O próprio Caio Fernando Abreu definiu este livro como sua obra mais atípica. "Não o escrevi, fui escrito por ele."
O Trinângulo é formando pelas três novelas que contém esse livro, publicadas originalmente em 1983 e revistas pelo autor em 1991. Nele, o leitor encontrará um retrato desesperado da contemporaneidade, repleto de imagens sensoriais, descritas com uma linguagem lírica e poderosa.
O livro foi escrito no Rio de Janeiro, mas o cenário dos contos vai desde a noite gay de São Paulo, até um pequeno sobrado numa ruazinha calma. Ambientação à parte, o tema central de todos eles é a solidão dos personagens, que, ao mesmo tempo, anseiam e repelem uma relação mais humana e profunda com outras pessoas.
Caio Fernando Loureiro de Abreu nasceu no dia 12 de setembro de 1948, em Santiago, no Rio Grande do Sul. Jovem ainda mudou-se para Porto Alegre onde publicou seus primeiros contos. Cursou Letras na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, depois Artes Dramáticas, mas abandonou ambos para dedicar-se ao trabalho jornalístico no Centro e Sul do país, em revistas como Pop, Nova, Veja e Manchete, foi editor de Leia Livros e colaborou nos jornais Correio do Povo, Zero Hora, O Estado de São Paulo e Folha de São Paulo.
No ano de 1968 — em plena ditadura militar — foi perseguido pelo DOPS (Departamento de Ordem Política e Social), tendo se refugiado no sítio da escritora e amiga Hilda Hilst, na periferia de Campinas, São Paulo.
Considerado um dos principais contistas do Brasil, sua ficção se desenvolveu acima dos convencionalismos de qualquer ordem, evidenciando uma temática própria, juntamente com uma linguagem fora dos padrões normais.
Em 1973, querendo deixar tudo para trás, viajou para a Europa. Primeiro andou pela Espanha, transferiu-se para Estocolmo, depois Amsterdã, Londres — onde escreveu Ovelhas Negras — e Paris. Retornou a Porto Alegre em fins de 1974, sem parecer caber mais na rotina do Brasil dos militares: tinha os cabelos pintados de vermelho, usava brincos imensos nas duas orelhas e se vestia com batas de veludo cobertas de pequenos espelhos. Assim andava calmamente pela Rua da Praia, centro nervoso da capital gaúcha.
Em 1983 transferiu-se para o Rio de Janeiro e em 1985 passou a residir novamente em São Paulo. Volta à França em 1994, a convite da Casa dos Escritores Estrangeiros. Lá escreveu Bien Loin de Marienbad.
Ao saber-se portador do vírus da AIDS, em setembro de 1994, Caio Fernando Abreu retorna a Porto Alegre, onde volta a viver com seus pais. Põe-se a cuidar de roseiras, encontrando um sentido mais delicado para a vida. Foi internado no Hospital Menino Deus, onde posteriormente veio à falecer.
"As cidades grandes como esta têm dessas coisas — você não precisa simular interesse algum pelas pessoas em volta, elas não exigem mais que um bom-dia, boa-tarde, boa-noite, às vezes nem isso, silêncio nas horas em que se costuma fazer silêncio, ruído nas horas em que usualmente se faz ruído."
Só uns pensamentos rápidos:
Triângulo das águas rendeu a Caio Fernando Abreu seu primeiro prêmio Jabuti. Os outros dois viriam em 1989 e 1996, com Os dragões não conhecem o paraíso e Ovelhas negras.
Considero Caio F. um autor mais relevante do que nunca. Não só pelos seus livros, mas por ser símbolo de uma época em que era possível ser um escritor "de verdade". E por verdade quero dizer poder falar o que se pensa, encarar de peito aberto o ofício da escrita, mostrar seu lado mágico mas também o lado desgastante, não se fingir acima do bem e do mal quando se mergulha na loucura complexa que é a construção da própria arte... É uma diferença gritante do nosso tempo atual (2024) em que toda fala é editada para não atrapalhar as vendas, todo sorriso é ensaiado para as redes sociais, pisca-se os olhinhos para atrair leitores, fala-se de escrita com desconto de 10% para quem assinar a próxima oficina, e tudo parece fadado a virar uma grande performance de virtude...
Há um pouco desses bastidores de Caio F. no posfácio do livro, um aperitivo para se saber mais a respeito do autor, muito disso extraído do contato que ele tinha com outros autores e amigos.
Sobre o livro em si, é dividido em três noveletas, ou três noturnos, unidos pelo elemento água. O que me atrai na obra do autor é que seus personagens sonham, falham, suam, sentem tesão, sentem culpa, gozam, fumam, bebem, cheiram, se contradizem, viram a noite na balada, odeiam balada, rezam, punem-se e amam-se das mais variadas formas. Nenhum deles performa virtude. Só quando o teatro das virtudes faz parte da construção do personagem.
Tive certa dificuldade para me conectar com a novela do meio por conta do seu tom mais onírico (justo eu que gosto de histórias oníricas), mas achei a primeira uma ótima abertura (tem um quê de Anjo Exterminador, do Buñuel), e a última um baita de um encerramento (dois personagens gays enfrentando-se em dilemas afetivos e sexuais). Li como se fossem meio literatura, meio uma peça de teatro se desenrolando diante dos meus olhos.
Se você nunca leu Caio Fernando Abreu recomendo começar por Morangos mofados (textos curtos) ou Onde andará Dulce Veiga (romance). Se você já conhece o autor, Triângulo das águas será um belo passeio.
Gostei de ter lido, e do livro ser uma homenagem aos signos de água, um momento de entrar no mundo dessas diferentes águas. É um livro complexo, fala de sentimentos, sufocados e incompreendidos, o que é mais complexo ainda, das barreiras da superação e aceitação dos fins, das memórias, de saudades sufocadas.
São três contos. Cada um dedicado a um signo de água.
O primeiro, “Dodecaedro”, são doze pessoas diferentes que estão em uma casa e foram avisadas de um eminente perigo, e cada uma toma uma medida diante dessa situação pavorosa de um possível fim. De antemão, nos é dado a percepção de cada um antes de sua ação. É confuso e vulnerável, porque possui essa unicidade, mas também é seguro por causa da unicidade.
“O Marinheiro”, que é o segundo conto, é de fácil identificação. Há traços de um amor que chega ao fim, misturado com a paralisia diante de um novo movimento, da dificuldade de seguir depois de uma tempestade. E é muito simbólica a coragem do personagem de, em uma noite chuvosa, abrir-se a um marinheiro que o diz para seguir adiante. Eu fiquei bem emocionada no começo desse conto.
Por último, “Pela Noite”. Gira entorno de memórias e os sentimentos dessas memórias refletidos no presente. Melancolia. Saudade. Vontade de voltar para casa e, principalmente, pra memória afetiva dessa casa. É um conto mais visual, te dá mais ferramentas para imaginar os lugares, cheiros, vozes, sons. São duas pessoas que protegem, de forma diferente, os seus sentimentos. Dois caranguejos.
és o meu oposto, mas se por amor confundes e libertas o caos de tudo e de todos, por amor tento tocar mais fundo procurando um voo que não conseguiria jamais num amor menor.
o marinheiro 3,5/5
pensando nisso, poderia quem sabe me sentir mais inteiro, como se a medida que fosse me apropriando de cada peça da casa, uma por uma, como quem finca uma bandeira em território novo, me tornasse também dono de novos territórios de mim mesmo, mas não sei se saberia o que fazer com essa inteireza, possivelmente não me sentiria mais feliz com isso
parado ali no chão, eu sentia que dentro de mim alguma coisa nova estava nascendo. ou pressagiava o que viria também de fora e seria completo, pois são completas as coisas quando acontecem depois de anunciadas por dentro, criando um estado capaz de receber o que virá de fora.
abraça tua loucura antes que seja tarde demais
pela noite 5/5
o erro? eu dizia, pois é o erro. eu penso, se o erro não foi de dentro, mas de fora? se o erro não foi seu mas da coisa? se foi ela quem não soube estar pronta? que não captou, que não conseguiu captar essa hora exata, perfeita de estar pronta. porque assim como o movimento de apanhar deve ser perfeito, deve ser perfeito também a falta de movimento, a aparente falta de movimento do que se deixa apanhar. você me entende? eu penso também, e se houve alguma interferência no. no em volta dos dois, no ar. no astral, eu penso também. uma coisa de Deus, do invisível, do mistério. que embora pareça errada ao não te deixar apanhar o prometido, no entanto está absolutamente certa. porque é assim que é. naturalmente. as coisas sempre prestes a serem apanhadas. e você eternamente prestes a apanha-las. como uma sina. sempre prestes.
dois latino-americanos virando a noite pelo avesso da noite na noite da maior cidade da américa do sul. cantarolou, desafinado: -vivemos na melhor cidade da américa do sul da américa do sul baby baby há quanto tempo?
essa obsessão urbanóide de aliviar a neurose a qualquer preço nos fins de semana, pode? tenho vontade de dizer nada, não vou fazer absolutamente nada. só talvez mais tarde, se estiver de saco muito cheio, tentar o suicidio com uma-dose-excessiva-de-barbitúricos, uma navalha, um bom botijão de gás ou algo assim.
desejo o pior pra eles todos. a lepra, o câncer na pele. merda, continuo histérico. eu não devia sentir tanto ódio. mas nunca, porra, nunca ninguém. ai que lamentável orgia de autocomiseração
as vezes da uma distancia. eu penso coisas banais, eu sinto coisas banais. mas tão nítidas
Caio é um autor pra pessoas sem preconceito. As vezes assusta, as vezes surpreende. E no meio de tudo isso, muitas vezes sacode a gente. Esse livro traz um pouco de cada. Não é dos melhores, mas não deixa de ser bom. E como todos os outros, ainda precisarei reler tudo.
Pensando muito na Ana C., peguei pra ler esse livro que o Caio escreveu inspirado nela — ou, segundo ele, "livro que escreveu ele.) De início, acidez abstrata que não chega a lugar nenhum, mas é um tanto prazerosa de acompanhar. ATÉ A ÚLTIMA NOVELA/CONTO: 'PELA NOITE'. !!!!@!!!!)@((#! background de um (dos dois) personagens: quase noivo dessa moça linda traços de estrela de cinema. Um dia, enquanto lê PERTO DO CORAÇÃO SELVAGEM, é abordado por esse cara que começa a fazer várias perguntas de cunho literário. Os dois começam a conversar sobre livros, autores, referências, etc. (o segundo rapaz, o destruidor de lares, embarca em um sem fim “SE VOCÊ GOSTA DE CLARICE, VAI AMAR ESSE OUTRO LIVRO.”) começam a sentir coisas nunca antes sentidas além de linhas dentro de uma página, não sabem transmitir isso fisicamente, não entendem a engenharia do toque, mas essa forma de amor engana ser a mais genuína.
"E se realmente gostarem? Se o toque do outro de repente for bom? Bom, a palavra é essa. Se o outro for bom para você. Se te der vontade de viver. Se o cheiro de suor do outro também for bom. Se todos os cheiros do corpo do outro forem bons. O pé, no fim do dia. A boca, de manhã cedo. Bons, normais, comuns. Coisa de gente. Cheiros íntimos, secretos. (...) E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor? Quando você chega no mais íntimo."
Depois de já viúvo, ele vive (com o outro personagem) esse romance de uma noite estilo trilogia before but make it depressed hopeless gay. (E é esse o enredo da novela.). Muita, muita conversa. Quase só diálogo (e um pouco de pensamentos dispersos + sensações fruto de muito álcool). Do início ao fim, só babado. Todas as coisas incomunicáveis sobre a futilidade das relações humanas e o sem futuro jogo da construção pessoal (e a nojeira da existência também) são construídas da maneira mais real e cotidiana possível. E tem o fechamento PERFEITO. primeiro uma facada, depois um abraço.
Dez ou onze depois, cá estou, relendo esse livro. E, por mais escritor favorito que seja, não consigo dar 5 estrelas por motivos de: Dodecaedro. Fragmentada demais, homérica demais, essa novela não me desce. Chegue a ser confusa em demasiado em certas partes. Mas a alegoria por trás da ditadura, da repressão, ficou TÃO mais clara agora. (Fazer letras realmente profissionalizou minha leitura). Enfim, Por mais bem feita e iluminada que seja "O Marinheiro", "Pela Noite" é certamente o ponto alto. Me vejo meio Pérsio meio Santiago agora, lendo-a. Me vejo doido pra escrever coisas parecidissimas, com a vibe vida noturna Paulista. Mas, para além disso, é de se tirar o chapéu a Linguagem do Caio: é precisa, é bonita e melancólica simultaneamente e na mesma proporção, é poética e recitavel, é tudo de mais belo que existe. Derramamento é a palavra da vez, e é isso que esse livro é: um derramamento. De sensações, de odores e sabores, de angústias cinzentas, esperanças azuis e amores amanhecidos. Isso é Caio Fernando Abreu todinho, da primeira à última, em cada vírgula e adjetivo excessivo. E eu também sou: Caio Fernando Abreu todinho.
A narrativa que o Caio constrói durante os três contos desse livro são como boiar em três espaços diferentes.
"Dodecaedro" é como boiar no mar. Não importa o quanto você tente, sempre vai vir uma onda pra te fazer afundar quando você menos espera. É sempre uma surpresa, vem do nada e te deixa ensopado, quase um êxtase.
"O marinheiro" é boiar num rio. A correnteza te leva cada vez mais longe e quando você decide parar já nem sabe mais onde está, só sabe que ela te levou longe demais mesmo durante o relaxamento.
"Pela Noite" é boiar na piscina. É só boiar no raso, tudo segue ali e talvez a memória não guarde isso em momento algum.
A mistura dos três faz com que esse seja um livro bom, não tão memorável quanto imaginei que seria, mas melhor do que muita coisa que já li. É a escrita de Caio que o torna especial e interessante. Suas angústias, suas vivências, seu tesão, tudo isso constrói um livro que te dá ânsia de terminar mesmo que você esteja confuso a respeito disso. Abreu torna até o mais banal interessante, e a maior parte desse livro é a prova disso.
caio fernando abreu, onde quer que você esteja, sinta todo meu amor e um carinhoso beijo em sua testa. esse livro, estes 3 contos, realmente mudaram minha vida. você mudou minha vida.
sigo com o grande projeto de reencontrar caio. como em todo começo de inverno, mais uma vez nesse ano, lembrei de Pela Noite, a novela mais longa do triângulo das águas e a que ao longo do tempo mais se fez presente em minha lembrança. a diferença é que nas outras vezes que lembrei desse texto, reli trechos dele ou ele inteiro, mas nunca havia revisitado todo o livro (com suas três novelas para os três signos de água). nesse ano resolvi reler tudo. caio não perdeu sua força para mim, pelo contrário, algumas imagens que eram turvas quando li na adolescência agora se mostraram mais claras. O Marinheiro, conto do meio do livro, do qual nem gostava tanto quando li pela primeira vez, que simboliza o signo de escorpião, dessa vez me atingiu em cheio. acho que só o tempo me deu a chave para compreender e me colocar nessa história - a perda, reencontro, espera, desmemória do Outro que amamos é algo que não tem explicação fora do viver, e eu ainda não tinha vivido. Dodeaceadro é a novela que, agora, me parece mais distante de mim. gosto muito dela e de sua desordenada loucura e da sua polifonia (a voz dos 12 e a 13 voz que é do autor também), mas me sinto mais próximo dos outros textos. Pela Noite (de câncer, minha lua) nunca deixou de ser meu conto favorito de caio. me sinto nele, tanto em Pérsio como Santiago, os dois que varam a noite da cidade grande a procura de tudo e de nada e de um ao outro. gosto de perceber como evolui a relação com esses dois que tenho, o tanto que Pérsio me parece mais irritante com o passar do tempo e o tanto que Santiago passa a fazer mais sentido com suas longas pausas e seu silêncio para quase tudo. fica sempre (sempre) comigo essa passagem, acho que já está constitui parte do meu ser, ela me volta toda vez que sinto o desamparo da grande cidade ou a saudade de algo que não pode mais ser:
- Eu sei, mas dá. Às vezes dá uma distância. Eu penso coisas banais, eu sinto coisas banais. Mas tão nítidas. Quando estou dando aula, quando digo a eles para copiarem ou fazerem qualquer coisa em silêncio, fico olhando aquela porção de cabeças baixas e pensando que tem um abismo entre a gente. Um abismo de tempo, de história. Que as coisas andaram muito rápidas. Que eles não têm tempo. Que tudo acabou. E eu sinto pena, então. Como os velhos, os bem velhos, devem ter pena dos moços. Que a gente tem a cabeça cheia de versos e filmes e livros e histórias e memórias que para eles já não têm nada a ver. Peças de museu, nossas emoções. Todas as emoções. - Pior para eles. - Ou para nós, que estamos ficando velhos? Pérsio fez uma mudança rápida: - Velhos? Imagina, eu não. Por favor, me exclua desse seu grilo. Estou na flor da idade. Na força da juventude. Mal comecei, mal comecei a me desembaraçar de toda a culpa. Quero mais, quero o que ainda não veio. - Mas tantas memórias. A gente tem tantas memórias. Eu fico pensando se o mais difícil no tempo que passa não será exatamente isso. O acúmulo de memórias, a montanha de lembranças que você vai juntando por dentro. De repente o presente, qualquer coisa presente. Uma rua, por exemplo. Há pouco, quando você passou perto de Pinheiros eu olhei e pensei: eu já morei ali com o Beto. E a rua não é mais a mesma, demoliram o edifício. As ruas vão mudando, os edifícios vão sendo destruídos. Mas continuam inteiros dentro de você. Chega um tempo, eu acho, que você vai olhar em volta sem conseguir reconhecer nada.
A resenha não é minha, mas de Vandré Abreu, postada no seu blog, em novembro de 2007. Gostei muito e decidi reproduzí-la aqui: "Acabo sempre fazendo coisas para não gritar, como contar esta história". É assim que Caio Fernando Abreu gostaria que seu livro fosse lido: como um murmúrio, suspiro ou gemido. E assim ele o fez. Triângulo das Águas (Prêmio Jabuti - 1984) é uma reunião de três novelas que se equivalem, mas não se relacionam diretamente. O livro se apresenta com uma narrativa surpreendente e inovadora que acomete o leitor a perceber o quanto o ser humano pode ser mesquinho e solidário dentro de um mesmo universo e que suas atitudes ou desesperos são efetivadas através de pensamentos consistentes que apenas esperam o momento para se transformarem em atos. De um modo geral, Caio Fernando Abreu instiga os defeitos e as dúvidas dos seres humanos ao colocá-los de frente com suas adversidades e faz com que todas as restrições morais e éticas sejam desgatadas e fomentadas pelos pensamentos egoístas e próprios de cada pessoa. Seja o medo, em Dodecaedro, ou a solidão em O Marinheiro, ou até o medo da solidão em Pela noite, Caio mostra como o individúo se equivale perante suas adversidades e inconstâncias e que a racionalidade se perde quando a razão é a própria existência. A primeira novela conta história de um grupo de conhecidos que se estabelecem em uma casa e tudo vai bem até que o medo geral ocorre e todos passam a exercerem seus pensamentos e darem voz às suas ignorâncias. Já na segunda história, a solidão do personagem é mostrada através de uma escrita misteriosa, de difícil acesso que nos faz sentir também sozinhos, sem saber até onde vai a realidade e onde começa as idéias. Na terceira novela o encontro dos personagens nos revela o medo da solidão de ambos e a busca em agradar a sociedade mesmo na tentativa de rebeldia para a busca de uma felicidade falsa, mas necessária. Caio Fernando Abreu demonstra sua genialidade em todas as páginas de Triângulo das águas, juntando seus aspectos temáticos com sua criatividade narrativa, propondo uma reunião de histórias que se encontram sem se tocarem, cada uma com seu curso, como rios diferentes, compostos pela mesma substância, mas também apresentada de forma e cor distinta.