exceção; por ter vencido o Prémio Leya deste ano, teve muito maior destaque e dei por mim a ler este artigo sobre o jovem autor no Público. Foi mais do que suficiente para ficar interessada no livro e decidir lê-lo.

O Meu Irmão é uma narrativa na primeira pessoa, de um homem (de quem nunca sabemos o nome) com cerca de 40 anos, crítico literário com aspirações a escritor, que tem a seu cargo um irmão pouco mais novo, com Síndrome de Down. No início do livro, os dois rumam a Tojal, uma terriola com 2 ou 3 casas, onde os pais de ambos (entretanto falecidos) tinham uma casa. Percebemos que os dois vão lá passar uns dias e que, de certo modo, estão a “fugir” de algo, mas só com o desenrolar da história tomamos realmente noção do que passa.

A história, essa, é composta de constantes saltos ao passado onde o narrador nos vai descrevendo momentos da sua relação complicada com o irmão, ao longo dos anos. Essas analepses são intercaladas com o momento presente, em que o narrador nos mostra como lida com as dificuldades instrínsecas à convivência com uma pessoa com Síndrome de Down. Para além disso, o texto (decorra no presente ou no passado) é constantemente “invadido” por pensamentos secundários que o narrador vai tendo em relação ao que está a contar, que funcionam quase como a voz da sua consciência.

A primeira coisa que ressalta neste livro, e que se torna uma constante, é a maturidade na escrita. Isso é ainda mais relevante se tivermos em conta os 24 anos de Afonso Reis Cabral. O autor valeu-se da sua experiência pessoal (também tem um irmão com Síndrome de Down) para falar de um tema que conhece, mas parece-me que terá querido afastar-se o mais possível do narrador que compõe. Na verdade, é difícil arranjar características agradáveis na pessoa que conta esta história, uma espécie de falhado que vê o irmão como “último reduto, como redenção.” Como afirma, “Assim que pudesse estar com ele, isto é, assim que os pais morressem, entraria no seu éden, redimirme-ia de uma vida chã ao dar-lhe paz, boas condições, e um amor semelhante ao dos pais.” É uma personagem negra, um pouco imoral até, que apesar de sentirmos amar o irmão, muitas vezes escolhe formas um pouco retorcidas de o demonstrar.

O livro ganha pontos por não tratar o Síndrome de Down com excessivo sentimentalismo ou lamechice, e apresenta-nos um retrato bastante real do que é viver-se com esta condição. O interior do país é também, quase por si só, uma personagem do livro, sobre o qual o autor faz um retrato árido, comparando-o a uma viúva.

Apesar dos pontos positivos que apontei acima, por vezes pareceu-me que faltava um pouco de chama ao livro. Alguns momentos mais parados, algumas divagações que me pareceram um pouco desnecessárias, no fundo pareceu-me um livro riquíssimo a nível de escrita, mas ainda com melhorias possíveis no que respeita ao enredo e à forma como poderia cativar ainda mais o leitor.

O balanço final é positivo. É um livro bastante bom para uma estreia literária; não brilhante, mas bastante bom. Tendo em conta os sinais, parece-me que Afonso Reis Cabral tem uma grande margem de progressão e, por isso, é um autor a manter debaixo de olho.
Profile Image for Livros de Vidro.
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June 7, 2019
Hoje trago a minha opinião sobre o primeiro livro de Afonso Reis Cabral.

Este livro foi-me recomendado pela Edite do blogue O Livro Pensamento, e acedi em lê-lo. Embora a Edite tenha dito que eu ia gostar, a verdade é que: nem por isso.

A história fala de dois irmãos, um "normal" e um outro que tem síndrome de down. Este irmão "normal" encarrega-se do outro quando os pais morrem. E a história gira à volta disso, de como é a relação deles, como era na infância e de como este irmão "cuidador" quer o outro só para si. Sim, é devido a um sentimento de posse que acabo por colocar "cuidador" entre aspas.

Este livro é um pouco parado de mais para mim. Não lhe achei grande piada, não foi nada por aí além. O personagem principal/ narrador é chato, vai demonstrando alguma obsessão pelo irmão, talvez devido a algum sentimento de culpa.

Gostei do personagem Miguel, o irmão com a síndrome de Down, embora não tenha propriamente uma voz activa, as suas atitudes geraram empatia.

Continuação e classificação: https://livrosdevidro.wixsite.com/liv...
Profile Image for Helena Isabel Bracieira.
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June 5, 2017
Opinião publicada em: As Horas... que me preenchem de prazer.

Os Prémios LeYa têm por hábito incitar-me a curiosidade e, assim que possível, entram na minha lista de leituras. O Meu Irmão não foi excepção e que brutalidade se revelou.

Na primeira pessoa, um narrador alterna o seu discurso entre o passado e o presente. Assim conhecemos a infância, a adolescência e a idade adulta de dois irmãos, um deles chamado Miguel e portador de síndrome de Down, num fio narrativo que se estende até à actualidade, em que os encontramos isolados no Tojal, na casa de campo herdada dos pais. Os únicos vizinhos serão uma família de pai e mãe idosos e um filho doente e perturbado.

Na sua infância e adolescência, o narrador parece ter uma rivalidade saudável com Miguel. Porém, momentos há em que o culpa pela atenção desviada dos pais e, apesar da sua forte ligação, há uma inveja pelo seu Éden, o paraíso perdido, e pelo seu papel de anjo ferido na Terra, incluindo o que isso implica: a devoção dos pais - e do mundo - que nada lhe exigem e tudo lhe perdoam.

Com a deslocação para Lisboa, para estudar e trabalhar, este narrador acaba por se afastar da família por cerca de vinte anos, não estabelecendo mais relações sólidas e duradouras, com ressalva de um casamento, por mera solidão e que redunda em rejeição.

O seu retorno, após a morte dos pais, leva-o a assumir-se como tutor de Miguel e obriga-o a estabelecer uma relação de exclusividade. Define o que para ele acha melhor, independentemente das suas mais ínfimas vontades.

Do possuidor desta mente perturbada nunca conheceremos o nome: a criação de empatia para com ele não se concebe, já que é, além de perturbado, frio e alienado. Ironicamente, o único ser por quem cria uma necessidade de afecto é o seu irmão Miguel, e que, pela sua condicionante, não lhe consegue corresponder na medida do desejado. Chega a acusar o irmão de um egocentrismo exacerbado, naquilo que não passa de um espelhar de si próprio.

A exploração deste tema, a deficiência, é crua e sem rodeios. Numa prosa irrepreensível, passagens relembrarei e não esquecerei tão cedo. E é de realçar que não é qualquer um que se encontra preparado para lidar com tal condição, como ultimamente se vem notando com algumas notícias de maus tratos.

Pela introspecção que me causou, bastante mais poderia dizer. Cinjo-me a afirmar que é uma obra de estreia invejável, uma reflexão sobre a condição do homem perante a deficiência, a velhice, a doença e o seu impacto em todos nós.

4,5/5*
Profile Image for Carla.
184 reviews25 followers
September 12, 2015
Eu quase me sinto culpada por não ter gostado deste livro, mas de facto não consegui ou não o soube apreciar.

A história aborda temas interessantes, atuais, com os quais as pessoas preferem não pensar ou confrontar-se, como as deficiências mentais e físicas de familiares muito próximos e como a solidão em que muitos se refugiam nas grandes cidades cheias de prédios cinzentos, de trânsito e de muitas pessoas, em contraste com o interior do país, com paisagens bonitas, bucólicas, mas desertas, pois quase todos já partiram e os que ficaram ou são idosos ou possuem qualquer tipo de incapacidade.

O livro também se encontra bem estruturado, porque começa a narrar os acontecimentos do seu final até ao seu início, intercalando capítulos em que o narrador e o seu irmão Miguel, portador do síndroma de Down, se encontram de férias na aldeia do Tojal, perto de Arouca, onde apenas vive mais uma família, e a descrição da sua infância, adolescência, do afastamento do narrador da sua família e do isolamento em que decidiu viver, até passar a residir com o seu irmão e a cuidar deste, após a decisão que tomou em consequência da morte dos seus pais.

No entanto, a história é descrita de forma monótona, deprimente e entediante, levando-me muitas vezes a desinteressar-me da mesma. Os diálogos entre as personagens, nomeadamente os mantidos entre o narrador e os seus vizinhos, na aldeia do Tojal, são desprovidos de sentido. Além disso, quando o narrador tenta contar algum episódio engraçado, como quando se dirige a outra aldeia (Ponte de Telhe) e encontra a dona de um café e outras personagens com as quais conversa momentaneamente, apesar de querer introduzir algum sentido de humor na narrativa, não o consegue.

Aliás, penso que a pessoa verdadeiramente doente no livro é o narrador, um professor universitário que pretende redimir-se de ter no passado abandonado os seus pais e irmão, devotando-se no presente ao seu irmão Miguel, mas que impede este de amar uma mulher também deficiente, e que acaba no final por cometer um crime, o qual, infelizmente, parece ficar sem punição. Embora o narrador refira sentir remorsos por ter praticado um ato criminoso, penso que nunca chega verdadeiramente a tê-los.

Os livros para terem qualidade não têm que ser tristes e, mais ainda, deprimentes.

A arte terá necessariamente que implicar sempre sofrimento?
Profile Image for Andreia Capelo.
88 reviews13 followers
March 22, 2020
Desisto. Depois de mais um mês a insistir e a forçar-me a ler, desisto oficialmente. Faltam apenas 80 páginas para o fim, mas não aguento mais.

Tentei gostar deste livro, a cada capítulo dizia: "Isto vai melhorar." Mas nunca senti esse momento chegar.

A escrita do Afonso é fantástica. Escreve lindamente. Mas sinto que ficou muito por explorar. Sinto que este livro explora apenas o quotidiano aborrecido de uma vida de "gente velha". Nada acontece. É, literalmente, um relato quotidiano desinteressante.

Sabes que um livro é mau quando o único que tiras dele é o ódio da personagem principal (ou será do autor) por pessoas com excesso de peso - os insultos são constantes.

Quis gostar deste livro por nos mostrar uma narrativa diferente do normal - um irmão com síndrome de down, com a escrita do Afonso, tinha tudo para ser um livro fantástico. Mas não. É só mais um livro no meio de muitos.

Penso que foi a primeira vez que me aborreci tanto com uma história. Estava muito entusiasmada por ler mais obras deste autor, como o Pão de Açúcar, mas penso que já levei a minha dose. Não fiquei com vontade de repetir.

Conclusão a tirar: deixar de ler um livro simplesmente por ter ganho um prémio. Pelos vistos, prémios não tornam um livro bom.
Profile Image for Ana.
746 reviews113 followers
May 29, 2016
Uma boa história, muito bem escrita, sobre um tema difícil, que não conheço de perto, mas me pareceu muito bem retratado, sem lamechices nem condescendências. Várias vezes dei comigo a pensar como é que alguém tão novo consegue escrever tão bem e com tanta maturidade. Se o primeiro livro já é assim, vou com certeza querer ler os próximos.
Profile Image for Maluquinha dos livros.
319 reviews134 followers
May 27, 2023
(Audiolivro 🎧)
Este livro estava na estante à espera. Acho que veio cá para casa assim que foi publicado. Calhou “lê-lo” noutro formato, o que não me impediu de apreciar a escrita do autor. Toda a história está muito bem construída.

Parece-me muito importante dar voz às famílias com filhos portadores de deficiência… com a falta de respostas que ainda há. Não é uma realidade minha, mas é uma realidade que conheço de perto. Senti como se fosse eu a mãe que envelhece e pensa “o que será do meu filho quando eu morrer?” Para mim, esta questão é a mais importante deste livro… que poderia ter sido mais explorada, dizem uns. Mas creio que é o suficiente para perceber como é viver com uma criança (mais tarde, já um homem) com síndrome de Down.
Fiquei com a ideia que o título não se refere a Miguel, o irmão com síndrome de Down. O irmão é afinal o outro, o imperfeito, o egocêntrico, o cínico…
E o final? Inesperado, mas não vejo outro fim possível.
😉
Gostei do livro… só embirrei com a descrição tão pormenorizada de uma zona que conheço bem… descrição que até estava a ser demasiado fiel e, de repente, cheia de erros.
Profile Image for bea.
13 reviews1 follower
September 13, 2022
Estaria a mentir se dissesse que me apaixonei imediatamente pelo narrador - apenas algumas vezes intitulado de "mano", mas, penso eu, Afonso - cujas palavras me transmitiam rigidez e frieza para com um ser deficiente. Sentia pena de Miguel e apatia por Afonso. Este romance trata, assim, o mal intrínseco à natureza humana e, por outro lado, a pureza e simplicidade de alguns, que não conseguem ser mais que isso, conseguindo encontrar o amor. Toda e qualquer pessoa que não conheça este autor, dificilmente diria que se trata do seu primeiro romance, dada a maturidade da escrita.
Profile Image for João Teixeira.
2,306 reviews43 followers
September 15, 2023
Tinha grande curiosidade sobre este livro, pois correram rios de tinta quando ele foi publicado. Penso que o facto de o autor ser sobrinho-neto de Eça de Queirós fez com que se tivesse dado ainda mais ênfase ao autor e ao seu livro. Tanto se falou sobre isto que, inconscientemente, fiquei com uma certa sensação de que não ler este livro seria um grande prejuízo para a minha cultura geral.

Agora que já o li, devo dizer que as minhas expectativas saíram um bocadinho goradas... Não haja dúvidas de que Afonso Reis Cabral sabe escrever de forma cuidada. Ele consegue transmitir de forma bastante clara tudo aquilo que pretende e, por via das recorrentes referências literárias (e não só), percebe-se que, apesar dos seus 24 anos da altura, era já uma pessoa com uma vasta e madura cultura geral, ou pelo menos, literária.

E no entanto, infelizmente, não posso dizer que este livro me tenha encantado totalmente. A verdade é que a determinada altura, a história começou a aborrecer-me.

Não vou discutir aqui os méritos que o livro tem por tratar de um tema que, supostamente, não é muito abordado, pelo menos na literatura portuguesa, até porque na minha opinião o cerne desta história não é tanto a vivência de uma personagem com síndrome de Down, mas mais a relação que um seu irmão estabelece com ele

Existem muitos exemplos de boa literatura sobre gente banal, por isso não é o facto de a história se centrar em gente banal que a torna desinteressante. Mas eu achei esta em específico bastante maçadora e sem um objectivo claro definido. Infelizmente, senti praticamente o mesmo ao ler este livro que senti quando li outro prémio Leya (O Teu Rosto Será o Último de João Ricardo Pedro). Será que havia alguma genialidade que me escapou à primeira leitura nestes dois livros? Tenho imensa pena, mas para me aborrecer e maçar, bastou a primeira, e única, leitura.
Profile Image for Pedro Fernando.
18 reviews2 followers
September 26, 2021
Apetece-me dizer uma asneira! Não a paro de dizer mentalmente... QUE DOR...

"Mais do que um escape, e se a vida é feita de locais, os livros eram um local onde eu ouvia as vozes dos outros como se fossem ditas por mim."
Profile Image for Lénia.
Author 6 books760 followers
January 15, 2015
Não fora o meio do livro ser chato e daria mais uma estrela.

A escrita de Afonso Reis Cabral é riquíssima, com uma maturidade extraordinária tendo em conta a idade do autor (24 anos). A história prende e cativa mas, mais ou menos a meio do livro dispersa-se, fazendo com que haja ali um entremeio dispensável e aborrecido. Depois retoma o ritmo, a história avança e termina como começou: com uma qualidade acima da média, que justifica o prémio que ganhou.
Profile Image for Ana Lúcia.
223 reviews
January 17, 2015
“O Meu Irmão” de Afonso Reis Cabral, foi distinguido por unanimidade pelo Júri do Prémio Leya 2014.
Este livro, conta-nos a história da relação entre dois irmãos; um deles o narrador, o outro Miguel com Trissomia 21.
“Eu nascera inteligente e perfeito, ele nascera inimputável e imperfeito. Sendo irmãos, não poderíamos ter nascido em lados mais diferentes da vida e, no entanto, um de nós conquistara o centro da vida e o outro não. O Miguel abdicara de todos os dons antes de nascer e por isso conquistara o paraíso na terra (…). Bastava-lhe existir para existir bem, em paz.
Já eu não abdicara de nada, permanecia inteiro e guardara os meus dons, motivo pelo qual talvez sentisse em dificuldade em encontrar a mão a que me agarrar. (…) Pelo menos, eu sabia que precisava de entregar qualquer coisa em troca, e essa coisa pedia perfeição, por isso ainda não a encontrara”.
Um olhar muito real, de quem sabe do que escreve; sobre a vida, o amor e as relações entre jovens e adultos com necessidades educativas especiais, sem lamechices, sem sentimentalismos fáceis.
Uma relação entre irmãos em que nem tudo é o que aparenta ser…
“ Regressando lado a lado, devagar, tateando. Perto do caminho que sobe para nossa casa, estreito-o com força. Murmuro-lhe ao ouvido “Miguel, não sei o que dizer”, e ele responde “Não digas nada”.
Qual dos dois será “O Meu Irmão”?
Profile Image for Marta.
256 reviews21 followers
September 26, 2023
O início foi estranho. Senti que a linguagem era bastante desenvolvida, daquelas que às vezes nos deixam distraídos porque não estamos alinhados com uma escrita mais arrojada. Houve momentos em que achei a história muito lenta, outros que fiquei agarrada à vida do Miguel e ao seu síndrome de down pelos olhos do seu irmão.
Sabemos que o Afonso Reis Cabral conhece esta realidade de perto, mas não achei que o síndrome de down do irmão tenha sido explorado num mau sentido. Alguns momentos foram mais duros de ler, mas senti sempre respeito e empatia na escrita do Afonso Reis Cabral. Apenas gostava que a história tivesse tido um ritmo diferente. Ainda assim, quero continuar a ler mais livros deste autor
Profile Image for Rosa Ramôa.
1,570 reviews85 followers
December 5, 2014
Afonso Reis Cabral nasceu em 1990...
Daqui a 10,15,20,25,30...anos.Falamos*
Profile Image for Inês Trindade.
4 reviews1 follower
September 6, 2024
“É mais fácil amar o que não existe, ou o que existe apenas em nós (um sonho, uma ambição).”

“Ser-se maternal é ser-se cansado e mesmo assim misturar a sopa.”

“(…) fora solto num campo cercado, e assim a liberdade derivava apenas de não saber que permanecia fechado em circunstâncias diferentes.”

“Por mais couraçados que nos tenhamos tornado, persistimos, como crianças, numa birra inexplicável por afecto.”

“Ao contrário do que se pensa, a solidão é simplesmente negar o próximo a cada dia; acto de retraimento quando nos tocam. Ora isto, embora não pareça, implica um labor que pode vencer-nos pela exaustão.”

“Esta indiferença, perante a morte daqueles que deram e foram a sua vida, comparados com uma qualquer, que se limitou a aceitá-lo quando ele cedeu à carência, revoltava-me como uma afronta pessoal.”
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