Autor de A vida e as mortes de Severino Olho de Dendê lança romance com toques de realismo mágico ambientado em cidade fictícia da Bahia.
Em Redenção vive apenas o que há de mais simples na humanidade. A cidade tem seus limites guardados por uma pedra enfeitiçada que a faz mudar constantemente de lugar, impedindo que qualquer geringonça inventada pelo homem seja capaz de localizá-la. E entre os moradores dessa cidade itinerante está Mané ― um sujeito tão simples que não há quem se lembre nem de seu nome de registro.
Mas isso não impede Mané de querer ser um poeta perfeito e apresentar a melhor versão de si mesmo a seu namorado Jeremias, que o incentiva a correr todos os riscos para viver o beijo ideal ― aquele capaz de provocar uma revoada de borboletas amarelas. Carregado de incertezas, mas decidido a não perder seu amor, Mané aceita a missão e acaba, acidentalmente, perdendo Redenção.
É na tentativa de retornar à cidade que ninguém nunca encontrou que Mané dará início a uma jornada pela Bahia, conhecendo lugares e personagens tão fantásticos quanto uma cidade que existe na língua de uma carranca, um patriota que decide erguer uma cerca ao redor da alma brasileira e até um engarrafamento que de tão gigantesco e parado acabou gerando uma sociedade própria. Nessa caminhada, Mané perceberá que para encontrar Redenção será preciso primeiro passar pela grande provação que é encontrar a si mesmo.
Com uma narrativa encantada e encantadora, Cartografia para caminhos incertos se movimenta pelas raízes da nossa cultura enquanto reflete sobre grandes temas, como amor, expectativas, empatia e solidão. Um romance com toques de realismo mágico que convida o leitor a caminhar com seu personagem principal pela beleza da língua e da identidade brasileiras.
Ian Fraser nasceu em Salvador, Bahia, no ano de 1983. Formado em Cinema & Vídeo e fundador do Teclado Disléxico, seu primeiro romance, O Sangue é Agreste, venceu o prêmio Jovem Autor Inédito pelo Selo João Ubaldo Ribeiro. O romance, um faroeste brasiliense repleto de experimentalismo formal, é o primeiro capítulo na trilogia Os Livros do Sertão. Ian Fraser também escreveu e produziu a peça A Máquina Que Dobra o Nada, sucesso de crítica e vencedor do Prêmio Braskem de Teatro, a maior premiação do teatro baiano, na categoria Melhor Espetáculo Infantojuvenil.
Ao perder sua cidade itinerante por conta de uma paixão, Mané precisa reencontrar Redenção se quiser ver Jeremias novamente.
Aqui, Ian Fraser faz um outro caminho com a prosa, num rumo diferente do que tomou com "A vida e as mortes de Severino Olho de Dendê": constrói uma fabula poética com muitas construções interessantes como uma releitura da Torre de Babel na Torre do Oi, ou a cidade em que todos são atores e tudo é uma peça e seus papéis na vida dizem respeito às profissões e à estrutura social, ou o momento de um grande engarrafamento em que as pessoas passam a se reorganizar a partir dos veículos parados na estrada.
A trama trata uma jornada de amor e autodescoberta, com um tom leve e otimista e bastante marcado pela poética — no entanto, o uso de algumas imagens, às vezes, pode cair num repertório já repetido e causar alguns incômodos.
Vale a leitura para conhecer mais dos horizontes de escrita de Ian.
Gente, eu simplesmente amei Cartografia para caminhos incertos, do Ian Fraser. É um livro que parece ter sido escrito sob medida para quem ama brincar com a língua – um verdadeiro deleite para professor de português. A cada página, me peguei assinalando frases que pulam da página com poesia e inteligência, como “Criar é olhar para trás, caminhando para frente, seguindo em direção ao abismo e acreditando que o chão estará lá”, um lembrete precioso de que inventar é um ato de coragem e inventividade.
A história de Mané em busca da cidade itinerante de Redenção é uma belíssima alegoria sobre encontrar um lugar no mundo. Enquanto ele atravessa vilarejos fantásticos e conhece personagens tão incríveis quanto um coronel literalmente partido ao meio, a escrita de Fraser nos envolve num realismo mágico todo brasileiro. Adoro como o autor subverte o tempo e o espaço, lembrando que “certeza é coisa miúda, cabe no bolso. Grande mesmo é a dúvida” — essa frase ficou ecoando na minha cabeça dias depois da leitura.
Eu fiz muitas marcações: nas descrições das torres invertidas, nas reflexões sobre cultura e identidade, e até nos diálogos quase teatrais que reforçam o poder transformador da arte. Claro, tem momentos em que a prosa se demora em detalhes – mas isso só mostra o quanto Fraser se importa em pintar cada cena como se fosse um quadro. Se às vezes eu senti saudades de um ritmo mais acelerado, logo voltava a me encantar com a riqueza das imagens e a originalidade de cada episódio.
No fundo, Cartografia para caminhos incertos é aquele tipo de obra que desafia o leitor a se perder para, enfim, se encontrar. Para mim, foi uma experiência literária inesquecível, carregada de humor, suspense e até de lirismo. Por isso, sem dúvidas, dou 4,5 estrelas — imperdível para quem respira literatura e adora descobrir os meandros da nossa língua e da nossa imaginação.
Nessa história acompanhamos as andanças de Mané em sua busca para voltar a Redenção.
Conforme vai andando pela Bahia, Mané conhece pessoas e vive situações nem sempre doces.
Na verdade tudo isso é uma metáfora para a vida e todas as suas implicações.
A história provoca inúmeras reflexões que passam pelas camadas econômicas, sociais, artísticas, patrióticas e a principal de todas: sobre nós mesmos.
Esta é uma narrativa fantástica - gênero fantasia - cheia de camadas que vem carregada de significados complexos apresentados de forma sutil.
O autor usa de prosa misturada a poesia e escrita experimental (ainda que em trechos breves) para desenhar está história.
O protagonista, Mané, é poeta e a história toda em si é poesia. Destaquei muitos trechos lindos durante a leitura. A história realmente traz muito em que pensar.
Infelizmente, não estou no meu melhor momento como leitora e não acho que aproveitei esta leitura como ela merece. Ainda assim, me vi em várias passagens da narrativa. Inclusive, encontrei aqui a frase que expressa exatamente o momento em que me encontro na vida, a forma como me sinto em relação a ela.
Esse é o poder da leitura. Fico muito feliz por encontrar tamanha potência numa obra brasileira.
São poucas as obras que me despertam o desejo de uma releitura e essa é uma delas. Um dia eu e esta história vamos nos reencontrar e eu, de verdade, vou conseguir aproveitar tudo o que ela tem para entregar ao leitor. Assim espero.
“Engraçado, não é? A cidade toda é um palco, todos são atores, mas não há artesania. É isso que acontece quando a arte aspira ser realidade, quando ela aceita os limites do concreto.”
Acho que esse trecho resume muito bem tudo o que o livro não é. Ele é real , mas de forma irreal. Tem tanta coisa concreta, mas também muito abstrata. É divertido, é lindo, é sensível, sabe? É um misto de todas as fases da arte.
Acompanhar Mané em seus caminhos incertos foi uma surpresa muito agradável para o fim do meu 2025.