Dyonélio mostra bem nesta obra como questões de dinheiro são complicadas, como tudo é delicado e sentir vergonha é fácil. Também mostra com às vezes nos sentimos pequenos e medíocres perto de indivíduos mais empreeendedores, mais desenrolados, que ganham dinheiro tão fácil, e tem uma relação tão amiga com este que parecem quase "ladrões".
Mas outras coisas me incomodam. O livro é muito prolixo, e as 200 páginas poderiam ser 70 facilmente, sem prejuízo do tom da obra, em mãos de outro autor, além do uso de expressões idiomáticas regionais complicou um pouco (o que não é propriamente um defeito, mas dificultou a leitura para mim).
O final pode parecer anticlimático para alguns, mas o interessante é notar que o maior problema, o problema oculto, escondido durante a trama nunca se resolve, a despeito do que um leitura superficial possa sugerir.
Porto Alegre , década de 30, Com poucos recursos e uma dívida volumosa, o funcionário público Naziazeno Barbosa já cortou o consumo de gelo e manteiga e corre o risco de ficar sem leite para o filho ,caso não consiga, até o fim do dia, 53 mil-réis para pagar o leiteiro, que lhe dá um dia de prazo para pagar os atrasados. Para isso recorre a várias pessoas ; seu chefe , agiotas amigos , jogo do bicho e casas de penhores,sempre colocando nas mãos dos outros o seu próprio destino. O livro retrata um dia inteiro de tentativas de Naziazeno para conseguir arrumar esse dinheiro. Mas o que os ratos têm a ver com isso? Só lendo pra descobrir.
Não é um livro simpático de ler (a atmosfera toda dele é miserável e frustrante), mas é quase interessante. O protagonista, Naziazeno, é uma daquelas personagens derrotadas, que não têm coragem nem auto-confiança para mudar a própria vida, mas que tem que arranjar um jeito de ir vivendo mesmo assim, no meio de um monte de dívidas e vergonha de si mesmo. O livro tem uma narrativa meio estilo fluxo de consciência, também, misturando a realidade com as memórias, pensamentos e imaginações de Naziazeno. Mas o texto é horrível de ler: tem milhares de aspas e itálicos em palavras aleatórias, e três pontinhos a toda hora, sem falar que é muito mais repetitivo do que precisava para criar esse clima de cotidiano desesperançado, cheio de problemas recorrentes, difíceis de resolver.
O livro segue Naziazeno, que deve uma quantidade (pequena) de dinheiro para o leiteiro. É um dia inteiro gasto com andanças, maquinações, tensões, receios, humilhações, ilusões para conseguir a quantia. Para mim, fica essa miséria de perder um dia e o desgaste mental e moral para sair da situação de ser um devedor. O tempo inteiro ele é assombrado por sua situação, pelo risco de não ter mais o leite para a família, tudo de forma bastante nebulosa e vaga em sua cabeça, mas para quem lé é bem clara a sensação de derrota e falta de controle.
Angustiante novela que narra las peripecias del protagonista en el submundo de burocracia oficinesca, apuestas clandestinas, prestamistas y vividores del Porto Alegre de 1930 para conseguir el dinero que necesita para poder pagarle al lechero y no pasar un día más de verguenza en el barrio con todos enterándose de que a él no le hacen entregas
Há que se considerar na avaliação que o tempo narrativo do autor é diferente do atual, e isso pode dificultar o ritmo da leitura. Feita essa observação, é um grande livro, principalmente por abordar como a miséria pode corroer a existência de uma pessoa, em como se busca uma saída fácil e pouco laboriosa para um problema. Naziazeno, o protagonista, muitas vezes nos deixa com raiva dele, devido à falta de postura e combatividade. Ao fim, não temos pena dele, apenas deparamos com a ausência de sentido e objetivo maior após um dia de "trabalho".
Um romance escrito às pressas por um escritor inexperiente, à convite de Érico Veríssimo, para participar de um concurso de literatura daquele mesmo ano, poderia dar certo? E deu. O livro soube, em uma narrativa de apenas um dia na Porto Alegre dos anos 30, passar muito da realidade social da cidade, os conflitos e os costumes das diferentes castas, sob a óptica de Naziazeno, um senhor de classe baixa que busca com todas as suas forças um meio de pagar a sua dívida para com o "leiteiro".
[retroactive review to catch-up, may not be so accurate]
Rat man summer started in Brazilian literature 90 years ago.
Always wanted to pick up this short novel and read it entirely so I decided to make it my beach read. The novel narrates 24 hours in the life of Naziazeno, who needs to collect money to pay the milkman. The chapters describe the series of adventures the man goes to get the amount.
Was a little bit harder to read than I imagined. Although the chapters are short, the prose is highly descriptive and in such a way that zoning out will not reward the reader: the novel’s beauty relies on the intricacy and ambiguity of language used to describe mundane and human events with an animalesque, rodent-y perspective. Of course, the big picture is also rat-like, as one can view Naziazeno’s swinging movements through hot shady alleys of Porto Alegre as nothing more than those of a rat in search of food. But in the ways humans are described—with their noses often called snouts, their shadows often referred to as tails, and so on—we can see Dyonelio Machado’s real critique of society. If you pick up this book, I recommend paying attention to every word.
Obviously the main themes presented in the book—the de-humanization caused by capitalism and societal hierarchies being the primary theme—are still very relevant and contemporary. But, especially as we’ve spent decades if not centuries writing novels to address that, this novel may not be the best representative of its genre. Adding that to the aforementioned issue with the difficulty to crack the crux of the originality, and you get my slightly negative review. While I think this novel is an amazing read for those interested in the history of Brazilian Literature, I am not sure it can truly stand comparisons to more contemporary works.
A highlight in the novel to me was the last set of chapters, set during the night, after Naziazeno has sourced the money and returned home. We have a glimpse into the thoughts that keep him awake at night and replay the day through his own perception. We understand how the character perceived the interactions we read about throughout the novel, and we experience the feeling of anguish stronger than ever.
*O 1º livro de 2025 deveria ter sido o 19º de 2024.
🗣️ “A sua tristeza tem sempre esse rebate no estômago e no peito: sente dentro de si um oco dolorido, ao mesmo tempo que as feições se lhe repuxam... E pela segunda vez, nessa manhã, a impressão da solidão, do abandono...”
🐁🐀 “Os Ratos” é um romance que narra um dia na vida de Naziazeno Barbosa, um funcionário público de baixo escalão que precisa conseguir liquidar uma dívida de cinquenta e três mil réis com o leiteiro para que este não corte o abastecimento de leite, que deixaria o filho de Naziazeno sem o alimento. Naziazeno tenta a ajuda de amigos, tenta empréstimos e até aposta em jogos de azar.
⏳ A história acontece em 24 horas – com muita tensão na cabeça do personagem — e fisicamente na cidade de Porto Alegre (RS). Acompanhamos a angústia de Naziazeno na tentativa de conseguir dinheiro para pagar essa dívida com o leiteiro.
🪤 Ao meu ver, “os Ratos” servem como uma metáfora para os indivíduos marginalizados e desprezados pela sociedade e até para o próprio protagonista, que se comporta andando de forma acuada como um rato em busca de comida pelos cantos da cidade – no caso dele, em busca de 53 mil réis para sanar uma dívida.
📚 O livro é bom, mas acho que eu estava cansado e, por isso, não o terminei em dezembro de 2024. Por vezes senti a narrativa um pouco monótona. Sei que tem ali uma possível crítica ao Estado Novo e outras questões sociais, mas como aqui é apenas o relato da experiência com a leitura, a minha nota para “Os Ratos” (Dyonelio Machado) é de 3,5 de 5,0 ⭐️⭐️⭐️💫
This entire review has been hidden because of spoilers.
Divertido e estressante. O subtexto é clássico dos romances urbanos da época, sobre condições de vida precárias mesmo para quem tem uma situação um pouco melhor - o protagonista é um funcionário público. Mas a narrativa é muito bem construída - inclusive, em alguns momentos, o jogo de ironias me lembra um pouco uma prosa Machadiana -, o desespero do personagem te leva junto a pensar "puta merda, será que vou arrumar o dinheiro do leite?", o jogo como alternativa faz pensar sobre hoje, em que o Tigrinho é logo ali, e a felicidade da esposa quando o marido chega em casa com manteiga e queijo me alucina de pensar que ainda hoje são itens que não estão na mesa de qualquer trabalhador. As voltas dadas na cidade, num dia que nunca termina, e a barriga sustentada por um cafezinho, avivam a agonia que quem é ou já foi fodido entende bem. E mesmo assim, Naziazeno é um péssimo funcionário, que parece não dar valor ao trabalho que tem, e suas péssimas escolhas provocam tanto um pouco de compaixão, pela honesta estupidez, quanto raiva, porque além de não resolver o problema, dele dependem sua esposa e seu filho pequeno. É um romance divertido pela maneira como o autor narra os acontecimentos, mas é trágico o contexto e estressante acompanhar o homem brasileiro médio tentando fazer alguma coisa direito (até quando acerta erra). Enfim, o final me deu um pouco de alívio, mas segurei a respiração até o final, tal qual Naziazeno, pensando "meu Deus, será que os ratos...".
Com uma escrita inicialmente estranha, uma narração embaraçosa (entre o narrador e os pensamentos do protagonista) e imerso num cenário de modernidade estagnada, Dyonelio demonstra através de Naziazeno e suas agonias cotidianas um cenário complexo.
O livro é baseado na narrativa de mais um endividado, que corre e rasteja entre os cantos, as vielas e as ruas confusas de Porto Alegre em busca de dinheiro.
Um ótimo retrato do Brasil pré Estado-Novo e que explica muito bem. Um recorte psicológico e narrativo que representa muito bem a vanguarda expressionista.
Um livro que vale a pena ser lido. Sobretudo, de ser lido de forma frenética, acredito que somente assim se entenderá com mais veracidade a perspectiva de Naziazeno.
"Os retirantes nordestinos de Graciliano em Vidas secas, pressionados pelo sertão esturricado, se encaminham para o sul, a uma cidade grande, com a esperança de redimir os males de sua triste condição; o pobre homem de Dyonelio se debate inutilmente para encontrar uma saída em sua cidade no extremo Sul. O romance de 1930 se tornou, entre tantas coisas relevantes, um mapa moral da geografia humana do Brasil" - trecho da crítica de Davi Arrigucci Jr.
Em algum momento da adolescência, me dei conta, preocupado, com a ideia de que um dia teria de fazer o que meus pais faziam: ter dinheiro para manter uma casa e os filhos. Será que eu daria conta? É mais ou menos disso que se trata a obra do gaúcho Dyonello Machado, que em "Os Ratos" narra um dia na vida de um homem casado, com um filho, que deve honrar uma dívida com o leiteiro ara não ser despejado. Naziazeno Barbosa é funcionário público em Porto Alegre. Sai de casa aflito pela cobrança humilhante, e o autor nos leva a acompanhá-lo durante um dia pela capital provinciana. Recorre a amigos, agiotas, malandros, roleta. A angústia apenas aumenta. O texto de Dyonello Machado é seco e ágil, um livro muito agradável de ler, apesar do conteúdo. A edição da Todavia traz ainda posfácio do escritor e crítico literário Davi Arrigucci Jr.
A narração tem um tom teatral que enche o leitor de expectativa em suas possibilidades. Falha. Há uma prolixidade que não condiz com nada da estética proposta, nem mesmo com alguma estética de seu tempo. Um ponto positivo é o uso do tempo presente, que cria a imagem como forma e fato na cabeça do leitor, qual um bloco de concreto. A temática do livro é boa e atemporal. Quem não tem preocupações financeiras que atire a primeira pedra. É uma pena que a construção do livro não consiga casar a urgência sentida por Naziazeno com um dinamismo na escrita. Por último vem a coisa que mais me tirou da narrativa durante todo o livro: as malditas aspas. O uso de aspas faz com que o leitor repense o que está escrito, não aceite de forma passiva; mas o exagero no uso das aspas cria o efeito contrário: de tanto as ver por aí, seu cérebro ignora o efeito crítico que elas criam.
O livro apresenta um dia da vida de Naziazeno, funcionário público com problemas financeiros que acaba por fazer grandes esforços para pagar suas dívidas, envolvendo-se com jogos de azar, favores, esquemas, agiotas e afins. Traz uma grande crítica à busca por dinheiro, ao capitalismo, por meio da humilhação e sofrimento, físico e psicológico, a que o personagem principal se submete para conseguir pagar suas contas. O autor tem grande viés anticapitalista, mas constrói sua crítica em cima de um personagem avesso ao trabalho e problemático. Enfim, bom livro para a velha esquerda jovem das faculdades de humanas espalhadas por nosso Brasil.
"Os ratos estão roendo, roendo, perto dali, no canto do soalho... Talvez seja a própria tábua do soalha que eles estão roendo... Estuda bem a "questão": se os ratos roem dinheiro... Vê os ninhos, os papéis picados, miudinhos, picadinhos, uma moinha... uma poeira... Sente um pavor e um frio amargo dentro de si! Aquela nota verde, gordurosa, graxenta, está sendo roída... roída... roída... Esse fato está se passando agora, é contemporâneo dele!... Os ratos estão roendo ali na cozinha... na mesa... são dois... são três... andam daqui para lá... giram... dançam... infatigáveis... afanosos... infatigáveis..."
A leitura é bem desagradável e arrastada, e acredito que seja de propósito. O livro passa todo num dia só, e ele se arrasta e parece que nunca vai acabar. Pra mim é um livro que retrata bem a realidade da maioria das pessoas pobres e endividadas do país, desesperado e envergonhado, e essa angústia é muito bem passada pelo narrador ao leitor. Na época que li eu queria que acabasse o mais rápido possível, pois era um porre, depois percebi que era assim mesmo que o autor queria que o leitor se sentisse. Livro foda.
Proposta interessante do autor. É difícil de ler, assim como é difícil viver a situação. Uma proporção psicológica, digamos. Gosto da metáfora, gosto de ter adiantado a crítica acerca da crise do país. Eu enlouqueci junto do personagem, mas se era a intenção, então tudo bem. Mas nem perto dos favoritos, apenas admiro o autor. Não nego que o ponto alto foi o final, por estar acabando e concluir a ideia dos ratos. Fim da agonia, pelo menos na ficção.
A história é bem simples, e até bem interessante, mas a escrita é muito arrastada. Nazareno, o protagonista, nunca descreve bem o que está realmente acontecendo, ele está sempre "sonhando" com o futuro, com que ele imagina que irá acontecer, que os momentos presentes são ignorados ou relembrados apenas com algumas frases chaves, o que torna a escrita bem confusa.
Como uma pintura de Iberê Camargo, perfeitamente ilustrando a capa da edição.
O Rato é tanto o desígnio da paranoia galopante e delirante de Naziazeno quanto o seu próprio ser: Um rato a procura da solução de seu problema mais imediato, em uma existência de penúria em um ambiente provinciano como o de Porto Alegre, mas que à medida que cresce, a opressão gerada dentro do espaço só aumenta.
Um classiquinho meio underground com referência de muitos autores e movimentos diferentes. Leitura gostosinha, reflexiva e bastante atual. É pra constatar que, dos anos 30 pra cá, as contradições da vida humana continuam praticamente as mesmas. Nada inovador, mas importante! Só não entendi porque o autor usa tantas aspas em palavras completamente aleatórias kkkkkk
Um daqueles livros que li sem deixar minhas impressões à época, então registro apenas o sentimento que ele ainda me provoca. De maneira geral, eu estive bem envolvido com a história e gostei da forma como ela foi construída, não se limitando ao seu final.