Status Updates From A Última Lua de Homem Grande

“(…) e deixa de acreditar que não o matam. (…) Inocêncio Kani não quer passar à história como o camarada que matou aquele a quem mesmo chama Homi Garande. Por isso, manda o soldado Bacar fazê-lo, porque Kani sabe que a culpa uma pessoa até consegue carregar, mas dificilmente a maldição, pois amaldiçoado será o chão em que um homem tombar pela mão de quem confiou (…)”

“«Haz tu própria revolución, Amílcar», que o Che pronunciou ao despedir-se, curou-o de todas as perdas havidas e por haver. No ano seguinte, casou-se com Ana Maria Voss de Sá, e a magia reencontrou o seu predestinado lugar de acalanto. É que não se pode fazer revoluções sem amor, concluiu para a luamada.”

“No fundo, no fundo, o lugar onde ele, Homem Grande, mais tempo esteve em toda a sua vida, vinte anos, deixou-se de chamar, de repente, casamento e estatuiu-se como divórcio, termo que murchou os poemas, as ervas, as graças, os alicerces, a casa, os nascimentos, e abalou o estremerecimento, vulgo, o amor à primeira vista.”

“Não é possível ser-se contra um povo que inventou as palavras sável, mangostão, almíscar, pepita e anzol, recita para a Lua (…)”

“(…) Não compreendo alguém que luta contra Portugal e tem como companheira uma mulher portuguesa. (…) «Nós não lutamos contra o povo português. Lutamos sim para libertar a nossa terra do colonialismo português», avançou. A frase ecoou pelos nove cantos do mundo, mas nem Maria Helena voltou a Conacri, nem o presidente se convenceu.“

“(…) chão que só aceita os homens dentro quando são os próprios homens a cavá-lo.”

“Ele, o engenheiro Amílcar, perceberá naqueles três tristes votos pingados de Bissau a mensagem evidente de que a democracia era um jogo para a oposição participar, não para ganhar.”

“Já naquela época, ele Homem Grande, exclamara:

_Petróleo? Vão me matar.”


exatamente, aqui está.

“(…) agora Ministro do Ultramar, voltou a Bissau, (…) e informou que era imperativo defender a província com hulhas e dentes, numa codificada menção a negros e brancos, porque, meus senhores, disse, acaba de se confirmar a existência de abundante petróleo na província da Guiné, melhor ainda, o contrato de pesquisa e exploração com a norte-americana Esso (…)”


é smp sobre isto não é…?

“(…) Estão a começar mal, continuou, a pugnarem pela criação de partidos de base étnica em África, pois o inimigo far-vos-á brigar uns contra os outros, antes, durante e depois das independências (…)”

“_É preciso acabar com a vaidade de que cada um por si, dez ao todo, vamos libertar as colónias.”

“Pouco depois dessa notícia, o Presidente da República Portuguesa, Américo Deus Rodrigues Tomás, encetou o que todos os ditadores fazem quando estão na mó de baixo, visitar o povo.”

_ Onde é que eu estou?,
pergunta à Lua.

(…)

_ Estou entre a casa e o trabalho,
só para se situar, porque, quando se vai morrer, o presente é o mais difícil de se reter, percebe.

E lá vai ele, Homem Grande, para outro campo de batalha: as recepções. À escala miúda, joga-se aqui o xadrez com as nações feitas peões. Cada rei e rainha, bispo, cavalo ou torre, os brancos e os pretos, segura o copo numa mão, e com a outra tenta puxar o guerrilheiro para o seu bloco:

E lá vai ele, Homem Grande, para outro campo de batalha: as recepções. À escala miúda, joga-se aqui o xadrez com as nações feitas peões. Cada rei e rainha, bispo, cavalo ou torre, os brancos e os pretos, segura o copo numa mão, e com a outra tenta puxar o guerrilheiro para o seu bloco:

_ Porque choras, menino?
perguntou-lhe assustada.

_ Mamãe também morre?,
quis saber o filho, agarrado à cintura da mãe.

Ela pestanejou, escondeu a emoção, pensou na resposta e disse:

_ Viste a tua mãe, não viste?

Ele, Amílcar, que não sabia mentir, disse a verdade:

_ Não, estava a ver o Sol.

“(…) os seios, o ventre, as ancas, as pernas, como fontes de misericórdia, tudo muito cansado, magro, caído, sofrido, mas lindo, carne de sua carne primeira, leite materno espremido, multiplicado e partilhado, mãos às que só faltava esculpir o mundo, vida entregue ainda por viver e entretanto já ida, e não aguentou, terrível, a sensação do ter e de um dia perder (…)”

“A psicose da perfeição atrapalha-o sempre.”

“Ele, Homem Grande, não esconde que é vaidoso, o que é próprio da autoconfiança, mas não é arrogante, que seria mais da ignorância.”

São 6h50 da manhã

Vai até diante do guarda-roupa, lembra, examina com exagerada prudência as peças, Não há nada fútil na estética, resmunga, Imagina que o matador apareça à mesma hora que os diplomadas de ontem, e ele, Homem Grande, é surpreendido de pijama e chinelas, de barbas crespas, míope como um taberneiro desleixado. Não, em qualquer situação, um homem deve ser achado impecável para morrer.