semente

-queria viajar pelas Américas, abrir os braços no topo de uma montanha.


-paulo, você anda lendo muito os beats.


-eu tô falando sério.


-eu também. tira a cara dos livros, coloca no mundo. olha o preço que tá a passagem.


-você me acha ingênuo.


-muito pelo contrário e exatamente por isso. a vida do lado de fora precisa de você.


-elisa, há quanto tempo somos amigos?


-desde a faculdade.


-isso. e desde lá, escuta bem, desde lá nós dois não estamos indo a lugar nenhum.


-como não?, olha essa festa.


-não estou falando da festa.


-da próxima vez não te chamo.


-para de bobagem, você me entendeu. vamos viajar juntos, eu, você e mais nada.


-ai, paulo.


-vamos? a vida é uma só.


-tá, e começaríamos por onde?


-tem muita coisa em Cuba que eu gostaria de ver. você sabia que o Hemingway morou lá pra escrever um romance?


-todo mundo sabe disso.


-eu podia fazer o mesmo.


-ótimo. e depois?


-depois vamos vendo. você disse das passagens, mas a gente não precisa de dinheiro. podemos trabalhar nas cidades e ir viajando, vamos conhecer o mundo devagar.


-e a nossa vida aqui?


-estou falando de jogar tudo pro alto, elisa, você não entendeu? não aguento mais trabalhar naquela maldita escola, minha família me odeia, a rita então nem se fale.


percebe? eu não tenho nada a perder.


-você está louco.


-pois o louco aqui


vai te mandar um tremendo cartão postal.


ela deu um tapa no ombro dele, prendeu o lábio com os dentes.


 


-adoro essa música.


-vamos dançar?


 


eles se levantaram e


 


rapidamente sumiram


na pista


 


de vez em quando um braço


de vez em quando os cabelos


de elisa, entre tantos,


 


demoraram pra sair de lá quase três da manhã e então


saíram, cambaleantes, pagaram as bebidas no caixa


 


e ganharam a rua, não é melhor pegar um taxi? não, vamos andando. está uma noite tão bonita.


 


caminharam,


 


até a casa dela


conversando sobre as músicas que a dj tinha tocado


e no quanto ela acertou em colocar Lionel Richie logo depois de Michael Jackson, uma combinação de fato explosiva, na porta de casa ela disse ficou tarde, é melhor você dormir aqui.


 


-dou aula amanhã às duas


-a gente coloca despertador.


 


ele subiu os degraus, ela na frente, procurou a chave na bolsa


o bob não latiu.


 


abriu a porta,


 


o paulo se jogou no sofá como se fosse


uma piscina.


 


-cuidado as costas.


-não sinto nada, estou morto. – e o bob cheirando


-ei. deixa ele em paz.


a elisa foi pro quarto, pegou travesseiro e cobertor.


 


quando voltou


o paulo já estava dormindo


 


-parece criança. –comentou pra si mesma


 


também ela


estava muito cansada


fechou a cortina pra não entrar luz, mas


sempre entrava.


 


antes de se deitar ela tomou um banho


 


(o bob no tapete do banheiro)


 


e enquanto tomava


 


imaginou que


a água na verdade era Chuva


de algum país exótico que ela nunca foi.

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Published on September 12, 2018 09:48
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Aline Bei
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