O jornal Última Hora, mais a sua pobre, cercada e aterrorizada redacção, vive o destino de todos os periódicos hoje em dia: uma grave crise. As breaking news neste caso são mesmo as notícias do seu fim.
Num verdadeiro caldo de nervos – agravado por coisas como a Internet e a partilha grátis de conteúdos nas redes sociais, as manipulações políticas, o despedimento dos repórteres mais capazes ou as fake news –, os protagonistas deste livro‑espectáculo terão de tomar decisões absurdas, contraproducentes, caricatas, lamentáveis e, porque não?, comoventes, para salvarem o amor‑próprio, a subsistência e até a essência da sua profissão.
RUI CARDOSO MARTINS nasceu em Portalegre, a 25 de Março de 1967. É um escritor, jornalista e argumentista português. Foi repórter e cronista no Público, e foi um dos fundadores das Produções Fictícias, sendo um dos escritores do programa Contra Informação, da RTP 1. Para o cinema, escreveu o guião de "Zona J" e (em parceria) o da longa-metragem "Duas Mulheres".
O seu primeiro livro, "E Se Eu Gostasse Muito de Morrer", de 2006, está na quarta edição em Portugal, tendo sido publicado na Espanha e Hungria. O seu segundo livro, "Deixem passar o homem invisível", foi premiado com o Grande Prémio de Romance e Novela, da Associação Portuguesa de Escritores/Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas.
"Pinheiro Tavares Não andavas a escrever teatro, o teu grande sonho de… jornalista?
Coelho Martins Sim, mas que porcaria de vida, uma pessoa acordar e deitar -se preocupada com pessoas que não existem é desesperante! Nunca me avisam do que vão fazer, sentadas ali a olhar para mim no escuro. «Escreve-me. Escreeeve-me.» Estou farto. Sou um homem da realidade que calhou amar a arte.
(...)
Coelho Martins Matei as minhas personagens todas. Todas. Autor confessa limpeza étnico -estética. Qual autor!, sou um editor de Cultura genocida.
Santos Ferreira (na caixa de fumo, pensativo) Mãezinha. Estou tão doente que não consigo fazer nada. Olha, vou aproveitar para não fazer nada. Há coisas piores do que não fazer nada. O Homem pisou a Lua. O Muro caiu. As Torres Gémeas também, mas a seguir. E que mais foi?… (Absorto, tenta lembrar. Toca o telefone da secretária. Aborrecido, aspira o cigarro como se assim respirasse melhor. Atende.) Cemitério dos Prazeres. Urnas para sepultura, arranjos florais, em que posso servi -lo? Quem? Ah, é você. Desculpe estar de pijama." (p.20)
Uma interessante sátira ao jornalismo em forma de peça de teatro. Lê-se rapidamente e a história é empolgante. Para alguém que trabalha nesta área foi divertido ver todos os estereótipos espelhados em cada uma das personagens e os principais problemas dos media abordados de forma mais ou menos ligeira: a ditadura dos cliques, a precariedade, o sensacionalismo, a dificuldade em encontrar um modelo de negócio viável, o online versus o papel. Gostei sobretudo do início do livro por abordar mais a fundo estes temas, não tanto dos últimos dois actos, que a meu ver se passam de forma demasiado rápida, tendo em conta a velocidade da ação no primeiro ato. Mas recomendo vivamente esta leitura! Espero ter a oportunidade de ver em peça de teatro no futuro.