Since its first appearance in Brazil in 1949, Victor Nunes Leal's Coronelismo, Enxada e Voto, here entitled Coronelismo: the Municipality and Representative Government in Brazil, has come to be recognized as a classic analysis of the system that emerges from 'the superimposition of structural forms evolved through the representative process on an inadequate social and economic structure'. The text is here published without any substantial change or addition, according to the author's wish. His insights and approach remain as suggestive as when they first appeared; as Barbosa Lima Sobrinho pointed out in the preface to the second Brazilian edition, the work is not only the analysis of a structure, but the record of that structure and of the arguments about it at a certain time, a record important in itself. Its place in the development of political analysis in Brazil is set out in Alberto Venancio Filho's introduction: 'a divide in the history of political science in Brazil... the first landmark of the study of politics in our Universities'. The work is recognized everywhere as an essential text for the student of that country.
1. Bom destacar que era uma tese de doutorado que virou livro. E isso é importante, pois ele pode parecer muito técnico para muitos;
2. Muito bem escrito e com ótimo raciocínio lógico e argumentativo (por ser uma tese);
3. Apesar de parecer, e ter um semblante de atualidade, o livro atende mais a historiadores/acadêmicos que ao público generalista [minha opinião];
4. Sim, é incrível como o sistema de 'coronelismo' do início do século passado descrito pelo autor lembra nossa realidade atual. Mas cuidado para não simplificar excessivamente esse raciocínio. Como o autor mesmo diz em suas considerações finais: "conquanto suas consequências se projetem sobre toda a vida política do país, o “coronelismo” atua no reduzido cenário do governo local. Seu habitat são os municípios do interior, o que equivale a dizer os municípios rurais, ou predominantemente rurais; sua vitalidade é inversamente proporcional ao desenvolvimento das atividades urbanas, como sejam o comércio e a indústria. Consequentemente, o isolamento é fator importante na formação e manutenção do fenômeno." => Assim, por mais que muito do que foi descrito aplica-se atualmente, a expansão das cidades e grupos industriais alteraram a dinâmica política.
5. Aos interessados em geral no assunto, penso que, dos 6 capítulos, somente o primeiro será mais útil: "1. Indicações sobre a estrutura e o processo do “coronelismo”".
Este é um caso típico em que o título comercial acaba gerando uma distorção na interpretação da obra. "Coronelismo, enxada e voto" faz pouco justiça a um livro que trata do declínio do poderio pessoal de coronéis, têm pouca referência ao trabalho rural e trata de política eleitoral em apenas um dos capítulos.
O diabo, como de hábito, está nos detalhes. Com efeito, o subtítulo é muito mais revelador o município e o regime representativo brasileiro. O livro trata, assim, da relação entre federalismo e democracia representativa. Nunes Leal oferece uma explicação para um fenômeno recorrente nas eleições brasileiras: a existência de um voto consistentemente governista em municípios rurais brasileiros. Segundo o autor, a evolução do pacto federalista brasileiro foi feita às custas do município, redundando em um sistema em que o município dispõe de limitada autonomia e parcas receitas para responder por suas atribuições. Na ausência do poder público, manifesta-se o privado. Dessa forma, o coronel - figura criada pela elevadíssima desigualdade fundiária no campo - torna-se árbitro e benfeitor das massas de famílias pobres que gravitam a grande propriedade. Mas para assumir as funções do poder público na esfera privada, o coronel precisa contar com a ajuda da situação estadual. Manter seu poder pessoal significa, portanto, governismo irrestrito. Gera-se, assim, um mecanismo que, acima de tudo, conserva a ordem. O município se mantém atrofiado como entidade política, o Coronel mantém seu poder pessoal e o governo estadual mantém-se controlado por oligarquias. Possível solução encontra-se apenas na reversão das condições materiais que geraram esse estado de coisas (leia-se: latifúndio)
Quanto dessas reflexões são atuais? Bom, o país hoje se modernizou, mas, como nos lembra Nunes Leal, é sempre possível ver o passado do país no interior. E este passado está, infelizmente, bem vivo.
Esperava um pouquinho mais de casos ilustrando a situação da época. De qualquer maneira um relato consistente da política brasileira em meados de 30, com todo caminho que levou ao ápice do coronelismo. Impressionante a parte que trata sobre as restrições orçamentárias dos municípios e como isso refletia imensamente no poder político local, com o paralelo óbvio de hoje em dia, ainda que em outra esfera.
Victor Nunes Leal examina as características sociopolíticas que definiram os municípios no período da primeira republica Brasileira, destrinchando a legislatura proveniente da estrutura de governo que desde o período do Império incentivou a presença dos “chefes” na relação Município-Estado-União. Na República Velha, tais figuras se faziam presentes na figura do Coronel.
Este livro, originalmente intencionado como tese de concurso por Nunes Leal, trouxe consigo algumas inovações no meio das publicações de ciências humanas nacionais, entre elas uma linguagem mais acessível e um aprofundamento interpretativo de legislação, que era raro até então.
O coronelismo foi uma estrutura política que se fez possível graças às condições carentes das regiões rurais do Brasil, existentes em condições de atraso desde a fundação do país. Para manter um alto grau de controle sobre estas localidades, os políticos governamentais se viam obrigados a contar com os “chefes” destas áreas, que em troca de apoio se encarregariam de gerar os votos apropriados para aqueles que os auxiliassem nas esferas superiores. No período da República Velha, os chefes eram os fazendeiros e outros tipos de senhores destas áreas, que apesar de não serem militares de carreira, compravam o título de coronel. Seu relacionamento com os trabalhadores do campo era de suma importância na geração de votos na chamada “política de governadores” que se solidificou durante a presidência de Campos Salles (quarto presidente da república, nos anos de 1898-1902).
Haviam mudanças de lado sem qualquer ideologia, baseadas totalmente no conhecimento pessoal, no patrimonialismo, e outros fatores de interesses que não são cabíveis em uma política justa, com base na máxima de que “a única vergonha na política é perder”. O sistema de reciprocidade era mantido graças à uma fraqueza quase forçada no âmbito municipal, com uma constante troca de favores em prol de manter o eleitorado, ocorrendo um aumento ou diminuição do poder de influência e autonomia municipal de acordo com o interesse dos outros poderes em cada período de votações.
A centralização do poder no Estado prolongou a escravatura no Império, pois se houvesse autonomia acentuada nas províncias o trabalho livre teria espaço para florescer. Dessa forma, princípios humanitários eram deixados de lado para que se salvaguardasse a unidade do país e da economia nos anos revoltosos. A fraqueza provinciana, mantida nas décadas iniciais da república na forma dos municípios, era preservada com intenções similares de conservar o controle estatal sobre a organização governamental. Observou-se assim a distribuição desigual de impostos e o âmbito municipal sendo totalmente ignorado nas discussões constitucionais, com boa parte ficando em estado de abandono e miséria orçamentária. Na história do Brasil, continuamente as reformas de teor humano e social são postergadas em prol de uma ficção de pátria que não prioriza o bem-estar da população, mas sim da máquina política, com um foco extremado na União em detrimento da autonomia de suas unidades.
O coronelismo levou a grandes fraudes eleitorais por anos a fio, só vindo a ser reduzidas com a perda da relevância da região rural ante às áreas urbanas, e aos esforços daqueles que enxergavam a problemática e se posicionavam contra ela. Entretanto, os municípios ainda continuariam a sofrer com mazelas consequentes desta estrutura.
O conjunto da obra e a metodologia são admiráveis. No entanto, o título é um pouco enganoso: fala-se pouco da estrutura do coronelismo em si, produzindo-se quase nenhum exemplo do sistema, nem das complexidades de logística local do funcionamento deste. O que a obra faz com maestria é apresentar um retrato abrangente e detalhado das circunstancias legais do período, com listagem dos artigos legais que buscavam diminuir ou aumentar as condições sociais dos municípios. A exposição de tal cenário é relevante para que se entenda o fenômeno do Coronelismo – entretanto, o fenômeno em si fica esquecido depois da parte introdutória do estudo, e o miolo da obra é um parecer da letra da lei nas décadas abordadas pelo texto que, apesar de detalhado e cronologicamente adequado, é exaustivo, mais adequado para consulta que para uma leitura propriamente literária. É de suma importância que exista esse registro. Mas é difícil de discordar de que o título original intencionado por Nunes Leal, “O município e o regime representativo no Brasil: contribuição ao estudo do coronelismo”, era muito mais condizente com o material final.
Obra fantástica. Alguns livros têm o poder de conseguir resumir as fundações de uma sociedade, e esse é um deles. Sem dúvidas é um livro que eu colocaria como leitura obrigatória de um curso de História do Brasil. É um livro velho (1948), mas extremamente bem feito.
O livro faz, de forma maestral, uma explicação muito didática dos aspectos mais importantes do funcionamento das instituições brasileiras, especialmente para o período que vai do final do século XIX e início do XX. Mas situando-as de forma muito intelectualmente honesta e científica no panorama que vai desde 1500. Captura a coluna vertebral da estrutura socio-economico-política brasileira nos primeiros 450 anos: uma economia composta de uma agricultura de subsistência pobre, associada a um latifúndio mais rico e um setor de serviços públicos e privados fracos. O resultado é uma estrutura social onde a maioria da população depende dos latifundiários para ter acesso a recursos, gerando uma realidade de dependência que se traduz em uma política onde essa minoria controla os votos, já que são os únicos que conseguem entrar em contato com os eleitores. Entretanto, com a urbanização e o avanço da tecnologia de comunicação, essa dinâmica vai se enfraquecendo, pela diminuição da dependência econômica e pela possibilidade dos movimentos políticos se comunicarem diretamente com o eleitor, contornando o coronel.
O livro é essencial pra se entender que o coronelismo é muito mais do que fraude. Na verdade, a fraude era o menor aspecto da Primeira República, o principal era o controle dos votos pelos latifundiários por meio da dependência econômica.
A única correção que faria é ao capítulo sobre a legislação eleitoral. É extremamente confuso, mesmo pra mim, que tenho experiência no tema. Ele fala coisas como “dois turnos simultâneos” e não explica o que isso é. Como assim dois turnos ao mesmo tempo? Como isso acontece? Isso não é explicado, então, francamente, não recomendo esse capítulo. Um ponto negativo, mas compreensível é que por vezes detalha demais a elaboração de certas leis, falando nomes de deputados que, na época da escrita eram atuais, mas hoje são irrelevantes. Descrevendo que passou por comissão x, mas no final não deu em nada. Pra nós hoje, isso não é muito relevante, mas entendo que na época, o era.
No final, é uma obra genial, um magnum opus que explica uma das colunas vertebrais da história brasileira. Recomendo o primeiro e último capítulo a todos que querem compreender a história do país, e os capítulos individuais, conveniente e honestamente separados por tema (tributação, justiça e polícia, etc) a quem tem interesse nos respectivos temas. Existem livros que são apenas vômitos egocêntricos de ideias próprias, publicações do que se passa na cabeça de alguém, em termos de valores e crenças, mas esse não é um deles, é um livro honesto, que tem o leitor em mente, buscando ser o mais objetivo possível numa explicação do Brasil.
Pesquisa de incrível qualidade. O autor faz o desenho do estranho labirinto que era a política brasileira na Primeira República, buscando a origem do "coronelismo" (base da "política dos governadores") ainda na época da colônia e explicando como se dava seu funcionamento não apenas na Primeira República, mas também em períodos de avanços na legislação eleitoral (que tinham como alvo, entre outras coisas, o próprio coronelismo), como no pós-Código Eleitoral de 32 e na Constituinte de 1945.
Este livro descreve com uma minúcia muito particular o funcionamento do federalismo na primeira metade do século XX no Brasil. Excelente leitura.