Não é uma madrugada como as outras, aquela em que vai nascer o primeiro filho — ou a primeira filha — de Maria Antónia e João Aurélio: é a que muitos esperavam e agora começa a tomar forma nas movimentações das tropas pelas ruas de Lisboa e do Porto. Haverá um antes e um depois desta «manhã inicial», em que nasce a criança e renasce um país de um longo período de trevas.
Mas a almejada revolução e a vinda do bebé perdem todo o significado para João Aurélio no momento em que se cumprem: Maria Antónia morre no parto, deixando o marido e companheiro de luta desolado e definitivamente distante da vida dos vivos.
Enquanto a criança é acolhida e criada pelos tios (a irmã de João Aurélio e o marido) e Portugal dá os primeiros passos numa nova existência democrática, João Aurélio, o antigo militante, o utópico, mergulha no isolamento e na loucura, na obsessão do passado e da morte.
Catarina cresce longe do pai, procurando saber quem realmente é, no que faz e se propõe fazer, com tudo o que isso implica: liberdade, incerteza, contradição, dúvida, risco. Em paralelo, a jovem vida em democracia do país procura desenvolver-se, libertando-se dos seus atavismos históricos e de um passado idealista.
Portugal, nos quarenta e cinco anos que antecederam o 25 de Abril, contado através da história familiar e política de João Aurélio; e Portugal, nos quarenta e cinco anos que se seguiram à revolução, narrado pelo percurso indagador de Catarina. Entre estas e muitas outras personagens extraordinárias — e a inerente diversidade de olhares e perspetivas, passados e presentes — se conta a história da cisão entre pai e filha e a da relação entre a «azinheira» e as suas sombras.
ÁLVARO LABORINHO LÚCIO nasceu a 1 de Dezembro de 1941, na Nazaré. Foi Juiz Conselheiro jubilado do Supremo Tribunal de Justiça e desempenhou diversos cargos na hierarquia do Estado Português, entre os quais o de Secretário de Estado da Administração Judiciária do XI Governo Constitucional (1990), Ministro da Justiça dos XI e XII Governos Constitucionais (1990-1995), Ministro da República para a Região Autónoma dos Açores (2003-2006), Deputado à Assembleia da República, Procurador-Geral Adjunto, Delegado do Procurador-Geral da República, Diretor da Escola de Polícia Judiciária e Diretor do Centro de Estudos Judiciários. Foi condecorado, pela Presidência da República, com a Grã-Cruz da Ordem de Cristo, em 2005. Faleceu a 23 de Outubro de 2025.
João Aurélio e Maria Antónia há muito que ambicionavam uma mudança política em Portugal. A mulher está grávida e, quis o acaso, dá à luz uma menina na madrugada de 25 de Abril de 1974. Catarina vinga, a mãe não. A partir desse momento, João Aurélio torna-se um desistente e vai renunciar a tudo, ao desígnio da mudança, à sua militância política ligada ao Partido Comunista Português, inclusive à própria filha, entregue à guarda de uns tios desde então. Inteligente, profundamente independente e livre, Catarina tornar-se-á uma aluna brilhante e, mais tarde, uma professora universitária estimada pelos alunos e reconhecida pelos seus pares. Mas a sua vida será sempre feita de incertezas e desassossego, pautada pela busca de respostas para o que representa para si o 25 de Abril, se a data do seu nascimento ou apenas a data de uma revolução. É esta questão, que ela interioriza ao longo da vida, que nos irá dar a imagem de um Portugal novo mas, também ele, à procura da sua identidade.
Estimulado pela aproximação dos 50 anos do 25 de Abril, Álvaro Laborinho Lúcio regressa ao convívio dos leitores com um novo livro, “As Sombras de Uma Azinheira”, no qual adopta como eixo central o fim da ditadura e a conquista da liberdade. Este é o ponto de partida para uma reflexão, em forma de romance, sobre as mudanças que a sociedade experimentou e o que significa, no presente, viver em democracia. Furtando-se ao debate político, deixando nas mãos do leitor a responsabilidade de tecer os seus próprios juízos sobre os 45 anos que antecederam o 25 Abril de 1974 e os 45 anos que lhe sucederam, o autor pede-lhe que olhe para as lutas de uma classe média comum empenhada em combater o fascismo e derrubar a ditadura e perceba de que forma a redefinição da identidade de um país se cruza com a sua própria definição enquanto parte integrante deste Portugal de Abril.
Fazendo do romance uma forma de intervenção política e cívica, Álvaro Laborinho Lúcio oferece-nos um belo livro, hábil nas considerações que tece à forma como o país evoluiu e na construção de pontes com o leitor que o possam implicar nesse processo. Entre resistentes, desistentes, lutadores, acomodados, intransigentes, descontentes ou inquietos, aqueles que atravessámos Abril ou que já nascemos em democracia somos responsáveis pelo país que ajudámos a construir. Respondendo a Álvaro Laborinho Lúcio e às questões que o livro levanta, tenho a noção de que as minhas escolhas pessoais reflectem o peso (a espessura?) da democracia e tenho (terei?) os políticos que mereço. Mas desfiz-me de mordaças, sou livre de pensar e de agir, participo na tomada de decisões, ajudo a fazer face a novas necessidades sociais e dou o meu contributo para a construção da acção colectiva, o que não é pouco se pensarmos no que tínhamos antes do 25 de Abril. Mas isto - por meu livre pensamento - sou eu a dizê-lo.
Há livros que são autênticos mo(nu)mentos. Adorei cada página, devorei cada palavra.
Uma família, uma revolução e várias gerações. É sobre isso, mas é sobre mais do que isso. É a história envolvente de um país em ebulição. Está brilhantemente escrito. Tudo o que se possa tentar dizer sobre As Sombras de Uma Azinheira será sempre parco.
“Para que precisava então eu dos heróis dos livros? Tinha ali o meu. Quieto como uma estátua, já sem ouvir o filho contar as suas aventuras, o meu avô percebia ainda que era dele que falava e esboçava para mim os últimos sorrisos. Ali estava, ele, o Espanholão. Quando fosse grande, havia de ser como ele. Não no peso das sacas e no gosto do café, mas, como dizia o meu pai, nesse maravilhoso contrabando de ideias que leva e traz o sabor inebriante da liberdade.”
Eu gostei bastante de ler esta história. De início cativante, precisei, depois, de uma leitura mais prolongada para lhe descobrir a cadência. Viajando entre personagens e tempos, gostei imenso da surpresa do intervalo. Não sei que fim esperava, mas fiquei quieta e calada, cá dentro, quando terminou o livro
A Vinte e Cinco de Abril de Mil Novecentos de Setenta e Quatro nascia Catarina. Do parto, resultou a morte de sua mãe e o desparecimento do pai. Catarina vê-se criada pelos tios procurando incessantemente um sentido para tudo o que aconteceu naquele que foi um dia muito importante para todo um país. Com uma linguagem simples, mas profunda, Álvaro Laborinho Lúcio leva-nos a acompanhar a vida de Catarina e a do seu pai, um lutador pela liberdade. Este livro provocou-me muitas reflexões acerca do amor, da morte e da loucura. Achei sublime a inclusão do "Intervalo" e fiquei com o coração aconchegado, com o último capítulo, aconselhado a ler apenas no dia seguinte. É um livro belíssimo escrito por alguém tão inspirador.
Uma boa surpresa. Terei de ler outros do autor; este foi o primeiro. É um livro sobre o 25 de abril. Sobre a identidade. Sobre a solidão. Sobre a velhice. Também sobre o Alentejo. A prosa é muitas vezes poética. As palavras estão muito bem arrumadas, fazem efeitos bonitos. Lê-se com gosto.
Este foi o primeiro livro que li de Laborinho Lúcio e a impressão geral foi positiva. Apesar disso, senti que falta genuinidade ao enredo. Parece-me, com o devido respeito, que a mensagem política se sobrepôs à consistência e persuasão da história e das personagens. Por outro lado, não achei nada interessante a constante flutuação espacial do narrador, que ora é omnisciente e exterior, ora é narrador-personagem, sem se perceber muito bem porquê e para quê.
Confesso que sempre tive curiosidade em relação ao autor e aqui atrasado ouvi uma reportagem na TSF sobre este livro e a verdade e que não me desiludiu. As reflexões das personagens sobre o 25 de abril e sobre a atualidade estão bem conseguidas e as personagens conseguem ter densidade histórica e pessoal, sem que o livro deixe de ter uma leitura leve. E só o acabei no dis seguinte 😉
Começo por admitir a extrema simpatia pelo escritor, as suas opiniões, discurso, comportamento e atividade política e social. Foi o primeiro livro que li de Álvaro Laborinho Lúcio.
Há uma ideia genial. Uma homenagem ao 25 de abril, em jeito de reflexão e não de endeusamento. Há 2 personagens e 2 tempos (45 anos antes e 45 após o 25 de abril). Uma protagonista que não distingue o 25 de abril político do 25 de abril pessoal, momento do seu nascimento. Por isto, é essencialmente uma história pela busca de identidade, pela superação de sentimentos contraditórios quanto ao seu passado, uma luta pelo perdão aos pais e uma interferência constante sobre a sua identidade.
A forma da narrativa é de facto muito boa, com particularidades que lhe dão um caráter inovador, a saber: - a alternância entre narradores na primeira e na terceira pessoa (o que, na verdade, me distraía mais do que encantava); - o “intervalo”: uma conversa com as personagens que nos remete para os bastidores do livro com escritor e suas criações, em discurso direto, em jeito de teatro? Uma pausa para respirar e dar fôlego à narrativa? - algumas passagens que me fazem lembrar um realismo mágico português, tipicamente alentejano, da altura do Estado Novo/25 de abril. - “depois do fim”, mais uma “brincadeira” do escritor, que não acredito haver alguém que só leia mesmo no dia seguinte. Mas, fiquei sem compreender o propósito dessas 2 páginas. Seria um sonho? Uma história alternativa à que acaba de ser narrada?
Há uma série de referências literárias que enriquecem o livro e, quiçá, são uma piscadela de olho aos ávidos leitores: temos Kundera com o célebre “A insustentável leveza do ser”, temos a personagem de Ivan Illitch de Tolstoi, Hamlet e até clássicos gregos.
Dito isto, há alguns detalhes e pequenos traços da história que a tornam aos meus olhos muito pouco verosímil: - O pai falar com mortos e viver no jazigo; - Catarina, aos 30 anos, ir para casa de um desconhecido José Carlos Ferreira Bastos (engenheiro de minas, contacto da ex-namorada da faculdade Marta - sem também sem perceber como Marta chegou a José Carlos). Uma ligação pelo simples facto de terem nascido no mesmo dia? E José Carlos apaixona-se perdidamente por Catarina, dizendo-a a mulher da sua vida? - Uma tendência, a meu ver excessiva, de relações amorosas com uma disparidade enorme de idades.
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(PT) A 25 de abril de 1974, um homem perdeu a sua mulher e rejeitou a sua filha recém-nascida. Ele era um militante comunista na clandestinidade, mais a sua mulher, mas em vez de regozijar com a liberdade alcançada, decide afastar-se do mundo e ir para o seu Alentejo natal.
Com o passar dos anos, Catarina cresce e torna-se professora, chegando à idade adulta sabendo quem é, mas com a dúvida a pairar sobre ela: porque é que o seu pai virou-lhe as costas? Entretanto, ele, na sua aldeia natal, pensa sobre o seu pai, sobre o Alentejo desse tempo onde falar era perigoso, não entendendo que o mundo, lá fora, avançou.
O livro é interessante. São duas histórias paralelas, pai e filha, onde contam as suas vidas, como chegaram até lá, e é contado de uma maneira interessante. Há ali certas situações, que, penso eu, são um pouco supérfluas, mas creio que o autor poderia achar que seria interessante para contar, mesmo em termos históricos, mas, não querendo dar "spoiler", acho que estraga um pouco a história. O final é súbito e tem cara de ser precipitado - acontece tudo num capítulo - e sinceramente, esperava melhor.
Mas isso não impede de afirmar que este livro é bom, sobre um tempo que aconteceu e o que causa nas personagens.
É uma história muito bonita, com um cunho político forte mas nunca aborrecida, até mesmo para quem, como eu, não aprecia romances de época. Tem observações pertinentes sobre o luto e a morte (até em vida!), o stress pós-traumático, a demência e o amor. Surgem ainda alguns recursos interessantes, como o "Intervalo" que separa as duas partes do livro, no qual as personagens conversam com o autor. Já outros não me seduziram tanto, como a alternância do tipo de narrador várias vezes no mesmo capítulo. Ainda assim, foi uma leitura tocante e que me despertou curiosidade pela restante obra de Álvaro Laborinho Lúcio.
Gostei muito desta incursão. Gostei da história, da estrutura narrativa a diferentes vozes, com diversos pontos de vista. Claro que gostei imenso das referências literárias e culturais e tudo isto sem forçar, i.e, sem debitar conhecimento. A história de Catarina faz sentido, é consistente mas também a do pai dela. Todas as personagens têm as suas "razões" de agir como agem. São tantas as temáticas afloradas! Tecnicamente, achei piada ao "intervalo" , já ao "Ler no dia seguinte", que segui entrando no jogo,... Preferi os agradecimentos. Recomendo.
Comprei este livro na feira do livro e tive o prazer de conhecer o escritor Álvaro Laborinho Lúcio numa sessão de autógrafos. Pessoa muito querida e simpática. Não vou mentir que demorei algum tempo a terminar a leitura; acredito que não estava com o mindset certo. Mas achei curioso a mudança constante no tempo da narrativa e o amor que se sentia sempre que o 25 de Abril era mencionado. Não imaginava nenhum final em concreto mas quando terminei fiquei quieta e sem reação.
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Na realidade, é um 2,5* Talvez tenha sido eu que não esteja com o espírito adequado, mas custou me imenso acabar de ler este livro... Também fiquei desiludida com a revisão do texto, a personagem Virgolino, às vezes, passa a ter o nome Vitorino 😕
Gostei bastante, uma bela história com cheiros e imagens que me levaram ao belo Alentejo. Coincidência ou não, acabei de o ler no vinte e cinco de Abril
Este livro além de falar na revolução, fala também da perda, do amor e do sentido da nossa existência ao longo da vida. Escrita e história enriquecedoras!