Em meio a uma torrente de populismo e desinformação, sete nomes da imprensa refletem sobre os desafios do jornalismo no Brasil
A partir da própria experiência e falando especialmente para o leitor que jamais esteve dentro de uma redação, Caio Túlio Costa, Cristina Tardáguila, Helena Celestino, Luciana Barreto, Marina Amaral, Merval Pereira e Pedro Bial se debruçam sobre o ofício do jornalismo, seus conceitos e formas de trabalhar, refletindo não só sobre os desafios do momento atual, mas também sobre o esforço continuado da imprensa em vencê-los.
Tempestade perfeita reúne ensaios que percorrem desde a necessidade urgente de se ampliar a representatividade na cobertura jornalística, pautada majoritariamente por homens brancos de classe média, até a reinvenção do próprio modelo de negócio, frente à concorrência dos meios digitais, com novas formas de distribuição e financiamento. Não ficam de fora temas cardeais como a liberdade de expressão; os ataques coordenados de desinformação e agressões contra jornalistas, exacerbados pela polarização e por governos populistas; o falso dilema entre neutralidade e clareza moral; a onda de relativismo disfarçado de argumentação política; e a ética e a responsabilidade inerentes ao jornalismo independente, entre outros.
Sem adulação, com olhar crítico e, principalmente, com o vigor de quem escreve diretamente do front, a coletânea compõe um recorte plural, porém com uma convicção o jornalismo profissional enfrenta uma crise econômica e existencial, mas está correndo atrás, buscando novos modelos de atuação, tentando se renovar, ciente de que é uma das instituições fundamentais da sociedade democrática. Nesta era, na qual a informação de qualidade é o valor maior, a imprensa não vai perecer. A tempestade perfeita será superada.
Vivemos nestes estranhos e desafiadores dias atuais uma situação em que a grande imprensa que já prestou tantos e tantos grandes serviços à democracia e ao Estado de Direito, a despeito de muitas e justas polêmicas, encontra-se cercada e questionada pela massificação das redes sociais e seu caótico método de difusão de informações, muitas delas para lá de mal intencionadas além de um rol de acusações, advindas de vários setores das sociedades, de que não há isenção no fazer jornalístico. Nesse inusitado contexto em que a própria democracia, que tanto precisa de um jornalismo livre e de qualidade, encontra-se em cerco e em que o discurso autoritário – quiçá totalitário – recebe um surpreendente apoio de parte significativa da sociedade brasileira (e mundial), o lançamento deste ótimo “Tempestade Perfeita” vem mesmo a calhar. Editado e organizado com muito critério pelo veterano e consagrado jornalista Roberto Feith o livro é composto por sete ensaios elaborados por nomes de prestígio no jornalismo brasileiro atual; a saber: • Cristina Tardáquila, fundadora da agência Lupa, a primeira organização especializada em fact-checking no Brasil, discorre sobre os desafios e a importância da checagem como uma forma de minimizar os efeitos nefastos das fake-news e do igualmente nefasto fenômeno da “relativização da verdade” que atormentam os dias atuais no Brasil e no mundo. Sem dúvida alguma, um dos melhores, senão o melhor, texto presente nesse livro. • Luciana Barreto, âncora da CNN Brasil e responsável pelo podcast “Entre Vozes” discorre com propriedade e precisão acerca do racismo no jornalismo (56% da população brasileira são negros segundo o IBGE mas existem apenas 22% de jornalistas negros nas redações brasileiras) e de como o jornalismo seria mais valorizado e reconhecido se fosse mais inclusivo do ponto de vista étnico. • Helena Celestino, jornalista, colaboradora do jornal Valor Econômico e ex-editora executiva de O Globo, mestra em antropologia, etnologia e ciências da religião nos apresenta um instigante e oportuno ensaio sobre a premente questão de como o jornalismo convive e interage com o movimento LGBTQIA+, com a questão dos direitos humanos e da importância do “jornalismo periférico” além da de denúncia contundente dos ataques descabidos do presidente Bolsonaro ao trabalho da imprensa. • Marina Amaral, jornalista, repórter, editora e diretora, uma das fundadoras da Agência Pública, em texto de grande fôlego, se debruça sobre várias e pertinentes questões como a significativa e algo excludente concentração da mídia no Brasil, a crise de confiança no trabalho da imprensa, a importância do jornalismo investigativo, a cruel perseguição sobre Julian Assange, uma verdadeira manifestação contemporânea do triste hábito de “matar o mensageiro” tão presente em vários momentos da história, além da luta em torno da fundação da Agência Pública e a questão de gênero nas redações. • Caio Túlio Costa, jornalista e pioneiro em comunicação digital, doutor em comunicação pela USP e um dos fundadores do UOL, é responsável pelo instigante ensaio “Politização, polarização e o futuro do jornalismo profissional”. Com bastante correção e conhecimento de causa o autor nos apresenta as crises que, segundo sua argumentação, tem que ser enfrentadas pelo jornalismo atual: a crise econômica, a crise da perda de seu papel de protagonista da informação, a crise geracional e a crise tópica de credibilidade. Ainda segundo o autor existem estudos que indicam que essa crise seria resultado do fim do “Parêntese de Gutenberg”, entre os séculos XVI e XXI e que a web e suas interações automáticas entre pessoas e grupos nos fazem retornar a um “estado pré-Gutemberg” em que as informações são veiculadas de forma a privilegiar as impressões, as opiniões e a efemeridade. É um desafio para a imprensa mostrar-se relevante, segundo o autor nesse contexto. • Pedro Bial jornalista, editor, repórter, correspondente, apresentador, diretor, roteirista, documentarista e escritor, num texto bem escrito mas inconclusivo, discorre, de forma um tanto genérica, num texto estruturado como um diálogo entre jornalistas, sobre a questão de como o jornalismo pode contribuir para fazer frente às práticas autoritárias do governo Bolsonaro. • Merval Pereira, jornalista premiado e consagrado, colunista, comentarista político, escritor e atual presidente da ABL elaborou o ensaio intitulado “Jornalismo: Ética e Responsabilidade” em que os prementes temas do importante papel do jornalismo na divulgação e análise dos fatos em todas as áreas e das ameaças tão comuns nos dias de hoje ao trabalho e à liberdade da imprensa.
De uma maneira geral as meninas saíram-se melhores do que os rapazes. Lendo os textos das bravas garotas dá para acreditar que existem muitas luzes piscando no final do macabro túnel em que o bolsonarismo ameaça nos aprisionar. Os textos das meninas são assertivos, propositivos, indicam saídas, analisam estratégias enquanto os rapazes (com a exceção de Caio Túlio Costa) apenas abordam os problemas atuais e reforçam a importância da imprensa, questões importantes sobremaneira, sem, no entanto indicar com clareza quais seriam as soluções. É lícito afirmar, por outro lado, que esse “senão” não desmerece o livro como um todo que é altamente recomendável e, como já foi dito, altamente oportuno nesses dias atuais em que querem matar a polêmica e sufocar o debate. Excelente!
Ótimo livro para qualquer um que se interesse pela área jornalística e leitura obrigatória para aqueles que pretendem trabalhar (ou trabalham) no meio. Os temas são extremamente pertinentes e os autores escolhidos contribuem de maneira significativa para o desenrolar da pauta principal.
Porém, o livro acaba se estendendo muito em alguns momentos em detrimento de certos assuntos tão importantes quanto o resto do do conteúdo desenvolvido. Por exemplo, por que o capítulo de Luciana Barreto, que aborda a falta de visibilidade negra no jornalismo, é o menor de todos? Com 13 páginas de texto, ele consegue ser menor do que a apresentação do editor Roberto Feith (20 páginas) e a “conclusão” de Merval Pereira (16 páginas) - isso quando não o comparamos a média de páginas dos outros capítulos do livro (cerca de 55 páginas). Intencional ou não, a ironia está ai para quem se atentar…
Dito isso, ainda gostei muito do produto final e, mais importante, senti que ele ornou completamente com o conteúdo abordado durante as minhas aulas na faculdade de jornalismo. Destaque especial para o capítulo de Caio Túlio Costa que, pessoalmente, foi o ponto alto do livro. (OBS: Segundo livro na saga do TCC!!!!!)
Um ótimo livro para estudantes de jornalismo (como no meu caso) e para leigos que desejam conhecer um pouco da nossa área. A cada capítulo eu ficava fascinado com alguma experiência que os autores vivenciaram ao longo de suas carreiras. Confesso que é um livro repleto de informações e que pode causar uma leitura mais cansativa, mas isso não prejudica a experiência e os aprendizados que podemos tirar da obra. Mais uma vez indico demais para quem está cursando jornalismo, pois, é importante estarmos informados sobre as crises que atingem a nossa futura profissão.
Esse livro trouxe algum conhecimento da área jornalística e é de fácil entendimento , mesmo para quem não é da área. Gostei de saber que há boas agências de jornalismo além das grandes empresas conhecidas pela maioria das pessoas. O texto do Bial foi o que menos gostei. Achei a escrita difícil e arrastada, mas insisti mesmo assim.