O maior romance de Camilo Castelo Branco, Mistérios de Lisboa, foi, curiosamente, apesar do seu título, inicialmente publicado num jornal portuense, em 1853, sob a forma de folhetim; só em 1854 é que teve a sua publicação em livro para todo o país. Apesar de ser uma narrativa muito extensa e de ser o seu segundo trabalho literários, a obra teve um razoável êxito junto dos leitores, o que ajudou a cimentar a sua notoriedade como escritor.
A obra foi descrita pelo autor como sendo uma autobiografia verídica que lhe teria sido contada. Diz Camilo: “Este romance não é um romance: é um diário de sofrimentos, verídico, autêntico e justificado.” Esta particularidade de contar histórias a partir da ideia de ter bases verídicas acabaria por se tornar numa constante nas obras de Camilo e uma das práticas mais “emprestadas” por outros autores nacionais da época. Mas ao contrário de outros trabalhos camilianos que têm de facto, forte inspiração em factos verídicos, históricos ou mesmo autobiográficos, o Mistérios de Lisboa é quase inteiramente um romance ficcional, incluindo apenas algumas reminiscências biográficas do autor e cuja inspiração advém do título da obra “Les Mystères de Paris” do autor francês Eugène Sue, mas cuja similaridade não passa disso mesmo – apenas do título.
Apesar do seu título “Mistérios de Lisboa”, os conflitos da narrativa têm como cenário a vastidão do mundo, decorrendo não apenas em terras de Portugal, mas também do Brasil, França, Bélgica, Inglaterra, as colónias africanas e até do Japão, e são conflitos marcados por vectores que iriam perdurar noutras novelas suas posteriores: a vingança, o amor de mãe, a passionalidade, que se confunde com a ganância, a perversidade, a santidade e pecadores que ascendem à virtude conquistada através de sofrimentos e de lágrimas.: Obra completa
«Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco (1825-1890) foi um dos escritores mais prolíferos e marcantes da literatura portuguesa contemporânea tendo sido romancista, cronista, crítico, dramaturgo, historiador, poeta e tradutor. Teve uma vida atribulada, que lhe serviu muitas vezes de inspiração para as suas novelas. Foi o primeiro escritor de língua portuguesa a viver exclusivamente do que escrevia. Durante quase 40 anos, entre 1851 e 1890, escreveu à pena, logo sem qualquer ajuda mecânica, mais de duzentas e sessenta obras, com a média superior a 6 por ano. Prolífico e fecundo escritor, deixou obras de referência na literatura lusitana. Apesar de toda essa fecundidade, Camilo Ferreira Botelho Castelo Branco não permitiu que a intensa produção prejudicasse a sua beleza idiomática ou mesmo a dimensão do seu vernáculo, transformando-o numa das maiores expressões artísticas e a sua figura num mestre da língua portuguesa.» Fonte; http://www.luso-livros.net/biografia/...
Camilo Ferreira Botelho Castelo-Branco (1st Viscount de Correia Botelho), was born out of wedlock and orphaned in infancy. He spent his early years in a village in Trás-os-Montes. He fell in love with the poetry of Luís de Camões and Manuel Maria Barbosa de Bocage, while Fernão Mendes Pinto gave him a lust for adventure, but Camilo was a distracted student and grew up to be undisciplined and proud.
He intermittently studied medicine and theology in Oporto and Coimbra and eventually chose to become a writer. After a spell of journalistic work in Oporto and Lisbon he proceeded to the episcopal seminary in Oporto in order to study for the priesthood. During this period Camilo wrote a number of religious works and translated the work of François-René de Chateaubriand. Camilo actually took minor holy orders, but his restless nature drew him away from the priesthood and he devoted himself to literature for the rest of his life. He was arrested twice, the second time due to his adulterous affair with Ana Plácido, who was married at the time. During his incarceration he wrote his most famous work "Amor de Perdição" and later it inspired his "Memórias do Cárcere" (literally "Memories of Prison"). Camilo was made a viscount (Visconde de Correia Botelho) in 1885 in recognition of his contributions to literature, and when his health deteriorated and he could no longer write, Parliament gave him a pension for life. Going blind (because of syphilis) and suffering from chronic nervous disease, Castelo Branco committed suicide in 1890.
Trata-se do primeiro sucesso literário de Camilo Castelo Branco, e logo ao segundo livro que escreveu. Aqui estão contidos todos os elementos que vieram popularizar Camilo: a acção acelerada, predominando sobre os momentos descritivos, preenchida com uma verdadeira plêiade de palavras retiradas do dicionário que, como Voltaire, diz-se que lia todos os dias, mas que acrescentam pitoresco à narrativa, grande poder imaginativo e pujança na escrita.
Ao contrário de Eça, o seu grande rival, Camilo é um homem de acção, foi-o na vida, basta ver a sua biografia, desde a participação nas guerras civis entre absolutistas e liberais até às diversas polémicas em que esteve envolvido, não poucas criadas por ele, e é-o na literatura. Esse elemento está muito presente nos Mistérios de Lisboa e é, na minha opinião, parte da causa do seu estrondoso sucesso, ao ponto de ter sido o escritor português mais vendido do século XIX. Com todas as suas imperfeições e excessos, o seu conservadorismo político – é importante não esquecer que chegou a ser absolutista, na juventude –, o seu catolicismo clássico, com tudo o que tem de culpa, expiação, condenação divina e juízo final, que é, nunca é demais relembrar, o grande conector das várias histórias interligadas na obra, Camilo revela-se humano e reconhecidamente terreno. Agrada-me o sentido que nele há de todas essas imperfeições e de como, apesar delas, ou talvez por causa delas, o seu génio ainda hoje nos arrebatar.
Não obstante a ideia subjacente a este romance não ser nada de inovador, Mistérios de Lisboa é um claro subsidiário dos Mistérios de Paris, de Eugène Sue, uma década seu predecessor, há aqui algo de particular que justifica a sua originalidade. Esse algo, creio, é uma certa intuição da alma portuguesa. Castelo Branco intui aquilo que a alma portuguesa tem de profundamente humanitário, de livre, mas também de fatalidade, de saudade e coragem na desgraça, seguindo a interpretação que aponta Agostinho da Silva. A juntar a isto, estilisticamente, revejo em Camilo algo de Victor Hugo, no seu sentido do monumental, que ainda não me tinha apercebido nas suas novelas, forçosamente mais pequenas, sempre unido ao seu quixotismo, que o próprio arvorou para si, que tão deliciosamente nos faz rir.
I think I liked this book as much as I hated it ... it felt like reading a bunch of crazy telenovelas... but sometimes it felt like the narrator was full of sarcasm, so you could laugh at the characters with him. Pretty disturbing. It took me a whole month to get through all these impossible plots twists, but somehow I got attached to all the crazy people in this book. Read it only if you really have time.
Os tolos são felizes; eu se fosse casado eliminava os tolos da minha casa. Cada cidadão, que me fosse apresentado, não poderia sê-lo, sem exibir o diploma de sócio da academia real das ciências. Olha, criança, decora estas duas verdades que o Balzac não menciona na «Fisiologia do Casamento». Um erudito, ao pé da tua mulher, fala-lhe na civilização grega, na decadência do império romano, em economia politica, em direito publico, e até em química aplicada ao extracto do espírito de rosas. Confessa que tudo isto o maior mal que pode fazer à tua mulher é adormecê-la. O tolo não é assim. Como ignora e desdenha a ciência, dispara à queima roupa na tua pobre mulher quantos galanteios importou de Paris, que são originais em Portugal, porque são ditos num idioma que não é francês nem português.
Tua mulher, se tem a infelicidade de não ter em ti um marido doce e meigo, começa a comparar-te com o tolo, que a lisonjeia, e acha que o tolo tem muito juízo. Concedido juízo ao tolo, concede-se-lhe razão; concedida a razão, concede-se-lhe tudo. Ora aí tens porque eu antes queria ao pé de minha mulher o padre José Agostinho de Macedo, em cuecas, do que o barão de Sá coberto com a capa daquele grande piegas José do Egipto.
Ris-te?... Se queres ser feliz abdica da inteligência, convence-te, e convence os outras de que és um pária do senso comum, entra nesses camarotes, e diz que a letra do «Barbeiro de Sevilha» é de Voltaire, e a composição do maestro Spinosa; vira-te para a vítima predestinada, e diz-lhe que a música é a voz mística dos anjos confidentes das paixões delirantes, que dos olhos dela deviam partir as inspirações que arrebataram Raphael d'Urbino, que farás autor da «Norma». Se ouvires uma gargalhada insofrida, deixa-os rir; continua; faz-te vítima interessante, acolhe-te à piedade da dama, e fala-me depois"...
Este livro é o exemplo supremo do romantismo absoluto, pelo menos no meu percurso literário até hoje. Qual Victor Hugo, qual quê! Para um público moderno, não há como negar uma certa falta de verosimilhança, que chega a roçar o ridículo, para ser franca. Com tanta reza, tanta tuberculose, e tantas coincidências fatídicas, a chamada "suspension of disbelief" é testada até às últimas! Como sempre, o aspecto que mais me irritou foi sem dúvida o ideal romântico da mulher - são todas desgraçadas e submissas demais para o meu gosto. Mas se formos a ver, isto até nem é de admirar, tendo em conta que é um dos primeiros livros do Camilo, que só anos mais tarde experimentou um estilo de escrita mais realista. Quanto à história em si, se bem que muito romântica, como já disse, e cravejada de exageros, não deixa de ser muito rica em personagens e acontecimentos, que prendem a atenção do leitor até ao fim - pelo menos, prendeu a minha, e céptica como sou, isso não é tarefa fácil para um livro destes. Ajuda muito o facto de o livro estar estupidamente bem escrito, apesar de se notar a relativa juventude e inexperiência do autor (sublinhe-se "relativa", porque o Camilo consegue escrever um dos seus primeiros romances com mais capacidades do que muitos escritores de muitos anos). Mas também, que mais seria de esperar de um homem que é quase universalmente reconhecido como um dos melhores escritores que este país já viu?
Uma autêntica telenovela que mesmo assim captiva o leitor, quer pela linguagem usada que flui bastante bem quer pelo enredo que apesar de ser bastante melodramático não é horrivelmente maçador.
Voici un livre que je n'aurais probablement pas choisi si j'avais été plus attentive à la quatrième de couverture et sur l'époque de l'écriture. J'en aurais conclu qu'il y avait un fort sentiment religieux catholique et je n'aurais pas su que malgré cette ferveur religieuse, c'est un livre assez humaniste, refusant d'accabler les pêcheurs et expliquant leur impiété et leur malfaisance par leur souffrances. Si je ne m'abuse, il y a même quelques piques contre la religion exercées par les autorités et quelques mains tendues en faveur des agnostiques.
Cela dit, le récit réclame vertu retrouvée et austérité de vie. Quelque soit votre situation, il n'y a de salut que dans l'engagement religieux : la vie au monastère est seule à même d'apporter la paix. Celle-ci ou celle de prêtre, encore que...
Malgré de nombreux rebondissements, cette lecture fût assez longue et quelque peu monotone. Une fois que l'on a compris le principe - tout le monde est lié, tout le monde souffre, tout le monde se rachète dans l'ascétisme - on n'est même plus surpris par l(a ré)apparition et la métamorphose des personnages.