Porto Alegre, anos 1920, uma cidade em plena febre de modernização. Vitória, uma jovem negra com grandes ambições e talento para a escrita, sonha em se tornar jornalista. Mas, para isso, precisa enfrentar os estigmas de uma sociedade racista e patriarcal. Esse é o mote de Beco do Rosário, romance gráfico de Ana Luiza Koehler, que a Veneta lança com apoio do programa Rumos Itaú Cultural.
Fruto de uma extensa pesquisa histórica, o livro retrata o conturbado processo de expansão da capital gaúcha, marcado pela desigualdade social e pelo racismo. Um processo que tinha como objetivo “europeizar” a cidade, tentando jogar seus habitantes negros para fora do campo de visão.
Vitória é moradora do Beco do Rosário, que dá nome ao livro, um espaço prestes a ser extinto para dar lugar a ruas e avenidas. Teo, seu amigo de infância, é filho de uma rica família de imigrantes e volta para Porto Alegre após se formar engenheiro no exterior, cheio de novas ideias para a capital. Já Fabrício é um jovem artista negro que não consegue ver seu talento valorizado no mercado de trabalho. É por meio das histórias e dos laços entre esses personagens que o livro retrata as mudanças na paisagem da cidade. Com belos traços aquarelados, Ana Luiza Koehler constrói uma grandiosa narrativa de época e um poderoso comentário social sobre os processos de modernização urbana da primeira metade do século XX.
O RESUMO DA ÓPERA: O gigante de concreto devora os humanos. Seus mestres se regozijam em nosso sangue. Seguir em frente é difícil, mas existir é resistência.
Beco do Rosário conta a história da gentrificação do centro de Porto Alegre, e como a prefeitura ativamente desalojou as populações negras e pobres para poder demolir suas casas. Para onde essas pessoas iam? Para as periferias, tendo que pagar mais e demorando mais para chegar no trabalho, ajudando na manutenção da pobreza. Ruas modernas e bonitas não podiam abrigar essa “gentalha” como dizia o jornal da época. A trama acontece através de saltos temporais, onde vemos as famílias de Vitória e de Teo encararem os tempos mudando. Vivi luta por anos para tentar ser repórter, claro que nos outros anos 20 jamais seria bem visto uma mulher fazendo essas coisas. Teo perde a perna na guerra defendendo a Alemanha, e volta para o Brasil achando que pode europizar tudo. Ele não é mau, só cego, descolado da realidade. O talentoso escultor negro é pbrigado a abandonar sua arte e destruir seu próprio bairro para sobreviver. A mulher negra não pode fazer nada sem ser constantemente lembrada de que não pode fazer nada. A idosa negra é obrigada a ver suas memórias na casa em que viveu a vida toda serem destruídas. Enquanto isso, a mulher branca vive uma vida privilegiada, mas castrada pelo machismo. A arte é espetacular, Ana Luiza Koehler transforma cada quadro em uma pintura, e seguindo um leiaute tradicional e intensamente carregado de imagens e texto, manipula nossos sentidos quando quebra suas próprias regras. É uma tática simples, mas que somada ao seu texto deliciosamente real e sua arte intensamente detalhista, parece que não poderia ser de outra forma. Ao fim os donos do poder conseguem o que querem. E talvez a sobrevivência dos oprimidos só seja possível quando eles se percebem como tal e se unem, não para mudar o mundo, mas para, em mundo que criminaliza sua mera existência, serem eles mesmos.
uma HQ que é um portifólio de aquarela. belos quadros, belas cores, traço rico.
a narrativa me pareceu ilustrar uma pesquisa da história da cidade de Porto Alegre que ficou um pouco vaga. há a vontade de condenar o projeto higienista da época mas não se mostra a vitória dos governantes em abafar as resistências. me deu a sensação de ler diálogos empenhados em se esquivar dos fatos da mesma maneira que os responsáveis o fizeram na época. pode fazer mais sentido para quem vive em Porto Alegre.
também achei que os cortes e as composições de página não alcançaram a força das aquarelas. encontrei alguns remendos clássicos como a seta chapada que indica o sentido de leitura e o recordatório que não se coloca como narrador. enquanto linguagem de quadrinho essas ferramentas são possíveis mas não contribuem para o aumento de carga dramática dos desenhos, na minha opinião. e só digo isso porque a autora é uma das pessoas mais interessantes do meio dos quadrinhos no país... então insisto nessa crítica: neste trabalho de alta qualidade faltaram contribuições para o roteiro e edição da composição.
tenho certeza que Ana Koehler ainda publicará muitos trabalhos belíssimos. gostaria de ver uma novela gráfica sair da pena dela em um contexto de produção de livro melhor amparado: com roteirista, revisora, editora que tirem esse peso monumental das costas da artista e contribuam para um trabalho final estruturado e polido.
acho que esta HQ faz parte da cena junto de Angola Janga e outras obras de pesquisa histórica feita pelos próprios autores. Assim é peça necessária em qualquer biblioteca de quadrinhos brasileiros.
como bom bairrista da cidade de porto alegre que sou não tem como ser menos que 5. é uma obra curto, mas com roteiro extenso, bastante histórias acontecendo simultaneamente, personagens que se envolvem entre si e com a cidade. tudo isso com uma arte espetacular da ana luiza koehler, toda colorida em aquarela.
não tem o que falar: quem ama porto alegre, vai amar essa história.
Linda obra sobre a história das transformações por qual Porto Alegre passou no início do século passado no processo de se transformar uma metrópole. O estilo gráfico de Ana Luiza é lindo e os personagens são super interessantes.
História bem contada, personagens bem trabalhados e um relato histórico bem interessante que permeou todas as grandes cidades brasileiras. Fora a linda arte.