Que segredos rodeiam a vida de António Augusto Milhouse Pascal, um velho senhor que se esconde do mundo num casarão de província, acompanhado de três netos insolentes, um jardineiro soturno e um rol de clientes tão abastados e influentes como perigosos e loucos? São estes mistérios que o narrador - um rapaz de família modesta - procurará desvendar durante mais de um quarto de século, não podendo adivinhar que o emprego que lhe é oferecido por aquela estranha personagem se irá transformar numa obsessão que acabará por consumir a sua própria vida. Passando pelo Alentejo, por Lisboa e por Nova Iorque em plenos anos oitenta - época de todas as ganâncias - e cruzando a história sangrenta do século XX com a das suas personagens, As Três Vidas é, simultaneamente, uma viagem de autodescobertas através do «outro» e a história da paixão do narrador por Camila, a neta mais velha de Milhouse Pascal, e do destino secreto que a aguarda; que estará, tal como o do avô, inexoravelmente ligado à sorte de um mundo que ameaça, a qualquer momento, resvalar da corda bamba em que se sustém.
João Tordo was born in 1975. He has published twenty-one books - novels, crime novels and essays - and received several awards, including the José Saramago Literary Prize 2009, the Fernando Namora Prize 2021 and the GQ Prize. He was a finalist for many other awards, including the European Literary Prize, the Fernando Namora Prize, the Oceanos Prize and the PEN Club Prize. His books have been published in several countries, including France, Italy, Germany, Hungary, Spain, Croatia, Serbia, Czech Republic, Mexico, Argentina, Brazil, Uruguay and Colombia.
João Tordo nasceu em Lisboa em 1975. Publicou vinte e um livros - divididos entre o romance, o policial e o ensaio - e recebeu diversos prémios, incluindo o Prémio Literário José Saramago 2009, o Prémio Fernando Namora 2021 e o Prémio GQ. Foi finalista de muitos outros prémios, incluindo o Prémio Literário Europeu, o Prémio Fernando Namora, o Prémio Oceanos e o Prémio PEN Club. Os seus livros foram publicados em diversos países, incluindo França, Itália, Alemanha, Hungria, Espanha, Croácia, Sérvia, República Checa, México, Argentina, Brasil, Uruguai, Colômbia.
“(…) a nossa inaptidão para continuar a viver a vida de todos os dias depois de certas coisas acontecerem.”
“O mais importante é libertar-me dos fantasmas, pois acarreto as sombras de todas as coisas a que não tive coragem para colocar um fim. Isso reflecte-se, sobretudo, nos meus sonhos: ao contrário da crença habitual, não me parece que os sonhos sejam o espelho dos nossos desejos; cá para mim, acho que são o espelho dos nossos horrores, dos nossos piores medos, da vida que poderíamos ter tido se, numa altura ou noutra, não fôssemos incomensuravelmente cobardes.”
“As pessoas morrem porque desistem, pensei então, e essa desistência requer uma explicação, um relatório clínico que poupe as pobres almas, que as outras vêem partir, ao martírio da ignorância, de não saberem porque cá andaram ou que destino as espera.”
“«Tens medo da solidão, porque temes toda a espécie de solidão.Olha para mim. Tenho mais de setenta anos. A solidão é uma benesse, e não um tormento.» (…) «Quando deixei este país, pouco mais velho do que tu és agora, ainda desconhecia o efeito que o mundo tem em nós. Partimos de um lugar achando que um dia voltaremos; vivemos tudo de coração aberto; e, quando damos por nós, somos incapazes de regressar.» (…) «A presença física não é prova de nada. O lugar onde vivemos é o lugar que habitamos em espírito. E, em espírito, nunca regressei. Estou espalhado pelas almas de todas as pessoas que conheci, de todas as coisas que, por lhes ter tocado, modifiquei. Irás aprender isso com o tempo. Um homem não é uma entidade, são muitas e, se não nos decidimos, a tempo certo, por umas delas, acabamos feitos em retalhos.»”
“(…) a natureza da realidade era fugidia e só se revelava nos momentos em que, distraídos de nós, permitíamos que os sentidos se sobrepusessem à razão.”
“Mais tarde, pensei se haveria, na verdade, alguma espécie de estranho engenho dentro da cabeça de um homem que o impedisse, a partir de certa altura em que já nada espera, quando aprendeu a aceitar a derrota, de conseguir reconhecer aquilo sem que lhe parecera, em tempos, que não podia viver. Ansiamos por esse momento de felicidade; ele surge como uma queda de água no meio de um deserto; e, de repente, não acreditamos nele, por estarmos tão acostumados à sua irrevogável ausência.”
“(…) mas o resto ficou a cargo de algo a que prefiro chamar destino, uma força maior do que qualquer motivação humana que possamos invocar. A certa altura das nossas vidas é conveniente acreditamos em algo semelhante – uma entidade magnânime, a tal sorte que protege os audazes -, para que a existência não se reduza à triste enfermidade do gesto humano, incapaz, por maior que seja, de rasgar o negrume em que caímos a partir do momento em que chegamos a este mundo.”
“Ao recordar esses tempos, dou-me conta de que nunca, antes ou depois, encontrei tanta paz – embora não a soubesse reconhecer – e, se é que isto serve de alguma coisa, chego à conclusão de que a paz é um estado de amnésia, uma anestesia local que provoca, não uma erosão, mas um eclipse do passado. Se o homem pudesse viver o eterno presente, seria eternamente feliz, ou coisa que o valha.”
“Uma segunda vida impossível, a mais valiosa, demasiado valiosa para ser deste mundo.”
"Dei por mim a desbobinar a história dos últimos anos da sua vida que estava, compreendi então, indissociavelmente ligada à minha, à sua família, a Camila, a Gustavo, a Nina, a Artur e à viagem que, em 1982, acabou por selar aquilo de que eu vinha suspeitando havia tanto tempo, isto é, a nossa inaptidão para continuar a viver a vida de todos os dias depois de certas coisas acontecerem." Pág. 19
Uma narrativa muito fluída, original e com suspense. Reconheço tudo isso e ainda assim fiquei algo desapontada e sinceramente nem sei bem explicar porquê. Se foi a própria história ou as personagens que me desiludiram.
A acção decorre, sobretudo, numa propriedade no Alentejo, com um homem deveras misterioso, Millhouse Pascoal, um obscuro "mentalista", que trata de forma nada convencional pacientes abastados que vivem o presente sob o peso de passados tenebrosos ou apanhados na teia de jogos políticos ficando à mercê de retaliações.
Uma história com contornos sombrios e sinistros, e não obstante, abordados de forma reducionista ou não tão contundentes quanto gostaria. Por outro lado temos as aventuras e irresponsabilidades de jovens ricos e patéticos. O jovem narrador, que supostamente deveria ser mais atinado, junta-se ao clube e, de quando em vez, também cai em exageros e actos irreflectidos.
Numa nuvem de mistério e segredos a narrativa vai evoluindo e as vidas que não são mais do que uma soma de relações de causa e consequência, acabam por ser comparadas à própria volubilidade dos funâmbulos na corda bamba. Actividade esta que Camila, neta de Millhouse, pratica apaixonadamente e que é tema durante toda a trama.
A vontade de ler outras obras do autor não esmoreceu, antes pelo contrário.
"O que foi verdade e o que é, inevitavelmente, ficcionado, devido aos limites da memória, não importa; em última análise, a própria realidade é objecto de ficção." Pág. 20
"O lugar onde vivemos é o lugar que habitamos em espírito. E em espírito, nunca regressei. Estou espalhado pelas almas de todas as pessoas que conheci, de todas as coisas que, por lhes ter tocado, modifiquei. Irás aprender isso com o tempo. Um homem não é uma entidade, são muitas e, se não nos decidimos, a tempo certo, por uma delas, acabamos feitos em retalhos."
As Três Vidas, livro vencedor do Prémio Literário José Saramago tem de tudo um pouco, uma história de amor, policial mas fundamentalmente, para mim, é a história da família Millhouse Pascal, uma família constituída por António Augusto e os seus três mimados e irreverentes netos, Gustavo, Camila e Nina. Este livro é narrado na primeira pessoa e começa com o nosso narrador, devido a um acontecimento trágico na sua família, a aceitar trabalhar no Alentejo para um senhor muito misterioso e com negócios ainda mais intrigantes. A partir daqui e através de uma narrativa fluída e empolgante viajamos desde o Alentejo, a Lisboa e por Nova Iorque em plenos anos 80 onde acompanhamos as histórias das personagens que se cruzam e culminam num final perfeito.
A cada novo livro de João Tordo que leio, mais gosto de o ler! Adoro esta sensação de pegar num livro e ser sugada para dentro dele, como se estivesse presente, a assistir ao desenrolar da história mesmo à minha frente, com pessoas de carne e osso. Sentada na primeira fila de um espectáculo digno de se assistir. Ainda que as histórias, esta em particular, sejam algo negras e claustrofóbicas, ainda que as personagens sejam sofridas e os acontecimentos trágicos.
Cada livro que leio do João Tordo é uma surpresa. Teve a capacidade de reinventar-se, experimentar e arriscar. Sendo esta uma história de amor, uma saga familiar, um mistério policial acabou por trilhar por diversos caminhos, portanto temos a sua obra mais completa a nível criativo. Um novelo que precisa de ser desenrolado pelo leitor até ao fim, envolto em mistério e peripécias entre várias cidades (Lisboa, Alentejo, Nova Iorque).
Apesar de mais uma vez nos presentear com histórias onde os homens são os protagonistas, a menina Camila é quem mais brilha neste enredo. A grande paixão do nosso narrador. Um homem com raízes humildes que aceita trabalhar para um homem excêntrico de forma a ajudar a família com as despesas. Foi sem dúvida a Camila que mais me cativou, ela e a sua forma de olhar a vida e amar a liberdade. Mas todas as personagens são interessantes, têm alguma peculiaridade que as torna próximas e profundas.
Senti o tom deste romance menos melancólico, menos dramático. Talvez seja o livro ideal para conhecer o trabalho de João Tordo, apesar do meu preferido continuar a ser O Luto de Elias Gro (preciso de ler os seguintes da trilogia). É notável a mudança do escritor, desde o Prémio José Saramago em 2009.
É um livro grande, que se lê muito bem. Somos levados para dentro das cenas, fazemos as mais diversas teorias sobre o misterioso António Pascal, o patrão do narrador. Conhecemos os seus três netos, um trio divertido e pouco vulgar. Torcemos pelo protagonista, procuramos respostas encontramos mais perguntas. As cenas marcadas pela arte do funambulismo são muito sedutoras, dão um toque mágico a todo o enredo. Consegui imaginar perfeitamente aqueles momentos, acho que são as minhas preferidas.
Não foi um livro transformador ou marcante. Foi uma leitura sem efeitos e divertida. Talvez um bocadinho extensa sem necessidade, mas agradável no seu todo. Recomendo sempre João Tordo.
(...) ao contrário da crença habitual, não me parece que os sonhos sejam o espelho dos nossos desejos; cá para mim, acho que são o espelho dos nossos horrores, dos nossos piores medos, da vida que poderíamos ter tido se, numa altura ou noutra, não fôssemos incomensuravelmente cobardes.
This is, by far, my favourite book by this author. Loved it from the very beginning, and found it hard to put it down -- all I wanted to do was read it to the very end, since it is such a mysterious and compelling story.
21/05/2017: A ler pela segunda vez, já que este é o livro a ser discutido na reunião do meu clube literário de Junho.
Tenho que confessar que parti para a releitura deste livro, quase sete anos depois da primeira vez, com um certo receio. Na altura gostei imenso, tenho-o desde então como uma referência nos livros de João Tordo; tive medo de não sentir o mesmo, de não gostar tanto como naquela altura.
Agora percebo que nunca seria igual. Quase sete anos depois, muita coisa mudou, eu já não sou a mesma pessoa que era então. Claro que a minha perspectiva em relação a este livro não poderia ser igual!
Mas uma coisa é certa: se um livro é realmente bom, então, por mais vezes que se leia, seja em que altura, a leitura será sempre boa. Podemos ver algumas coisas de forma diferente, certos detalhes podem saltar mais à vista, mas a leitura, o prazer que retiramos dela, está lá tudo. E vale sempre a pena.
Gostei muito de reler. Havia muitas coisas que já tinha esquecido, portanto acabei a ser surpreendida. Já não me lembro o que senti quando li este livro pela primeira vez, mas tenho a ideia de que me tocou muito. Da segunda vez voltou a tocar-me muito. A história tem momentos muito tristes, desesperantes mesmo, que apertam o coração. O final trouxe-me lágrimas ao olhos. E um sorriso também.
Não consigo dar menos de cinco estrelas. Nem deixar de recomendar a quem ainda não leu.
Pročitala sam da je ovo gotski roman smiješten u Portugal. Ima toga, naravno, misterij, očekivanje da se nešto jezivo ili strašno desi. Ne u velkim količinama, više kao naznake… Tu je velikо totalno izolirano imanje “Doba” iliti Quinta do tempo na kome žive tajanstveni Milhaus Paskal i njegov vrtlar Artur, a troje unučadi ga posjećuju svaki vikend koji provode van školskog internata, pa se igraju i provode, a prdružuje im se i glavni lik, narator knjge... Tu su i neki sumnjivi događaji koje glavni lik posmatra kroz prozor svoje sobe… Neobjašnjivi pacijenti ,t.j. klijenti sumnjivog ponašanja i izgleda koji posjećuju vlasnika redovno ili povrijemeno... Nestanak unuke u džungli Njujorka i potraga da bi je našli... Klasičan stil pisanja, sa dobrim opisima, rečenicama, malo napetosti i misterija, malo romantike… sve u svemu meni je bilo interesantno putovanje, posebice drugi dio knjige.
Hà algo nos romances de João Tordo que nos desconcerta, seja pelo seu ambiente melancólico ou os seus enredos misteriosos. Entramos na narrativa prontos a desvendar os labirintos e acabamos sempre perdidos. Nesta obra acompanhamos a historia do narrador que aceita trabalhar para Milhouse Pascal, em tempos espião e contra espião, e depois vê-se envolvido num conjunto de crimes e desaparecimentos. O amor do narrador por Camila, uma das netas do padrão, é um dos pontos chave para desvendar alguns dos mistérios.
Este livro fez-me perceber o porquê de João Tordo ser merecedor do prémio Saramago e do porquê de ser um escritor tão admirado. Admito que ainda não me tinha ocorrido o clique com o autor. Os livros anteriores que li acabaram por me saber a pouco e fui adiando o reencontro. Mas agora que aconteceu, valeu bem a pena.
As Três Vidas conta a história de um personagem de origens modestas e com algumas dificuldades na sua vida familiar que aceita trabalho como "arquivista", ou até como secretário, de Millhouse Pascal, um velho misterioso que vive numa mansão, no Alentejo, com três netos e um jardineiro igualmente enigmático.
Millhouse Pascal é uma espécie de herói obscuro do século XX. Relacionando-se com espionagem, guerras, segredos de passado e pessoas marcadas pela História.
O narrador, acaba por se envolver neste mundo, com alguma reserva, mas acaba por se revelar fiel e prestável.
Ele acaba por se apaixonar por Camila, uma das netas de Millhouse Pascal. Parece um ato insignificante, mas na descrição do ambiente do livro, percebemos como é impactante. Acontece que Camila desaparece depois de uma viagem a Nova Iorque. E esta situação desencadeia uma investigação pessoal do narrador, que vai a fundo puxar fios de mistério, ausências, sombras familiares e episódios históricos.
De alguma forma, as três vidas do título refletem-se nas três fases da existência do narrador: a da ilusão e da descoberta; a da desintegração; e, por último, o da maturidade, que implica o regresso à "realidade" com a soma das perdas que foi sofrendo. O reflexo de uma vida marcada por cicatrizes, memórias, aceitação e pela dificuldade de viver no mundo real com segredos.
No fim, os mistérios são esclarecidos e o narrador reconcilia-se consigo mesmo e com a sua trajetória. No entanto, senti que foi mais apressado do que desejava. Muitas camadas da história se foram acumulando e, por isso, é normal que o leitor sinta a necessidade de saborear lentamente o desvendar do mistério e o amarrar de todas as pontas, mas o autor opta por fechar relativamente rápido.
Ainda assim, o facto de sentir que o fim poderia ter sido mais desenvolvido não diminui o (muito) que me agradou: a escrita, o ambiente, a intensidade emocional, a imaginação e as personagens.
Tordo domina bem a ambiguidade, entre o que se vê e o que se intui, entre o visível e o oculto. Consegue manter ao longo da narrativa uma tensão crescente, uma sedução do mistério, assim como uma proximidade emocional à dor das personagens, e isso faz com que a leitura seja memorável.
Segundo livro do João Tordo e outro livro ao qual eu dou 5 estrelas. Tão, mas tão bom! É uma escrita tão fluida que nem nos apercebemos da quantidade de páginas que lemos. Um livro carregado de mistério e com personagens tão interessantes que se torna difícil parar de ler. O número 3 é tão importante neste livro. Eu só fiquei atento devido ao título e realmente ele está sempre presente. Recomendo este livro de olhos fechados!
O escritor conseguiu construir uma história envolta em mistério, sobretudo devido a um inusitado emprego que o protagonista aceita na Quinta do Tempo, perto de Santiago do Cacém. O autor consegue criar um ambiente de suspense e tensão e deixar o leitor ávido e intrigado por saber mais sobre o empregador (Milhouse Pascal), sobre o sucedido à sua filha Adriana, sobre as tarefas do leal jardineiro Artur e acima de tudo sobre o sucede com os visitantes recebidos, cuja gestão da base de dados é da competência do protagonista (que sempre se mantém anónimo). O desvendar do mistério sobre os visitantes vai levar-nos a uma breve incursão história pela segunda guerra mundial, pela guerra fria, por espiões e contra-espiões e pela forma química como era extraída informação altamente confidencial. É interesse como aquela revelação nos deixa a pensar se de que facto aquilo aconteceu e acontece na realidade. Se através de uma cuidada mistura de fármacos é possível extrair determinada informação de uma pessoa. Com os avanços tecnológicos que verificamos diariamente, e com a confissão de determinados pormenores por parte de terroristas, estou francamente convicta de que a resposta é afirmativa. Já algumas pessoas me tinham dito que o final desilude um pouco, em que se denota claramente que o autor não sabia o que havia de fazer à história e eu não posso deixar de concordar com isso. Achei especialmente mal engendrado a forma como se desenvolveu o encontro entre Nina e o protagonista em Londres. O autor é conhecido por leccionar cursos de escrita criativa e por ter estudado no estrangeiro essa temática. Talvez influenciada por essa informação prévia, em certos momentos achei que o autor estava a arrastar a história de forma desnecessária, que estava "a encher chouriços", contudo é importante criar determinado ambiente, nomeadamente através da descrição de alguns pontos-chave que nos encaminham para onde o autor pretende. Acho que a história de forma global é interessante, designadamente pelo suspense que cria e curiosidade que suscita. Considerei a escrita aceitável, com a transmissão de certas sensações e sentimentos de forma bastante conseguida, ao ponto de achar que para escrevê-lo o autor teve de vestir a pele do personagem ou que em alternativa, se encontram ali espelhados muitos momentos auto-biográficos. Recomendo enquanto leitura ligeira para quem gosta de suspense e mistério.
O que provam estas suas três vidas é mesmo a inconstância da vida, do mundo - como tudo está constantemente a mudar mesmo que tentemos intervir para que tudo aconteça à nossa maneira. Estamos sempre na corda bamba, entre o correcto e o errado, o passado e o presente, a consciência e a paixão, a realidade e a ficção. Às tantas o narrador confunde o que de facto aconteceu com o que acredita que aconteceu (muito 'O Sentido do Fim'!), talvez por querer prolongar a ilusão face à monotonia do dia-a-dia - do que fica no final, depois de termos tentado protagonizar o nosso papel no mundo e quando tudo parece acabar.
Nesta obra encontramos um jovem de 20 e poucos anos que vive em Lisboa e está desempregado. A história começa no início dos anos 80 quando o protagonista vai a uma entrevista de emprego sui generis. A partir daqui a história vai desenvolvendo-se a um ritmo cadenciado, mas sem nunca deixar de prender a atenção. Sensivelmente a meio o ritmo é mais corrido e os acontecimentos ocorrem em catadupa, sendo que a vida do nosso protagonista dá grandes voltas.
Como não podia deixar de ser, a escrita do João é magistral e esta é a obra com que venceu o Prémio Saramago em 2009. Embora já esteja mais que habituada, as suas histórias continuam a surpreender-me. Isto acontece mesmo tendo eu começado por livros mais recentes.
E mais uma vez, nos livros do João Tordo, encontro tudo o que preciso em termos de literatura. Escrita maravilhosa, excelentes protagonistas e histórias exímias.
Um bela história do João Tordo. Muito fácil de ler e cativante pena o final ser um pouco simplista, mas o enredo tem vários mistérios e segredos que nunca serão desvendados.
Maybe it's just me. According to blurbs attached to digital editions of this book, this book was a prize winner. It is a pleasant enough read, but hardly stands out to me. A fictional autobiography / biography / encapsulation of some mid 20th century history / love story, I found it hard to take it seriously. it is, in the final analysis, a novel, but just seems to bounce back and forth and have no plot to drive it. Since I don't like to include spoilers, I won't be specific, but there is one "cheap shot" near the end of the book that I guess is supposed to move us, but since I just didn't feel engaged by any of the characters, much less the narrator/autobiographer, it just fell flat. A QUESTION IN CASE ANYONE ELSE HAS READ THIS BOOK: in the Portuguese ebook edition, aside from the author, it says "translated by...". I found this strange. Translated from what to what? The damn book was written in Portuguese to start with. I wrote and asked about it, but was told it definitely wasn't a translation. I then email them a copy of the title page showing the name of the translator, but this time they ignored me. It is not a one time mistake. In the back of the book there is another reference to the translator. What the heck is that about? Anyway, as I said, a pleasant enough read, but otherwise a kind of pretentious attempt at writing something meaningful.
Já li muitos livros do João Tordo e devo admitir que este foi um baque no meu coração. Posso usar a palavra "baque" para descrever algo profundo, importante, positivo e ao mesmo tempo desafiante? "...a literatura foi sempre um bálsamo, um plano de fuga, presente nas alturas de maior necessidade..." Não me sentia tão próximo de uma personagem há muito tempo.
"O lugar onde vivemos é o lugar que habitamos em espírito. E em espírito, nunca regressei. Estou espalhado pelas almas de todas as pessoas que conheci, de todas as coisas que, por lhes ter tocado, modifiquei. Irás aprender isso com o tempo. Um homem não é uma entidade, são muitas e, se não nos decidimos, a tempo certo, por uma delas, acabamos feitos em retalhos."
What an unbelievable story! However, told in such a way that I couldn't stop reading it!! João Tordo's writing is so easy to read, I really want to read all of his books! And so far, this is probably my favourite one!
"(...) a natureza da realidade era fugidia e só se revelava nos momentos em que, distraídos de nós, permitíamos que os sentidos se sobrepusessem à razão."
O livro é o fim da narração que se apresenta empolgante, misteriosa, numa mistura de histórias de vida, de pormenores e personagens da história mundial, revelando a importância do tempo, da memória e do passado na vida do narrador. As três vidas que podiam ser as vidas do antes, do durante e do depois do narrador se cruzar com outras três vidas que se revelaram tão ou mais importantes que Milhouse Pascal, esse homem enigmático. Mas desse acomodar de um passado e de uma história de vida, há momentos em que o autor nos apresenta afirmações com pormenores notáveis, como aquela da aceitação da derrota (p.343, ed. 2018).
“O lugar onde vivemos é o lugar que habitamos em espírito.(...) Estou espalhado pelas almas de todas as pessoas que conheci, de todas as coisas que, por lhes ter tocado, modifiquei.”
TW: assassinato, homicídio, suicídio, ocultação de cadáver, guerra
Um jovem lisboeta, desempregado, é contratado para secretário de uma agência que opera no Alentejo. O jovem não sabe qual a actividade da empresa quando inicia funções, passando, nesta altura, a viver na quinta isolada do patrão. Aqui, vai contactar com pessoas que irão alterar o rumo da sua vida.
Este é um livro com várias histórias que se cruzam, que nos mantém sempre presos e desejosos de saber o rumo da vida de cada uma das personagens.
Adoro a escrita de João Tordo e está a tornar-se, para mim, um daqueles autores de quem quero ler tudo. De tal forma assim é que eu, que não consigo ler espionagem - é um tema que não me prende, dei por mim presa às partes de espionagem, desejosa de saber mais e com pena quando terminaram.
“O que foi verdade e o que é, inevitavelmente, ficcionado, devido aos limites da memória, não importa – em última análise, a própria realidade é objecto de ficção. O mais importante é libertar-me dos fantasmas, pois acarreto com as sombras de todas as coisas a que não tive coragem para colocar um fim. Isso reflecte-se, sobretudo, nos meus sonhos: ao contrário da crença habitual, não me parece que os sonhos sejam o espelho dos nossos desejos; cá para mim, acho que os sonhos são o espelho dos nossos horrores, dos nossos piores medos, da vida que poderíamos ter tido se, numa altura ou noutra, não fôssemos incomensuravelmente cobardes.”
Com o seu terceiro romance João Tordo vê o seu trabalho reconhecido através do Prémio Literário José Saramago, afirmando-se assim no panorama literário português através de um estilo que, apesar das evidentes influências que nele se fundem, lhe permite alcançar uma voz própria. As Três Vidas é uma obra ambiciosa, apresentando diversos enredos cruzados em que o autor consegue, com sucesso, entrelaçar a história pessoal do narrador com alguns dos principais acontecimentos da História mundial, desde intrigas políticas a crimes sangrentos, culminando na maior tragédia do séc. XXI.
“Compreendi, nesse tempo de desilusão, algumas das coisas que Milhouse Pascal me tentaria ensinar: que, preenchidas que estão as necessidades primeiras da vida, o espírito torna-se ágil e vagabundeia, lançando sobre o mundo as trevas próprias da sua condição. Ignorância é força, escrevera Orwell: quanto mais pensava sobre tudo, mais facilmente perdia aquilo em que pensava, e a matéria palpável de que é feito o mundo parecia começar a fugir-me debaixo dos pés.”
Após a morte do pai, o protagonista vê-se obrigado a preservar o bem-estar da sua família, acabando por conseguir ser admitido como arquivista de António Augusto Milhouse Pascal, homem misterioso e abastado que se refugia num casarão no Alentejo: a Quinta do Tempo. Isolado do mundo, num clima de suspense digno de um conto de Poe, vai descobrindo progressivamente o teor da actividade do seu patrão, e acaba por se apaixonar pela neta mais velha de Pascal, Camila – três vidas ligadas de forma determinante. As revelações são efectuadas num ritmo apropriado, permitindo acompanhar os dilemas pessoais do narrador enquanto vamos conhecendo alguns dos clientes de Augusto Pascal que, de alguma forma, tiveram um papel importante em certos episódios históricos. O autor consegue assim um equilíbrio importante, refrescando o interesse do leitor pela vida de cada uma das personagens sem nunca nos saturar com uma pormenorização exagerada e desnecessária.
“Tentando concentrar-me na leitura, olhava para o poster de Philippe Petit por cima da minha cama e via aquele homem desconhecido como uma figura mais real do que a gente de carne e osso, uma companhia das horas mortas que, tal como eu, procurava atravessar uma corda bamba que, a qualquer momento, ameaçava desaparecer sob os seus pés, revelando finalmente os abismos insondáveis do mundo.”
Paira ao longo de todo o romance uma sensação de incerteza, resultante da inexperiência do jovem protagonista que, envolto num processo de autodescoberta, é confrontado por uma sucessão de acontecimentos para os quais não se encontrava preparado. Impulsionado pelas circunstâncias e por um estado emocional instável, acaba por cometer actos que o irão assombrar ao longo de muitos anos. Assim, As Três Vidas representa um acto de expiação por parte do narrador que pretende exorcizar definitivamente os fantasmas do passado, sendo também um livro sobre a coragem necessária para enfrentar a imprevisibilidade inerente às nossas vidas, sobre a determinação que nos impede de cair no abismo.
“A presença física não é prova de nada. O lugar onde vivemos é o lugar que habitamos em espírito. E, em espírito, nunca regressei. Estou espalhado pelas almas de todas as pessoas que conheci, de todas as coisas que, por lhes ter tocado, modifiquei. Irás aprender isso com o tempo. Um homem não é uma entidade, são muitas e, se não nos decidimos, a tempo certo, por uma delas, acabamos feitos em retalhos.”