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320 pages, Hardcover
First published October 30, 2018
[…] em 2015, a Associated Press usou a lei para obter os e-mails de um checkoff — o Conselho Americano do Ovo. As mensagens mostraram que o grupo estava engajado em uma campanha coordenada e bem financiada para minar o crescimento da Hampton Creek, empresa que fabricava o substituto de maionese sem ovos Just Mayo. A leitura era de que a ameaça do Just Mayo à venda de ovos havia chegado a um ponto crítico. O Conselho Americano do Ovo tentou impedir que o Whole Foods Market, maior comercializador de orgânicos dos Estados Unidos, vendesse o Just Mayo; pressionou a Unilever a opor-se à Hampton Creek; induziu a FDA a averiguar a rotulagem do produto; ameaçou o CEO; pagou blogueiros para desacreditar a empresa; e recrutou uma firma de gestão de crises para fazer uma campanha contrária.
Tupper escreveu que admirava meu trabalho, mas tinha ficado desapontado por ler uma citação minha em um artigo, dizendo que “a romã não é melhor do que qualquer outra fruta. É apenas brilhantemente comercializada. Gaste vinte milhões de dólares em pesquisa somente sobre uma determinada fruta. E você descobrirá que ela certamente proporciona benefícios milagrosos.” A carta de Tupper explicou que “a pesquisa médica financiada pela POM Wonderful não é simplesmente uma ferramenta para comercializar mais romã […] Em vez disso, o objetivo fundamental do programa de pesquisa da empresa é desenvolver uma compreensão cientificamente sólida sobre como e por que a romã impacta a saúde humana”. Tupper disse que a companhia acredita que a romã é superior a outras frutas e legumes porque só ela possui “uma infinidade de compostos antioxidantes potentes, e, portanto, está no topo da pirâmide nutricional”. Ah, sim, antioxidantes.
Desde 1980, o Guia Alimentar dos Estados Unidos tem recomendado sempre a ingestão de menos açúcar, embora com o objetivo principal de reduzir calorias “vazias” (sem nutrientes) ou evitar a cárie dentária. Somente em 2015, o documento indicou a ingestão de menos açúcar para redução do risco de doenças crônicas. No mesmo ano, a Organização Mundial de Saúde considerou que o ingrediente é um importante fator de risco para obesidade, diabetes tipo 2 e outras doenças crônicas. No que diz respeito à gordura saturada e ao açúcar, a recomendação dietética geral permanece praticamente a mesma desde 1980, mas as razões para a redução do consumo de açúcar aumentaram. Esse pode ser o motivo pelo qual o foco da mídia mudou. A revista Time disse que os cientistas estavam errados sobre a gordura e que “a manteiga está de volta”, e os jornalistas têm escrito livros argumentando que o açúcar causa doenças crônicas que vão de obesidade e diabetes tipo 2 a gota e demência.
As empresas alimentícias responderam a essas tendências, tentando remover o máximo de açúcar possível dos produtos — exemplo de “nutricionismo” em ação. Cunhado pelo sociólogo australiano Gyorgy Scrinis e popularizado por Michael Pollan, esse termo descreve o uso reducionista de nutrientes individuais ou componentes alimentares, em vez de olhar para padrões alimentares. Os açúcares e as gorduras saturadas são os marcadores dos padrões alimentares ocidentais associados a excesso de comida e peso, obesidade e doenças crônicas relacionadas. Quando as recomendações dietéticas se concentram em nutrientes ou alimentos isolados, as empresas alimentícias são beneficiadas — facilita o marketing.
“o objetivo final de qualquer empresa é vender produtos.”
“é claro que não há a mais remota possibilidade de que o consumidor médio — categoria que inclui crianças, analfabetos, incapazes de fazer equações e assim por diante — faça isso.”
Sheldon Krimsky, professor da Universidade Tufts que estuda a manipulação da ciência pela indústria, afirma que esse “efeito de financiamento” foi descoberto em meados da década de 1980, quando cientistas sociais perceberam que, se soubessem quem pagou por um estudo, poderiam prever os resultados.
Todos os que pertencemos a sociedades de nutrição por razões profissionais enfrentamos o problema de, às vezes, discordar das políticas. Os profissionais de nutrição são humanos, e nós, humanos, acreditamos que somos imunes à influência do patrocínio. Premeditadamente ou não, as sociedades de nutrição endossam os produtos dos patrocinadores. Quando, por exemplo, a academia permite que a Associação do Açúcar exponha na reunião anual, pode ser constrangedor recomendar ao público a redução do consumo de açúcar. Essa é uma situação que dá a entender um conflito de interesses e leva à perda de confiança — e, às vezes, à ridicularização.
Em 2012, a vice-presidente e diretora de Ciência e Saúde da Coca-Cola, Rhona Applebaum, que também se tornaria presidente do ILSI [International Life Sciences Institute] três anos mais tarde, anunciou um grande esforço para combater as evidências que ligam os refrigerantes a dietas pobres e a problemas de saúde. Applebaum não mediu as palavras. A pesquisa financiada, disse ela, foi essencial para rebater a ciência promovida pelos defensores de impostos sobre refrigerantes. A Coca-Cola pretendia treinar jornalistas e atrair cientistas parceiros para conduzir “pesquisas defensivas e ofensivas”. Caso contrário, a indústria ficaria à mercê de “ativistas e jornalistas fanáticos”.
Esse esforço foi de fato significativo. Foram identificados 389 artigos publicados em 169 periódicos de 2008 a 2016, ou diretamente financiados pela empresa, ou realizados por pesquisadores com laços financeiros com a companhia. De maneira geral, a conclusão foi de que, no controle do peso, a atividade física é mais efetiva que a dieta; os açúcares e os refrigerantes são inofensivos; as evidências contrárias estão erradas; e as pesquisas bancadas pela indústria são superiores às financiadas por outras fontes.
[…] os vieses ideológicos e intelectuais geralmente podem ser deduzidos a partir da hipótese de um estudo — o que ele tenta provar. Os vieses financeiros, porém, só ficam óbvios quando são divulgados.
Doces não são alimentos saudáveis. São um prazer e, como tal, é melhor que sejam consumidos de forma ocasional e em pequenas quantidades.
Diante dessas dificuldades, penso que apenas uma opção pode realmente funcionar: um programa de pesquisa para que toda a indústria pague um imposto ou uma taxa obrigatória. Tornar as contribuições obrigatórias eliminaria o problema de ter de agradar aos doadores para garantir o financiamento contínuo. A ideia seria exigir que todas as empresas de alimentos, bebidas e suplementos com vendas acima de determinado nível pagassem um imposto proporcional à receita. Uma agência do governo, uma fundação privada ou um grupo independente poderia coletar os fundos e administrá-los, assim como acontece com o Instituto Nacional de Saúde. Tais sistemas teriam as próprias fontes de viés, mas os vieses não seriam comerciais.