in YGGDRASIL, PROFECIA DO SANGUE - cap 24


VINTE E QUATRO

Maeve ficou a saber o que acontecera no dia anterior, ligara repetidamente para Sergiu sem sucesso, ia sempre para as mensagens. Depois do pequeno-almoço e para se distrair ajudou Maria a procurar o livro, só faltava espreitarem a prateleira mais alta do armário. Foi buscar o escadote e depois de puxar todos os livros de capa negra para fora, pronta a desistir, Maria gritou empolgada.- Mostra-me esse do canto. - Este? Maria acenou com a cabeça.- Esse mesmo! – segurava no escadote enquanto descia.Maeve colocou-o em cima da mesa. Mal lhe tocou Maria soube que era o que procuravam. Abriu-o, mas não conseguia ler o que estava escrito.- Em que língua é que isto está escrito?- É alfabeto Theban. - A escrita das Bruxas?- Afinal sabias.- Por acaso li sobre esta escrita, mas ainda não me tinha cruzado com nenhum exemplo. Não o vamos conseguir ler.- Já pensaste pedir ajuda à tua avó? Cresceu na companhia de Rhiannon a sobrinha de Morgaine a dona deste livro.- Tens razão, telefono-lhe mais tarde.- Já o descobrimos, mais um ponto a nosso favor podes riscá-lo da lista. - Sabes que não tenho uma lista. – Maria ria-se divertida.- Então temos de te arranjar uma. – Maeve piscou-lhe o olho – primeiro ponto, Hel, resolvido. Segundo, Livro das Sombras, encontrado. Agora só faltam para aí uns cem pontos.- Não me assustes, pareces o Fionn.- E tu não me ofendas que não te fiz mal nenhum.Riam-se as duas.- Vamos subir Maria?- Sim, mas vou levá-lo comigo. Agora que o encontrámos não o vou perder de vista. Quero ligar à tua tia, pode ser que nos consiga ajudar.- É provável. Desligaram as luzes, fechando a porta.Os homens conversavam na sala, Fionn comprara gelado. Maria não conseguia perceber quem vendia gelados com um tempo daqueles. Sergiu também lá estava, Maeve acelerou o passo na sua direcção sorrindo-lhe. Maria levantou o livro.- Encontrámos! Aceitam-se sugestões sobre o que fazer a seguir. - reparou que os homens lhe faziam sinais tentando avisá-la de que não estavam sozinhos.Maria cruzou o olhar com Sergiu pedindo-lhe autorização para contar o seu segredo, recebendo em resposta, um discreto abanar de cabeça em negação. Maria suspirou alto. - Dói-te a mão? - Rhenan aproximara-se. - A mão está óptima. - retirou a ligadura que Rhenan lhe colocara por cima do unguento, a marca desaparecera. - Felizmente a mão está limpa. - Rhenan sorria-lhe aliviado – O unguento foi preparado pela minha mãe para uma eventualidade como a de ontem, ainda bem que não ficaste marcada.- Ficavas a gostar menos de mim?- Nunca!- Mentiroso. – Maria sorria-lhe deliciada.- Amo-te de qualquer maneira. – Rhenan beijou-lhe a palma da mão.- E começou o mel. Meus! Tentem não derreter o gelado. – Fionn esticava-se em cima do sofá pronto para comer.- Cala-te minha besta. - Maeve sentada perto de Sergiu olhava para o primo irritada.- Trouxeste gelado de morango? - Rhenan olhava divertido para Maria enquanto se dirigia à mesa.- Sim! - Vou levar a embalagem. Amanhã digo-vos se o conseguimos derreter todo.Os homens entreolhavam-se divertidos.- Estás a ver minha lagarta loira que até sou capaz de dar bons conselhos.Os irmãos enchiam a boca evitando rir.- Nesse caso, vou subir com o de chocolate e o Sergiu.- Não! - os primos gritavam em uníssono.- Logo vi que era só para alguns.Sergiu comia calmamente, ignorando propositadamente os olhares irritados dos irmãos. Não iria começar uma guerra aberta com o Clã que jurara proteger. Nessa noite, dormia em Yggdrasil,com guarda pessoal que se ia revezando. A situação era caricata por ser um inverter dos papéis, os senhores protegiam quem os devia defender.     Maria rolou na cama. Rhenan já se levantara. Ultimamente a casa estava muito silenciosa. Bateu à porta de separação, sem obter resposta, abriu espreitando, Lochan também não estava no quarto dele. Onde se esconderiam os homens?Afastou os cortinados, também não se estavam a emporcalhar na lama, aos gritos, como era habitual. Vestiu umas calças saindo do quarto caminhando descalça, desceu a escadaria. O estômago roncou, sorria ao lembrar-se da loucura de Rhenan com o gelado na noite anterior. Aquele homem conseguia surpreendê-la.A cozinha estava deserta, o café ainda quente, não podiam ter saído há muito tempo. Comeu duas torradas com manteiga e geleia, lavou a loiça regressando ao quarto, estava decidida a procurá-los. Colocou os Iron Maiden a tocar no telemóvel, sabia que a música “Alexandre, o grande” demorava cerca de oito minutos e meio, o tempo suficiente para tomar banho e vestir-se. Na noite anterior guardara o Livro das Sombras, no fundo da sua gaveta, debaixo da roupa interior.Já vestida e como a casa continuava calma mudou de ideias, até ao almoço não pensaria em nada, nem em ninguém. Pegou nos livros e no bloco de apontamentos, estudaria na sala, sabia que se fosse para a cave acabaria por se distrair.Ao fundo da escadaria viu Maeve abraçada a Sergiu. Cumprimentou-os pensando que os homens deviam estar por perto, nunca deixariam a prima e Sergiu sozinhos em casa.- Onde estão os teus primos?- Saíram. - Todos?- O Lochan está na cave a admirar a nova sala, parece uma criança agarrada a um doce, até já se deve ter esquecido do Sergiu. – abraçou Sergiu divertida.- Como três são uma multidão, vou falar com o Lochan. Se forem a Dublin dão-me boleia?- Íamos sair agora, mas esperamos por ti. – Maeve puxava Sergiu para a sala.- Então não me demoro.Desceu, chamando por Lochan que espreitou da sala recém-descoberta.- Olá!- Sentes-te bem?- Excelente, graças a ti.- Julgo que nos tempos mais próximos era aconselhável que não saísses dos limites da propriedade.- Pensas que o meu aparecimento possa ser revertido?- A minha intuição diz-me que não devemos correr esse risco.- Não há problema, tenho aqui tudo o que preciso.- Sabes onde foi o Rhenan?- Foram a Dublin.- Os teus irmãos a passearem e tu sem saberes de nada, parece-me demasiado suspeito. Lochan sorria divertido. - Sempre fomos misteriosos, esse é um dos segredos do nosso charme.- Serem convencidos também. - É mesmo mais o nosso charme e o que conseguimos fazer com gelado. – piscou-lhe o olho maliciosamente.Maria começava a sentir a cara aquecer. - Sabes que mais, vou-me embora que já vi onde o Fionn foi buscar as parecenças. Até logo.Ainda o ouvia rir quando saiu da cave.     As últimas semanas do semestre passaram a correr, os exames tinham começado e andava tão cansada que não conseguia arranjar tempo para ligar a Freya ou à avó. O Livro das Sombras, mantinha-se intocado no fundo da gaveta e os homens continuavam a desaparecer diariamente regressando ao pôr-do-sol. Conversavam em surdina, calando-se quando se aproximava. Pareciam planear algo, evitava pensar no que seria.O pai já lhe enviara a passagem de avião. Odiava pensar que ficaria afastada de Rhenan durante dois meses, não sabia se aguentaria.Estafada, deixou cair a mala no chão da entrada, atirando-se para cima do primeiro sofá. Dormitava quando o telemóvel tocou, levou-o ao ouvido escutando a voz da avó que a tirou da inércia em que se encontrava.- Filha, como estás?- Agora estou bem.- Tens uma voz cansada.- Sinto-me cansada, com os exames e a apresentação de trabalhos.- Senti que precisavas de mim, estou correcta? - Descobrimos o Livro das Sombras, mas está escrito em alfabeto Theban e eu não o consigo ler. - adorava a sua calorosa voz, tinha a capacidade de lhe transmitir a energia de que necessitava. - Parece um quebra-cabeças, mas na realidade acaba por ser um jogo de paciência. Tens de substituir as letras latinas por símbolos rúnicos. Ao início parece difícil, mas assim que entrares no ritmo vais conseguir lê-lo de forma corrida sem necessitares de recorrer a cábulas.- E como sei quais os símbolos correctos?- Começa por arranjar um alfabeto rúnico, deves conseguir encontrar um num dos muitos livros que aí têm. Posso dizer-te, que na capa está escrito Livro das Sombras, começa por ver a equivalência desses símbolos ao alfabeto latino e avança a partir daí.- Obrigada vovó. Nem sabes o quanto me ajudaste.- Mas não é só isso que te preocupa, pois não?- Na verdade não me sinto preparada para deixar o Rhenan durante os longos meses do Verão. Acredita que desejo muito estar contigo, com todos, mas não sei se consigo ficar tanto tempo afastada de Yggdrasil e pensar nisso está a deixar-me triste.- Suspeitava que fosse algo desse género. Antes que fiques desalentada sem motivos, deixa-me dizer-te que falei com os teus pais e eles concordaram em deixar-vos sozinhos na casa da Ilha de Faro durante o mês de Agosto, se na última quinzena de Julho ficarem connosco em Vila Nova de Milfontes. Não lhes falei de nenhum namorado e muito menos marido, por isso vão ter de ser muito discretos durante esses quinze dias.Saltitava de felicidade com o telemóvel colado ao ouvido, ainda lhe parecia um sonho o que a avó lhe acabara de dizer.- O que seria de mim sem ti? Adoro-te! - Eu sei. – a avó ria-se satisfeita.- Mas na realidade o Rhenan ainda só é meu namorado.- Andas com o anel de casada que ele te colocou no dedo e têm a minha bênção.- A verdade é que já não conseguia viver sem ele.- O nosso destino está escrito desde o início dos tempos. Transmite-lhes as novidades e diz-lhes que tenho saudades. Se necessitares de mim telefona-me a qualquer hora, deixar passar muito tempo só vos prejudica. Estou muito orgulhosa pela forma corajosa como os protegeste.- Como soubeste?- Tenho um dedinho que adivinha. Adoro-te minha querida, fica bem.- Também te adoro.Sentia-se renovada, queria contar-lhes as novidades, mas primeiro tinha de os encontrar. O corpo pedia-lhe repouso, olhou para o sofá com vontade de se voltar a deitar, mas sabia que tinha de descobrir o alfabeto rúnico. Decidida caminhou na direcção da cave.
Começara a tradução do Livro das Sombras, mas definitivamente não sabia o que estava a fazer. Decidiu que o levaria para Lisboa, a avó seria a pessoa indicada para a ajudar. Fechou o livro.Ainda não conseguira contar a ninguém as novidades. Os homens continuavam demasiado misteriosos e ela nervosa. Os exames acabaram, as Sombrasnão tinham voltado a atentar contra eles apesar de continuarem a rondar e as Fadas andavam desaparecidas, o que lhe permitia pensar calmamente no que fazer a seguir.Naquela manhã voltara a acordar sozinha na enorme cama. Tanto mistério começava a irritá-la, Rhenan mudava de assunto sempre que lhe perguntava o que faziam. Levantou-se decidida a tomar o pequeno-almoço e regressar para a cama com um livro, de onde só pretendia voltar a sair para se alimentar.Ouvia o riso bem-disposto de Maeve. - Maeve? – chamou-a.- Na cozinha. - gritou-lhe em resposta.Maeve conversava com alguém, desceu a escadaria em passo acelerado. - Aí estás tu! - a voz de Freya soou aos seus ouvidos - Tínhamos saudades tuas. – aproximou-se de Maria abraçando-a.Quando chegaram? – Maria sorria-lhes espantada.- Foi uma decisão de última hora. Maria saiu do abraço de Freya para ir beijar Deirdre quando se lembrou de Lochan. Ficou inquieta olhando em volta, rezando para que não aparecesse.- Procuras alguma coisa filha? – Freya notara o seu nervosismo.- Não! - respondera mais depressa do que desejara.- Pareces nervosa e cansada, de certeza que estás bem? O meu filho não te tem dado descanso.Maria enrubesceu, mas Maeve veio em seu auxílio. - Está óptima, íamos agora mesmo vestir-nos, temos de entregar um trabalho e já estamos atrasadas. - pegou Maria por um braço arrastando-a para fora da cozinha, sussurrando - Não fales até estarmos sozinhas.- Então vão. Conversaremos mais tarde. – Freya servia-se de café sentando-se ao lado da irmã.Maria continuava a ser arrastada pela escadaria acima.- Mas o que se passa? Estão todos doidos? A tua mãe e tia estão aqui e o Lochan também, alguém pensou nisso? - Fica descansada. - É esse o motivo pelo qual os homens andam tão misteriosos?- Nunca os achei misteriosos, não sei o que estás a insinuar. - Não te faças de parva Maeve, nas últimas semanas os homens desaparecem. Para onde vão? Fazer o quê? Tenho a certeza de que tu sabes.- Estás a ficar obcecada. Despacha-te, temos de sair daqui.- Logo hoje que me apetecia fazer gazeta.- Tu? Estás a sentir-te bem?- Aparentemente não. Estou pronta daqui a cinco minutos. Mas aviso-te que estou cheia de fome.- Paramos num café em Dublin. - Quero sair daqui o mais depressa possível, antes que a bomba exploda. Onde é que o Lochan se escondeu?- Está no sótão. Agora despacha-te. Em menos de dez minutos Maeve conduzia-as no carro de Rhenan para fora de Yggdrasil. Chegaram passado pouco tempo a casa de Maria, onde estacionaram.- Que me dizes a um dia de mulheres?- Assim é que é falar. - Maria sorria-lhe com cumplicidade.Deixaram os livros e cadernos no porta-bagagem seguindo de camioneta para Dublin como fariam se fossem para as aulas. Naquele dia não pensariam em nada que se relacionasse com aulas, Sombras, Fadas, Profecia, Lochan, deixariam de lado todas as preocupações, teriam tempo para tudo mais tarde. Maria não se lembrava quando tirara umas horas só para se divertir, possivelmente a última vez tinha sido em Lisboa nas férias de Natal. Como Rhenan não a deixava usar o dinheiro que os pais lhe enviavam tinha bastante e naquele dia iria gastá-lo com Maeve, compraria tudo que lhe apetecesse.- Então, o que fazemos primeiro? - Maeve sorria divertida, adorava ser uma rapariga da sua idade naquele século. - O que quiseres!- A sério? Então sugiro muitas compras e um almoço demorado.- Concordo! Por onde começamos?- Primeiro o pequeno-almoço, depois compramos lingerie, roupa sexy, almoçamos, compramos sapatos, lanchamos e para finalizar apanhamos a camioneta. Depois metemo-nos no carro, escondemos tudo o que comprarmos na bagageira e seguimos para casa.Maria ria-se divertida, parecia-lhe que aquele programa era habitual para Maeve.       - Gosto da tua proposta apesar de achar que em vez de roupa sexy e lingerie podíamos optar por roupa funcional.- Precisas de roupa sexy, funcional já tu tens muita.- Não me estou a ver a andar de saltos altos e roupa justa.- Queres estar sempre atraente para o meu primo, certo?- Mesmo que compre a lingeriemais requintada não me parece que a mantenha no corpo durante muito tempo.Riam-se divertidas. - Infelizmente a paciência não é uma virtude nesta família.- Queres que gaste dinheiro em lingerie sexy para testar a paciência do teu primo?- Acho que é um motivo mais do que válido. Segue os meus conselhos, vais ver que tenho razão.- Quem sou eu para te contrariar, indica o caminho que será um prazer seguir-te.- Assim é que é falar!Saíram na paragem de Eden Quay do lado norte do Rio Liffey, tinham decidido começar pela Grafton Street, ao cimo da rua do lado esquerdo existia uma loja de lingerie, esse seria o ponto de partida, depois, logo decidiam para onde seguir. Comprar roupas com Maeve era de enlouquecer, quando finalmente pararam para almoçar já não tinham mãos para transportar tantos embrulhos, mas estavam felizes. Tinha adorado e ainda comprara uma lembrança a Rhenan. Quando chegaram ao carro estavam estafadas de carregar tantos embrulhos, mas riam de felicidade.- Agora como fazemos para levar tudo para dentro de casa sem que nos vejam? – Maeve tentava encaixar os sacos no porta-bagagens.- Fazemos assim, tu entras e distrais os teus primos enquanto eu levo tudo para a cave e quando estiverem todos a dormir fazemos a divisão dos embrulhos no teu quarto.- Combinado. Maria olhou para a casa que supostamente dividia com Rita, as luzes da sala estavam acesas o que significava que tanto ela como Pedro tinham regressado. – suspirou aliviada, os amigos estavam seguros. Agora tinham de se despachar a regressar, ainda com a luz do dia.Maeve ligou o rádio. Fizeram o caminho para Yggdrasil com as janelas abertas a cantar a plenos pulmões. Aquele dia tinha sido uma estranha recompensa por se terem livrado de Hel. Mas chegara o tempo de retemperar forças e limpar armas, afinal a batalha ainda só começara.
Era bom ter a família toda reunida apesar dos homens continuarem misteriosos. Gostava de voltar a ter a capacidade de ler pensamentos, infelizmente só acontecera uma vez com Rhenan e não se voltara a repetir.Lochan continuava no sótão, os irmãos tinham-lhe pedido paciência prometendo que não teria de esperar muito. A verdade é que ninguém parecia saber o que fazer por temer a reacção de Freya.Durante o jantar falou-se sobre como lidar com os Tuatha, ficou decidido nunca entregar o Colar de Brisingamen a Danu. A chave era responsabilidade do Clã e era obrigação deles devolverem-no à segurança de Yggdrasil, de onde nunca devia ter saído. A lança continuava encostada à parede no local onde Maria a deixara. Ninguém se atrevia a tocar-lhe com medo do que lhes podia fazer. Maria descobrira que a lança pertencia a Lug, apesar de não saber como a perdera e acabara na posse deles. Combinaram mantê-la em segredo para o caso de voltarem a necessitar dela ou de virem a usá-la como moeda de troca. Mais do que nunca precisavam de Rhiannon e não sabiam como a tirar de Tara. Danu, sabia quem era e não a libertaria. Estava cansada e não aguentava mais a inércia e o silêncio dos homens em relação ao irmão que continuava aprisionado no sótão. Mas que raio se passava na cabeça de todos? Lochan não merecia ter de passar por mais aquela provação, vivia num esquisito limbo e acabara prisioneiro dentro da própria casa. Ainda não saíra do sótão desde que a mãe e a tia tinham chegado, aquela situação tinha de acabar.- Freya, preciso de lhe contar algo. –Maria pousou o copo de água, sentindo os olhos de todos colados nela. Rhenan apertou-lhe ao de leve a perna por baixo da mesa, sabia o que pretendia fazer e tentava evitar. Freya limpou os lábios pousando as mãos na mesa, algo no tom de Maria alertava-a para a importância do que lhe ia dizer.- Há uns tempos lembra-se que consegui falar com Lochan?- Foi um dos dias mais felizes da minha vida.Maria sorria-lhe segurando-lhe as mãos.  - Depois desse dia, comecei a vê-lo e a tocar-lhe.Os homens sustinham a respiração olhando para a mãe pendentes da sua reacção.- Nunca mais saiu de perto de nós. Começou a dormir no seu quarto e passa os dias na cave.- Lochan? - Freya empalidecera. Fionn levantou-se colocando-se atrás da mãe com as mãos nos seus ombros, o olhar avisando Maria que devia parar.- Algo aconteceu. – Maria olhava indiferente para Fionn - Escusas de me fazer essa cara que não me metes medo.Freya bateu ao de leve na mão do filho. - Quero ouvir o que a Maria tem para me contar.Maria sorria-lhe agradecida.- Temos vivido assim. No início, falava através de mim, mas algo aconteceu quando abrimos a nova sala na cave. – fez uma pequena pausa - Existe algum motivo para ter guardado roupas velhas?- Aquelas roupas são o meu purgatório. Nessa arca estão guardadas as últimas vestes do meu filho e marido, nunca me consegui desfazer delas.- Fez bem! - Fiz?Maria anuiu com a cabeça.           - Não sei como, mas quando entrei naquela sala todos os meus sentidos foram atraídos para ela como se uma força me puxasse.Maria conseguia ouvir a respiração pesada dos homens, Deirdre observava-a ansiosa.- Abri a arca e toquei nas roupas, senti-me aquecer por dentro e nessa mesma altura Lochan sentiu o mesmo.Freya chorava sem saber porque o fazia. - Venha comigo, há algo que lhe quero mostrar. - levantou-se estendendo-lhe a mão.Freya apertou a mão que lhe estendia, saíram da sala subindo a escadaria. Fionn fez menção de as seguir, mas Rhenan já segurava o irmão por um braço impedindo-o. - Deixa-as ir. A Maria sabe o que faz.  Deirdre escutava atentamente os sobrinhos, lágrimas de incredulidade saíam dos seus esperançosos olhos azuis. - Mãe! – Maeve aproximou-se abraçando-a.- São lágrimas de felicidade filha. O silêncio abateu-se sobre todos enquanto aguardavam.
Maria conduzia Freya através das escadas de acesso ao sótão onde estava Lochan. Abriu a porta e não foram necessárias palavras, a mão que as unia apertou-se quando Freya viu o filho deitado na cama.- Meu filho! - a voz mal se escutava, mas Lochan saltou da cama correndo para abraçar a mãe.- Máthair!- Mo chroí!Abraçavam-se, beijando-se repetidamente, os pés de Freya já não pousavam no chão porque Lochan a apertava de encontro ao peito encostando a cara à sua. Maria soluçava. Saiu, fechando a porta atrás de si. Aquele era o momento do tão ansiado reencontro de uma mãe que julgara ter perdido o filho. Sentou-se nos degraus com as lágrimas a sulcarem-lhe o rosto. O que acabara de presenciar ficaria para sempre marcado nas suas memórias. A felicidade e o amor que os unia significava tudo. Necessitava de Rhenan.Sentiu os seus braços envolverem-na, limpando-lhe as lágrimas, reconfortando-a. Agradecida encostou a cara ao seu peito. - Não chores mo ghrá! Fizeste o que nenhum de nós foi capaz.- São lágrimas de felicidade.- Vamos para baixo, até que a minha mãe e irmão se juntem a nós. - desceu a escadaria com Maria ao colo. Com a cabeça encostada ao seu ombro, sentia-se protegida, olhou para ele que lhe devolveu um sorriso apaixonado.- Obrigada Rhenan.Beijou-a na testa. Amava-a, sentia a sua felicidade, a sua dor, o seu corpo respondia instintivamente ao seu e naquele momento o que lhe dizia é que tinha de a manter perto de si para a acalmar. Sentou-se no sofá mantendo-a no colo. Deirdre levantou-se beijando-a. - Desculpa-me, sou um imbecil! - Fionn seguiu o exemplo da tia.- Mas és o nosso imbecil. – Maria devolveu-lhe o beijo. Fionn sorria agradecido.- A mãe? - Eoghan olhava para o cimo da escadaria - Como foi que reagiu?- Contando que o teu irmão a abraçou levantando-a no ar deve ter-se sentido zonza.Fionn, sentara-se à mesa enchendo o copo de vinho, estava nervoso, mas não queria que notassem.O tempo passava, começavam a ficar impacientes, até ouvirem a voz de Freya e o barulho de passos. Quando entraram na sala, os olhos de Lochan procuraram a tia que se atirou nos seus braços a chorar de emoção, enquanto se beijavam falando ao mesmo tempo.Freya aproximou-se de Maria segurando-lhe na cara. - Mais uma vez filha mostraste ser uma verdadeira MacCumhaill. Estava demasiado emocionada com as palavras de Freya. Rhenan estreitou-a nos braços.Era tarde, mas ninguém se queria deitar.Maria achava que devia ficar tudo dito.- Eu e o Lochan estivemos a falar e pensamos que será prudente manter-se dentro da propriedade.O silêncio era confrangedor. Maria tirou o copo das mãos de Rhenan bebendo-o de um trago. - Calma mo ghrá! Não queres ficar com dores de cabeça - sussurrou-lhe ao ouvido tirando-lhe o copo vazio das mãos.- Não tenhas tanta certeza.- Mãe, não é assim tão mau, - Lochan segurava a mão de Freya - não temos a garantia de que aconteça algo, simplesmente não queremos arriscar. Não nos podemos esquecer que esta situação em que me encontro é temporária, mas se existe uma hipótese de a tornar definitiva, não farei nada que prejudique o meu futuro.- Meu filho! Só o facto de te ter aqui é um farol de esperança para todos. Lochan beijou a mãe.- Como conseguiram preservar o corpo? - Maria nunca se atrevera perguntar até aquele instante.- Foi utilizada magia negra, por isso através da luz conseguimos reverter alguns dos efeitos da mesma, algo nos dizia que era o mais acertado. - Rhenan falava calmamente - Durante todo este tempo, mantivemos o local onde está guardado, em absoluto sigilo. Evitamos que as forças do mal acabem o que começaram.- Quem tem conhecimento?- Todos nós.- Freya, já pensou que para conseguirmos juntar o espírito ao corpo temos de os ter no mesmo espaço físico? Quem o vigia?- Os guardas imperiais, os Romae as Bruxas.- Quem?Maeve puxou uma cadeira para perto de Maria.- As únicas pessoas com a capacidade de o defenderem, são a guarda imperial do nosso tio Vlad Tepes e as Bruxasseguidoras da Deusa.- Todos imortais?- Sim! Mas tal como nós se forem mortos por magia desaparecem para sempre.- Não são strigoi



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Published on April 09, 2020 02:00
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